A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 89
Foram poucos segundos de silêncio, mas pareceram durar uma eternidade. O vovô, abaixando os olhos do teto, sorriu com amargura.
“Como existem poucos precedentes, só posso imaginar… talvez o corpo dele não foi capaz de suportar e entrou em colapso.”
“Poucos precedentes…?”
“Os feromônios de dominação são muito raros, e mesmo assim, só aparecem na família do líder do clã. É até engraçado pensar sobre isso. Que feromônio absurdo para surgir aleatoriamente da nossa família Fayant…”
O pôr-do-sol escureceu o sorriso dele.
“Então, aquele desgraçado se foi quando Ahin tinha apenas 6 anos. O que foi anunciado é que a causa foi uma doença crônica, mas, na verdade, foram diversos ataques devido aos feromônios de dominação.”
Senti como se o sangue tivesse se esvaído de meu corpo. Vovô, me olhando com uma expressão pensativa, tocou em meu ombro.
“Não se preocupe demais. Ahin é diferente, pois metade de seus genes vem da linhagem superior de Valence. No entanto, pode ser que algum dia ele venha a ter um ataque, quem sabe…”
Por que os meus maus pressentimentos sempre estavam corretos? Para não desabar, apertei os punhos com força. Minhas unhas se enterraram na carne.
‘Vovô… então ele não sabe de nada?’
Ahin, suando e sofrendo, apareceu em minha mente.
***
Mais tarde nessa mesma noite, os rumores de uma mulher com longos cabelos brancos correndo por toda a mansão montada em uma pantera negra já tinham alcançado Meimi, que, se dirigindo ao túmulo onde estava Ahin, empalideceu. Ela se culpou por não ter ficado para trás na mansão com Vivi, tendo em vez disso se dedicado aos preparativos para o aniversário de morte. Após procurar pela mansão tumultuada e o quarto bagunçado, Ahin se deparou com Quinn, dentro da gaiola. Ele encarou o subordinado duramente. A essa altura, ele não podia nunca mais deixar Vivi para trás.
“Falei para protegê-la, e você fica dentro de uma gaiola comendo morangos.”
Ele abriu a gaiola e segurou Quinn, que estava com o bico todo sujo das frutas. A águia evitou contato visual.
“Por acaso pretende virar um passarinho de estimação agora?”
Quinn, ouvindo as acusações injustas, protestou. Ahin o ignorou e abriu a porta da varanda, falando sem hesitar.
“Se não encontrá-la em 10 minutos, amanhã teremos águia assada para o café da manhã.”
A águia, ameaçada de morte, voou rapidamente.
“Lorde Ahin.”
Evelyn se aproximou por trás de Ahin, que estava observando Quinn pairando alto sobre a mansão.
“A Senhorita Coelha foi vista próxima à estufa.”
“Vou para lá.”
Ahin pulou da varanda diretamente para o jardim, ignorando totalmente o uso de portas. Correndo até a estufa, o estômago dele se revirava. Como ela tinha se humanizado sozinha sem o uso de Ferenium? Ou teria absorvido os feromônios de alguém? Se ela tinha se humanizado, podia ter esperado por ele. A razão pela qual ela tinha escapado do quarto montada em Barra era um mistério. Ele achou que ela não iria mais fugir, a essa altura. Vivi merecia uma salva de palmas por ter pensado em usar uma pantera negra como meio de transporte.
“Eu quero voltar para o território das panteras negras.”
Parado na frente da estufa, Ahin se sentia nervoso e com raiva. No entanto, ele sabia que essa raiva iria desaparecer no instante em que avistasse Vivi. Além disso, ela estaria na forma humana.
“Felton, qual é o problema com o apelido ‘Branquinha’…?”
“Milon, se você tem que perguntar, é porque não tem nenhum talento para dar nomes.”
Chegando na porta da estufa, Ahin estava ofegante. Os guardas, assustados, endireitaram as costas.
“C-cumprimentamos o futuro líder do clã…!”
Ahin, identificando “Branquinha” como sendo Vivi, passou pela porta sem dizer nada.
