A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 139
Fui arrumada para o baile sob o olhar criterioso de Hendry e da Professora Janna. Ainda me sentindo desconfortável no vestido formal, olhei ao redor enquanto me aproximava do salão ao ar livre. As lamparinas brilhantes refletiam a água do lago que ficava ao lado.
Com meu cabelo preso pela metade em uma trança, adornada por acessórios, a outra metade que caia solta flutuava atrás de mim. O vestido lilás claro, com detalhes brancos, era leve, adequado ao clima quente, e meu colo exposto estava enfeitado com um colar de joias.
Não era extravagante demais nem simples demais, sendo a roupa ideal.
“Vamos logo. Você está ótima. A protagonista da noite não pode se atrasar demais.”
“Eu não sou a protagonista, vovô. Por que seria?”
“Se não você, quem mais? Não duvide do julgamento do seu avô, vamos.”
Incapaz de resistir ao vovô me empurrando por trás, coloquei as mãos na cintura.
“Vovô. Sabe que não pode entrar no salão me escoltando.”
Realmente não era fácil. Assim que souberam que o baile se realizaria, tanto o Russell quanto o vovô insistiram em ser meus parceiros. Acabei aceitando o convite de Russell para que ele não chorasse, mas o vovô não se conformou com isso.
“Se for por sua relação com a família Grace, não há necessidade de esconder. Em breve, todos irão saber, de qualquer maneira.”
“Mas eu falei que quero manter o segredo até a formatura. Se não, iriam fazer fofocas sobre você, vovô.”
“Eu não me importo! Mas, bem. Já que quer tanto assim ocultar nossa relação, preparei um disfarce. Assim, ninguém saberá que o seu escolta sou eu.”
Cansada, olhei para o vovô com os olhos arregalados. A trança prateada caindo por um lado do ombro já entregava que era ele, para quem for que olhasse, mas o pior era a máscara de coelho que ele usava. Sabe-se lá onde ele a obteve.
“Mesmo com os olhos fechados se percebe que é você.”
“Que cruel, minha própria nora dizendo algo assim…”
“Vovô…”
Os ombros dele afundaram quando continuei negando com severidade.
Meu coração amoleceu um pouco ao ver isso, mas não podia fraquejar. Girei nos calcanhares e segurei no braço de Russell, que estava nos rondando.
“Vamos, Russell.”
Cada vez que caminhava, o vestido farfalhava ao meu redor. Quanto mais nos aproximávamos do salão, mais brilhantes ficavam as luzes.
“…Russel.”
Enquanto repassava o que tinha estudado sobre as regras de etiqueta aristocrática e escoltas, percebi que tinha uma coisa errada.
“Por que você está usando um tutu de balé?”
Não tinha percebido antes porque tinha caído muito bem nele. Mas além do tutu, Russell também estava usando uma coroa para crianças.
“A professora Janna e as fuinhas me arrumaram.”
“Fuinhas… seus colegas de classe?”
“Sim.”
Russell, tocando as bochechas com timidez, girou seu corpo, acanhado. O tutu tinha ficado bem nele, então qual era o problema? Assenti e continuei a andar, mas logo parei de novo.
“Por que está esticando os braços assim?”
“Me carrega.”
“…Não acho uma boa ideia…”
Russell seguiu esticando os braços, movendo as mãozinhas em minha direção.
Logo, entrei no salão de baile com ele nos braços. Talvez devido ao evento inesperado, muitas cabeças se viraram em nossa direção.
‘O homem-besta urso!’
Surpresa, me movi para longe para evitar o estudante enorme do clã dos ursos. Logo, Russell pediu para descer dos meus braços e correu pelo salão, procurando o que comer.
“Uff…”
Fiquei sozinha olhando ao redor, onde estudantes estavam dançando com seus parceiros. No meio da multidão, fiz contato visual com Hendry, que estava dançando com um garoto do clã das serpentes.
Os sorrisos das pessoas, iluminados pelas lamparinas, de alguma maneira me trouxeram uma sensação de felicidade. Absorvendo essa cena, que eu jamais poderia presenciar se ainda fosse uma coelha bebê, procurei Russell com os olhos.
Ele estava mostrando a dança tradicional do clã das lebres que eu tinha lhe ensinado a uma
colega de sua idade. Então era por isso que Hendry tinha enfatizado que ter um parceiro para o baile era importante. Me senti deslocada e solitária.
Parada num canto, de repente vi algo bizarro que me fez arregalar os olhos.
“… Quem é ele?”
Um rapaz que eu não tinha visto se aproximar estava bem do meu lado. Mas isso não era tudo. Ele tinha de alguma maneira obtido uma máscara de coelho igual a do vovô e estava a usando com orgulho.
‘Máscaras de coelho estão na moda?’
O vovô também estava usando uma… Já que pareciam ser populares, talvez eu estivesse sendo rude ao pensar que eram bizarras. Afinal, eu não conhecia muito sobre a etiqueta de bailes. Me afastei com um passo para o lado.
