A Vilã, Cecilia Sylvie, decidiu se travestir - V4 03 - A Natividade e o Mercado Naissance (5)
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Aconteceu tão rápido que Oscar nem teve tempo de contemplar. Ao ver sua noiva sendo levada pelo deslizamento de terra, ele entrou em ação antes que qualquer pensamento pudesse se formar em sua cabeça, antes que qualquer emoção tivesse a chance de influenciar sua percepção da situação.
“Você está no comando agora, Dante!”
“Espere, Oscar!”
“Não se atreva a tentar me impedir!”
Dante tentou agarrar o príncipe, mas Oscar afastou a mão dele. Mas alguém deveria tê-lo impedido de tentar algo tão tolo, ou melhor, ele deveria ter pensado melhor e permanecido onde estava. Seu corpo e mente não eram só dele. O príncipe pertencia à nação. Ele nasceu para se tornar uma das engrenagens da grande máquina que a mantinha funcionando. Ele não tinha permissão para se colocar em perigo. Ele não tinha permissão para deixar as emoções tomarem conta dele. Todas as suas ações deveriam ser guiadas pela razão, pela racionalidade fria, pois isso era no melhor interesse da nação.
Oscar estava ciente disso, é claro. Bastante.
O curso de ação mais lógico teria sido permanecer seguro dentro da cúpula protetora e esperar o deslizamento de terra passar antes de sair em busca de Cecilia. Mas essa não parecia uma escolha que ele pudesse fazer. Não era uma opção.
Sem seu artefato, as chances de sobrevivência dela eram mínimas.
Oscar começou a correr e pulou no rio atrás de Cecilia.
* * *
Quando Cecilia acordou, ela se viu olhando para um teto desconhecido. Esta foi a terceira vez no período de um ano que isso aconteceu. Mas, nesta ocasião, ela não enxergou nem uma carruagem nem uma cabana nas montanhas. O teto parecia feito de pedra. Mais uma nova experiência para ela.
Ela se sentou, seu corpo pesado. Um cobertor fino deslizou até suas coxas. Ela olhou em volta, seus olhos ainda não totalmente focados. Ela parecia estar dentro de uma caverna.
Alguém acendeu uma fogueira. Suas roupas molhadas estavam espalhadas sobre uma grande pedra ao lado de outro conjunto de roupas, de um tamanho maior do que as dela, sobre uma grande pedra para secar.
Caixas de madeira estavam alinhadas nas paredes. Talvez esta caverna fosse um ponto de parada para caçadores. O cobertor com o qual ela estava coberta devia ter vindo de uma daquelas caixas.
“Mas quem colocou isso em mim…? Argh!”
Cecilia se dobrou de dor. Ela estava toda machucada. Ela arregaçou as mangas da camiseta e descobriu que estava com hematomas. A corrente do rio a golpeou contra as rochas. Qualquer lugar onde sua pele estivesse exposta, como mãos e tornozelos, estava coberto de arranhões. Sentia uma dor aguda nas bochechas e no pescoço, então seu rosto provavelmente também não estava bem. Nas costas da mão dela havia cortes profundos, ainda sangrando. Ela abriu e fechou as mãos algumas vezes.
‘Com certeza doi, mas pelo menos posso me mover…’
“Eu sobrevivi?”
“Você não esperava sobreviver?”
“Hein?”
Ela olhou para cima e viu alguém parado na entrada da caverna. Ele tinha cabelos ruivos e estava nu da cintura para cima. Ela não conseguia distinguir o rosto dele no escuro, no entanto.
“Aah!” ela gritou quando ele começou a se aproximar.
“Calma. Sou só eu.”
“Ah… não te reconheci, Oscar…”
“Achei que você não ia acordar.”
Ela ouviu um profundo alívio em sua voz. Ele devia estar muito preocupado. Ele se agachou ao lado dela e limpou algo de sua bochecha e testa. Ela imaginou que fosse sujeira. O calor de seu toque era reconfortante. Ele sorriu, pensando que tudo ficaria bem agora que ela havia acordado.