“Ufa…”
O suspiro dos guardas, não escutado por ninguém mais, se dissolveu na brisa noturna. Como já estava completamente escuro, a estufa estava iluminada por diversas lamparinas. Ahin não encontrou quem procurava. No lugar dela, havia uma Vivi falsa: um homem de 60 anos de idade usando a capa de Vivi estava sentado na mesa de chá. Parado em frente à mesa, Ahin falou, de supetão.
“Onde ela está?”
“Acabou de sair. Acho que vocês se desencontraram. Ela me deixou a sua capa.”
“…Por que diabos está usando a capa dela, velho?”
“Nossa conversa se alongou e ela me cobriu, dizendo que iria pegar uma friagem. A propósito, que neto mais ingrato, encontra o avô e sem ao menos cumprimentá-lo, já fala direto da coelha?”
“Não vou perder tempo com inutilidades.”
Lillian deu de ombros e voltou a beber seu chá. Ahin deu meia volta.
“Por que mordeu a nuca dela com tanta força? Vai deixar uma cicatriz.”
Ao ouvir a crítica pelas costas, Ahin girou.
“…Você viu?”
“Seria estranho se não visse.”
“Você está mais tranquilo do que eu pensei. Imaginei que fosse ficar enfurecido.”
“O que você pensa de seu próprio avô? Já disse que naquele dia eu não sabia quem era a coelha, nem o que ela era. Se tivessem me avisado primeiro…”
Ahin sorriu levemente.
“Agora está tão a favor de Vivi que passou para o lado dela?”
Lillian, sem nada a rebater, bebericou seu chá. Desde que Vivi tinha deixado a estufa, ele ainda não tinha acabado de reorganizar seus pensamentos.
“Diversos ataques devido aos feromônios de dominação.”
Quando Edith ainda estava vivo, Valence tinha procurado uma cura por todo o continente, sem ter sido capaz de encontrar nada. Mas um feromônio de cura… isso podia ser o elo que faltava. Lillian pensou em Ahin. Se ele fosse capaz de investigar os limites dos poderes curativos, seria a melhor garantia para o neto, que poderia vir a ter um ataque de feromônios algum dia. Quanto mais Lillian se lembrava dos olhos violeta claro, redondos e transparentes, mais culpado ele se sentia. O egoísmo de querer fazer tudo para proteger a vida de Ahin, e a culpa de amarrar Vivi a ele.
“Afinal, de que família a coelha vem? Ela não tem maneiras muito refinadas, então não acho que seja descendente do líder do clã das lebres.”
“Está falando de famílias e linhagens para casamento outra vez… Esse velho…”
“Apenas me responda.”
“A família dela era de nobres intermediários, mas agora, graças a mim, está extinta.”
“O quê? Seu louco…!”
Lillian teve um repente de raiva, mas nada mais podia ser feito. Ele se endireitou e tossiu.
“…Ah, entendo. Uma linhagem de nobres intermediários não é nada má. Bem, está ok.”
“Vai fingir que não escutou o final da frase?”
“Hmm? Disse algo?”
Lillian, fingindo ser surdo, segurou a xícara. Vivi podia não saber de nada no começo, mas agora, ela carregava vários segredos da família Grace. Podia não parecer, mas ela era muito esperta. Saberia o peso de receber essas informações confidenciais, e o que isso significava. Felizmente, nesse exato momento, o coração de Vivi estava dedicado a Ahin. Lillian imaginou que saber que Ahin poderia morrer caso ela se afastasse a manteria aqui.
‘Mas me sinto culpado…’
Lillian já tinha perdido seu filho. Ele não suportaria perder Ahin pela mesma razão. Frente a uma questão de sobrevivência, diferenças de status ou clãs eram insignificantes. Se Ahin tivesse um ataque algum dia, a presença de Vivi poderia fazer com que tudo fosse muito diferente do que tinha sido com Edith.
No entanto, se Vivi não quisesse isso, a vida dela se tornaria um martírio. A balança moral de Lillian, dividida entre culpa e egoísmo, estava inclinada para o egoísmo, no momento. Ocultando seus pensamentos, ele indicou a direção da mansão com o queixo.