O homem me seguiu, também dando um passo. Acabamos lado a lado outra vez. Lancei um olhar suspeito para ele.
Ele tinha um físico semelhante a Ahin, então me perguntei se ele tinha comparecido em segredo… Mas, mesmo que eu considerasse que aquele cabelo loiro fosse uma peruca, os olhos lilás claro por trás da máscara eliminavam essa possibilidade.
‘Ele é um estudante da Academia?’
Devia ser do clã das lebres, como eu. Talvez por isso estivesse se aproximando, por sentir uma afinidade?
Quando tentei me afastar outra vez, o rapaz me estendeu a mão, delicadamente. Nesse momento, a música mudou para uma canção lenta. Atordoada, percebi que ele estava me chamando para dançar.
‘Mas ele se parece muito com Ahin…’
No entanto, seu odor não era familiar, e as mãos estavam cobertas com grossas luvas de cetim, me impedindo de comparar.
Continuei com a cabeça dando voltas enquanto aceitava a mão dele e era conduzida suavemente pela grama.
“Ahi…”
Quase o chamei pelo nome, mas parei. E se não fosse Ahin, afinal? Mesmo que ele fosse um louco, me seguir até aqui seria demais. Fechei a boca e voltei a abri-la, fazendo uma pergunta.
“…Se não se importar, posso perguntar o seu nome?”
Falei com uma voz agradável, mantendo uma pressão silenciosa. O homem de olhos lilás não falou nada, e apenas sorriu.
Tentei checar se ele tinha caninos, mas a máscara de coelho cobria a sua boca. Dependendo da situação, eu seria acusada mais uma vez de traição. Olhei para cima procurando Quinn, o dedo-duro, mas não o vi em lugar nenhum.
Quando a música terminou, dei um sorriso constrangido, pensando que era a minha deixa.
“Bem, então, adeus…”
Cumprimentei de uma maneira incômoda e comecei a me afastar, retirando a mão que ainda estava sob a dele. No entanto, o rapaz colocou força na mão que segurava a minha, e não consegui me soltar.
“….?”
Me larga! Agitei o braço para desvencilhar minha mão, mas o homem as manteve juntas como se estivessem coladas.
‘Esse…!’
Tinham tantos loucos assim nesse continente? Quando preparei os braços para empurrá-lo, escutei.
“Tem panteras negras selvagens soltas no campus?”
“Sssh, fale baixo!”
O guarda de segurança, que levantou a voz sem perceber enquanto conversava com um colega, tapou a boca com a mão.
‘Panteras negras?’
Ash, que tinha vindo a Academia naquele dia e mordido a cabeça de Evelyn, apareceu em minha mente. Não me diga que é ela, outra vez?
Se os guardas a pegassem, podiam maltratá-la. Antes mesmo de conseguir pensar racionalmente, meus pés começaram a se mover.
***
Reagindo à expressão “pantera negra” como um raio, Vivi desapareceu em segundos.
Que tipo de mulher-besta lebre reagia mais a uma pantera negra que uma pessoa que de fato era do clã das panteras? Tendo sido deixado para trás, Ahin piscou e finalmente riu.
Por um tempo, o salão de baile ficou alvoroçado, mas logo os guardas acalmaram os presentes e tudo voltou ao normal.
“Esse meu neto… Se resolveu vir disfarçado e em segredo, para quê trouxe as panteras?”
Lillian resmungou, enquanto se aproximava de Ahin. Vendo a máscara de coelho que o outro usava, por um segundo, Ahin se perguntou se a dele também parecia bizarra ou não.
“Quando se trata de Vivi, elas não aceitaram ficar para trás. A família Grace foi completamente dominada sob o estandarte do coelho.”
“Ainda há espaço para melhora. Para simbolizar melhor esse poder, devemos construir um escritório tamanho coelho para gerenciar o clã. Falarei com Valence.”
Surpreendentemente, Lillian respondeu de modo sério. Ahin o encarou sem expressão.
Normalmente, não seria a coelha que passaria a fazer parte da família Grace, seguindo seu comando, e não o contrário? Percebendo que o senso comum sobre gerenciamento do clã de Lillian tinha evaporado, Ahin sorriu, levantando a máscara.
“Você mudou muito, velho.”
“Para melhor. Afinal, a minha nora salvou a sua vida…”
Lillian, que estava respondendo, parou de respirar por um momento. Foi porque, ao ver o rosto de Ahin usando uma peruca loira, por um segundo, pensou estar vendo seu filho Edith. Sem entender, Ahin inclinou a cabeça.
“Meu pai pediu que eu dissesse ao meu avô que ele o amava muito.”
“…”
“Desculpe por só dizer isso agora.”
Ahin, que tinha sido a única testemunha dos últimos momentos de Edith, tinha, finalmente, entregado as palavras que tinham sido confiadas a ele.