“Você está bem?”
“Doi por todo lado…”
“Sinto muito.”
Oscar olhou para ela com simpatia, mas pareceu aliviado por ela estar em condições de conversar sem problemas. Ele se levantou e sentou-se em frente dela. Por um tempo, o único som na caverna foi o crepitar da fogueira na frente deles. Então, Oscar falou.
“Eu dei uma olhada lá fora. Não conheço estas partes, mas não parece que o rio nos levou muito longe. Fiz marcadores, para que os outros encontrassem facilmente quando eles começarem a verificar o rio.”
“Por que não voltamos?”
“Não é uma boa ideia. É uma longa caminhada até a estrada. Não conseguiríamos chegar antes que escurecesse e, de qualquer forma, não é seguro passear por um rio caudaloso à noite.”
Cecilia virou a cabeça em direção à entrada da caverna. Ainda não estava escuro como breu lá fora, mas o céu já estava escurecendo. Oscar estava certo; era melhor desistirem de caminhar de volta à estrada.
“Ah, certo.” Ela se virou para ele. “É meio tarde para dizer isso, mas acho que devo a você por salvar minha vida?”
“Você não me deve nada, mas sim, eu salvei você.”
“Não sei como agradecer!”
“Está bem…”
‘Espere, o que há com ele?’
Havia algo estranho em Oscar. Ele não parecia magoado, mas continuou evitando o olhar dela. Preocupada, Cecilia cutucou seu braço com um dedo.
“Oscar?”
“Ceci…”
Ela fez com que ele olhasse para ela, mas ele congelou por um momento antes de fechar os olhos e esfregar a testa.
‘Ele está… com raiva de mim?’
Por que ela não tinha pensado nisso antes? Ela agiu de forma tão imprudente. Ela só pensou em salvar Elza, sem perceber que também precisaria se proteger. Oscar arriscou a vida para tirá-la daquele rio. Ele tinha um bom motivo para estar chateado.
Cecilia baixou a cabeça e pediu desculpas sinceramente.
“Sinto muito, Oscar, fui muito idiota! Você poderia ter morrido por minha causa! Eu sinto muito, muito mesmo!”
“Você certamente é impulsiva, mas me prometa uma coisa…”
“S-sim?”
“Não fuja para outro país. Por favor.”
“Espere… Quê?”
Não tendo ideia do que se tratava, ela lançou-lhe um olhar perplexo.
“Você não notou nada?” ele perguntou, um pouco exasperado.
Ela ainda não sabia o que ele queria dizer, mas em vez de pedir esclarecimentos, tentou descobrir sozinha.
‘Estamos em uma caverna… sentados em frente a uma fogueira, com nossas roupas secando ao lado. O cobertor que Oscar colocou em mim está cobrindo meu colo…’
“Eh?”
Algo não parecia certo quando ela olhou para o cobertor, mas ela não conseguia identificar o que era. Ela estava vestindo uma camisa e calças. O cobertor estava sobre seu colo, com as mãos feridas apoiadas nele.
Cecilia ficava olhando da camisa para as calças, para o cobertor, para os ferimentos nas mãos e vice-versa.
‘É… a camisa?’
Ela finalmente percebeu o que estava errado. Sua blusa. Parecia muito apertada; o terceiro botão em seu pescoço ameaçava se desfazer, expondo sua pele nua por baixo.
‘É uma camisa masculina, então é claro que fica muito apertada aí… né? Espere um segundo…’
Ela levou a mão ao peito. Era macio ao toque.
“Oh, não!”
Em pânico, ela puxou o cobertor até o queixo. Seu corpo estava quente, e não era só por causa do cobertor. Ela furtivamente olhou para baixo. Não havia dúvida sobre isso: a faixa que ela usava para amarrar os seios havia se desfeito. Deve ter acontecido quando ela caiu no rio.