“Ela mencionou que ia voltar para o quarto e saiu, com as duas panteras a seguindo. Não vai atrás?”
Ahin olhou Lillian, que fingia ser amigável, com um olhar cheio de suspeitas. Em vez de sair da estufa, ele se aproximou mais da mesa de chá.
Woosh!
Ahin, agarrando e puxando a capa dos ombros de Lillian, falou com um olhar frio.
“Nunca mais use isso, mesmo que Vivi te entregue. Ficou ridículo em você.”
“…Desgraçado..!”
Eventualmente, os gritos de Lillian podiam ser ouvidos mesmo do lado de fora da estufa.
***
Ahin continuou sem avistar Vivi, como se ela estivesse brincando de esconde-esconde. Ela tinha sido vista por um cavaleiro na escadaria principal e pelo mordomo no corredor. Finalmente, ele parou na frente da porta de seu quarto. Evelyn tinha levado Ash e Barra consigo. As criadas tinham arrumado a bagunça do quarto enquanto Ahin estava na estufa. Elas eram tão competentes que, mesmo após entrar, ele não conseguia ver Vivi.
Quinn, empoleirado na varanda, apontou para a mesa com sua asa. Ahin, fechando a cortina para bloquear a visão da águia, andou na direção da mesa. Ele podia ver uma barra de vestido lilás saindo por debaixo do móvel. Isso o fez ficar nervoso e ansioso. Se ajoelhando, ele falou.
“Vivi.”
Os olhos de Vivi, encolhida debaixo da mesa, estavam cobertos de lágrimas. Mas elas não tinham escorrido, pois ela ainda se controlava para não chorar, seja estando na forma de coelho ou humana. No meio de tudo isso, Ahin pensou que era admirável que ela tentasse prender as lágrimas. O fato de que ele podia vê-la fez com que ele sorrisse sem perceber.
“Te falei que pode chorar.”
Vivi olhou para Ahin com um olhar acusador. Ela limpou os olhos e mordeu os lábios a ponto de fazê-los sangrar. No entanto, as lágrimas voltaram a encher seus olhos logo depois. Mesmo não estando na forma de coelho, ela ainda tinha procurado um lugar pequeno e escuro para se enfiar quando estava chateada. Os lábios de Vivi começaram a ficar mais e mais vermelhos sob a pressão de seus dentes.
“Você vai se ferir.”
As mãos de Ahin, que ele estendeu por reflexo, foram afastadas por Vivi com um tapa. Ela própria pareceu surpresa e, com os olhos arregalados, ficou olhando a própria mão. Ahin também olhou para sua mão estapeada, sem expressão. Ele sentia como se estivesse lidando com um coelho encurralado com as defesas ligadas no máximo. Teria Lillian dito algo desnecessário a ela? Aquele velho de língua solta… Ahin se moveu.
Tuk.
Sua testa bateu na lateral da mesa. Ao contrário de Vivi, que estava sentada confortavelmente, ele era grande demais para caber em baixo da mesa, mesmo sentado.
“O velho falou algo esquisito pra você?”
Os olhos de Vivi se encheram de lágrimas no mesmo momento, em resposta. Percebendo o sinal silencioso, Ahin entendeu facilmente a causa das lágrimas.
‘Então é isso.’
Imaginando que teria sido sobre Edith e os feromônios de dominação, ele franziu as sobrancelhas. Podia sentir no ar um sutil cheiro de sangue. Os olhos vermelhos se fixaram nas mãos de Vivi, que estavam sobre seu colo. Ela tinha apertado tanto os punhos que as unhas tinham provocado cortes nas palmas de suas mãos.
“O que aconteceu com suas mãos? Vivi, me responda ou ficarei bravo.”
“Por que você ficará bravo quando tudo é culpa sua!?”
Vivi estapeou a mão de Ahin outra vez, quando ela se estendeu em sua direção. O encarando, ela se forçou a falar.
“…Por que não me contou?”
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.