Graças a ter obtido o controle total dos feromônios de dominação, ele finalmente tinha conseguido aceitar a morte do pai. O mesmo aconteceu com Valence e Lillian.
Pensando que era uma sorte que a máscara de coelho ocultasse seu rosto, Lillian colocou as mãos atrás das costas.
“Você só me chama de avô nessas horas. Por isso que não é um neto adorável.”
“Digo o mesmo.”
Ahin colocou de volta a máscara, escondendo completamente seu rosto. Então, neste momento, Hendry se aproximou dele por trás, com cautela.
‘Ele… é um homem-besta lebre? Não era uma pantera negra?’
A dança de Vivi e Ahin tinha chamado a atenção dela.
“Ei, você… Por acaso você é o namorado de Vivi?”
“Isso não soa nada mau.”
“…Aquele que é um lixo, que não presta?”
Ahin, coçando o queixo, perguntou a Lillian.
“Como ela sabia?”
“Deve estar escrito na sua cara.”
“Estou usando uma máscara.”
“Sua personalidade não se pode ocultar com uma máscara. Esta estudante é a melhor amiga de Vivi, então não seja rude com ela.”
“Eu acho que ela quem foi rude comigo.”
Hendry alternou o olhar entre Lillian e Ahin, confusa. O namorado de Vivi parecia satisfeito ao ouvir que era um lixo, e agia como amigo íntimo do diretor.
“Vou embora, velho. Antes que Vivi me traia com Ash.”
Se perguntando se Ash já tinha voltado para Lile a essa altura, Ahin olhou para a torre do relógio e girou nos calcanhares.
“…Espera um minuto!”
Hendry, que estava determinada a salvar Vivi do homem-besta maligno, gritou. Ahin, parando, levantou ligeiramente sua máscara e sorriu.
“Não se preocupe. A única ocupação deste lixo aqui é correr atrás de Vivi.”
Pensando que Vivi era a única pessoa do clã das lebres que ela conhecia, Hendry se perguntou por que, então, aquele rosto lhe pareceu familiar. Ela ficou olhando as costas de Ahin enquanto ele se afastava.
No fim, ela não conseguiu entender, mas tinha uma coisa que era certa. Vivi devia ter se apaixonado por ele por causa do seu rosto bonito.
***
Enquanto eu cruzava o mato, escutei um som tenebroso. Parecia um som de algo se debatendo dentro da água.
‘Não pode ser…’
Logo, percebi que estava indo na direção do lago, então apertei o passo.
‘Ash… Ash…’
Assim que cheguei na beira do lago, vi dois animais que tinham caído dentro da água escura, lutando para nadar. Eram filhotes de panteras negras. Sem parar para pensar no que eles estariam fazendo ali, me joguei no lago.
“Shu! Bion!”
Determinada em salvá-los, comecei a caminhar pela água, até enxergar algo mais.
“Barra…?”
Barra estava no meio do lago, prestes a resgatar os bebês. Chocada com a facilidade que ele teve em morder ambos pela pele do pescoço e andar de volta para a margem, percebi que a água era rasa e não passava da altura de minhas coxas.
‘…Mas o que…’
Shu e Bion, seguros na grama, estavam rolando de rir ao me verem toda molhada. Esses pequenos… Deviam ter pulado na água de propósito para me pregar uma peça!
Determinada a dar uma boa bronca nos dois piadistas, girei para sair da água, quando notei uma presença.
O homem que usava aquela bizarra máscara de coelho tinha vindo atrás de mim e estava parado a uma distância.
De pé no meio do lago, fiquei olhando para ele, sem me mover. A brisa noturna tocou seus cabelos loiros.
Senti vontade de chorar e mordi os lábios para me segurar. Ia pedir Ahin em casamento hoje, já que estava bem arrumada, mas por que nada saia como eu esperava? Parecia que toda vez que ele me via, eu estava feia.
Ele tinha me visto rolando no chão empoeirado e toda salpicada de tinta preta e fugindo de bestas com uma cara desesperada. E quando virava humana, sempre aparecia pelada. E nesse exato momento, devia parecer um fantasma do lago.
‘Se ele ia se disfarçar, devia ter feito um trabalho melhor.’
Tinha ficado na dúvida porque ele tinha até mesmo mudado a cor dos olhos, mas o brinco prateado que eu tinha dado a ele, para que usássemos o par cada um em uma orelha, provava claramente a identidade do homem na minha frente.
Enquanto eu o olhava, em silêncio, ele se moveu devagar, como se fosse se aproximar.
“…Se vier para perto de mim agora, nunca mais vou te dar um tapa no traseiro.”
O corpo dele se petrificou. Só havia uma pessoa no mundo que reagiria a essa ameaça absurda.
Encarei a máscara de coelho com um olhar de desaprovação e rangi os dentes.
“Tira isso.”
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.
Lucien
Eu tenho dó e ao mesmo tempo rio muito da vivi