Cecilia puxou os joelhos contra o peito, tentando parecer menor. Algo fez cócegas em seu ombro. Ela estendeu a mão para ver se algum barbante ou algo estava preso em sua roupa.
‘Isso não é uma corda! É meu cabelo! Eu perdi minha peruca também?!’
Seu cabelo loiro mel estava solto, caindo por suas costas.
Ela estava sentada ao lado de Oscar sem peruca, com os seios lutando visivelmente contra a camisa que usava.
“Eu… Er…” Sua voz estava tremendo.
Ela olhou para Oscar e viu que ele também estava olhando para ela com o canto do olho.
“Já faz muito tempo desde a última vez que nos encontramos, Alteza…”
“Você vai mesmo fingir que tirei Cecilia do rio por acaso depois de mergulhar para salvar Cecil? Vai dizer que vocês são pessoas diferentes?”
Ela não tinha certeza por que havia pensado em tentar. Oscar não era estúpido.
“Uh… hum…”
“Você poderia falar comigo normalmente? Está ficando tarde, estamos ambos cansados e você está tornando as coisas estranhas.”
“Eu vou… vou tentar…”
Ela abandonou a formalidade, mas não sabia o que dizer a ele. Em vez disso, ela olhou para a fogueira, com os pensamentos acelerados.
O plano era eventualmente contar a ele que ela estava frequentando a Academia disfarçada, mas ela não queria que a grande revelação acontecesse fora de seu controle. Todas as falas que ela estava ensaiando eram inúteis agora.
Oscar tentou quebrar o gelo.
“Posso te chamar de Cecilia agora? Se você preferir que eu ainda te chame de Cecil, por mim também está tudo bem…”
“Hum… Cecilia está bem…”
“Tudo bem.”
“…”
“…”
O silêncio tenso continuou.
‘Isso está me estressando muito!’
Na verdade, era ela quem dificultava as coisas, mas o constrangimento era tão insuportável para ela quanto para Oscar.
Se fosse um dia normal no campus, ela seria capaz de fugir da situação. A atmosfera carregada estava lhe causando grande ansiedade. Mas ela estava em uma caverna no meio de uma floresta, era noite e tinha acabado de começar a chover. Não havia outro lugar para ela ir. Ela estava presa lá com Oscar.
‘O que eu faço agora…?’
Pálida e angustiada, Cecilia se encolheu e olhou para o chão. Oscar pegou um tronco seco e jogou na fogueira. O fogo crepitou mais alto e as chamas subiram brevemente.
Cecilia deu uma olhada rápida no perfil de Oscar. Sua expressão era neutra como sempre, talvez um pouco expectante. Mas ele não estava bravo ou irritado com ela.
“Posso te perguntar uma coisa, Oscar?”
“Claro.”
“Talvez eu seja ruim nisso, mas você não parece tão surpreso.”
“Eu não estou.”
“Não me diga que você sabia que era eu?”
Ele olhou para ela como se não pudesse acreditar que ela havia dito isso. Depois de piscar algumas vezes, ele voltou para o fogo.
“Sim”, ele admitiu, após uma pausa hesitante.
“Desde quando?”
“Desde o verão passado.”
“O quê?!” Sua voz saiu em falsete.
Cecilia pensou que talvez já se passassem alguns dias, ou talvez semanas, desde que ele percebeu seu disfarce. Ela nunca teria suspeitado que ele tinha notado a verdade há quase meio ano. E se ele percebeu que era ela no verão passado, então deve ter sido durante a excursão…
“Foi… foi quando estávamos na casa de campo?”
“Sim.”
“Por que você não disse nada?!” ela exclamou acusadoramente, sem pensar.
Oscar não se incomodou com a atitude repentinamente agressiva dela.
“Porque Gilbert me disse que você fugiria do país se soubesse que eu sabia.”