A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 127
Uma mão surgiu por trás de mim e segurou a maçaneta. A porta foi fechada e o interior do closet esplêndido desapareceu do meu campo de visão. Como eu não falei nada, a voz que eu tinha ouvido a noite inteira sussurrando em meus ouvidos falou.
“Tem a intenção de fugir?”
“Não é isso…”
Não conseguia pensar em uma desculpa, então abaixei a cabeça.
“Estou desapontado. Não esperava ser abandonado depois de ser devorado por uma coelha. Você estava cravando as unhas nas minhas costas como se fosse ficar aqui pelo resto da vida essa madrugada.”
“Não diga isso em voz alta!”
Tentei mais uma vez entrar no closet, mas Ahin se colocou na frente e bloqueou o caminho. Não era uma surpresa que ele o fizesse, já que era quase do tamanho da porta em si. No entanto, havia muitos problemas com o fato de que ele estava vestindo apenas uma calça fina.
O torso musculoso, que eu não tinha conseguido enxergar bem à noite, preencheu meu campo de visão. A água ainda pingava do cabelo prateado desarrumado, escorrendo por seu peito. Talvez eu realmente tenha sido uma guerreira que salvou o continente na minha vida passada, para receber tal prêmio.
Sentindo o rosto esquentar, discretamente passei a borda do lençol pelo meu nariz. Felizmente, não estava sangrando. Tossindo pra disfarçar, falei, olhando para baixo.
“Ahin, preciso de roupas.”
Ele deve ter vindo correndo do banheiro para me impedir de propósito.
“Se quiser mesmo, levante a pata traseira.”
Quando eu estava começando a erguer o pé, percebi o truque e pisei com força no chão.
“Não faça essas brincadeiras! Agora eu sou humana.”
“Então não posso te servir no jantar?”
“Claro que não!”
“Então fez as pazes com o chef? Pensei que não se davam bem.”
Eu ter me humanizado e ter melhorado meu relacionamento com o chef eram assuntos totalmente distintos. Enquanto eu apertava os lábios para não responder nada, meu corpo foi erguido no ar.
Ahin me carregou junto com o lençol e me colocou de volta na cama. Novamente, estava ali, debaixo das cobertas. Pensei sobre a noite anterior.
Como pude ter tido a coragem de tirar a camisa de Ahin? Os olhos dele tinham mudado completamente depois disso, e ele ignorou meu pedido de apagar a lamparina, e somente palavras frívolas saíram de seus belos lábios…
“Não está com fome?”
A voz dele me trouxe de volta a realidade. Coloquei a cabeça para fora do cobertor. Sentado na cama, ele estava abotoando sua camisa. Parecia que iria buscar o café da manhã por si próprio.
Em outras palavras, estava claro que ele não tinha nenhuma intenção de me deixar sair do quarto.
“…Vou voltar para a Academia.”
“Sem mim?”
“Eu ia voltar para a mansão Grace durante as férias de verão, de qualquer modo…”
Comecei a me levantar, e mais uma vez, Ahin, me arrastando pelo lençol, me segurou. Sentada no colo dele, coloquei a cabeça para dentro do lençol para ocultar minhas orelhas vermelhas. Não consegui seguir adiante com o plano de retirada sem fazer uma pausa estratégica.
“Vivi, você pode fazer o que quiser aqui.”
Os olhos de Ahin estavam curvados como meias-luas. Ele falou numa voz suave.
“Se quiser, arrumo professores melhores do que a Academia. E qualquer livro que você quiser, obterei.”
Por isso, fique aqui para sempre. Essas últimas Ahin não falou, mas ficou entranhado em meus ouvidos. De fato, esse covil de panteras negras era um lugar dos sonhos.
A biblioteca era quase do mesmo tamanho da biblioteca da Academia, e a riqueza e poder do clã das panteras negras não tinha comparação. Acima de tudo, Ahin estava aqui.
Suprimindo minha vontade de ser complacente, evitei os olhos dele com dificuldade.
“Ainda assim, eu tenho que voltar.”
Para poder ficar ao lado dele. Ahin era a pessoa de maior status no território. Enquanto isso, eu, apesar de provir de uma família de nobres intermediários, não tinha identidade confirmada.
A oferta que o vovô fez ao me convidar para frequentar a Academia tinha sido sobre isso. Se eu me formasse na Academia Belhelm, um feito que só consegue ser alcançado por poucos, teria uma honra equivalente a de um nobre mediano.
Felizmente, as pessoas nos territórios de predadores eram muito mais poderosas do que em territórios herbívoros. Já que os rankings em territórios herbívoros eram geralmente dados com base em disciplina e pedigree, os feromônios eram um grande diferencial, que podiam gerar muito poder. Nos territórios de predadores, já era um requisito mínimo ter feromônios excelentes.
Com os meus feromônios curativos, capazes de superar até mesmo os feromônios de dominação de Ahin, estava feita. Eu só precisava de status e me acostumar a viver como um ser humano para poder estar ao lado dele sem envergonhá-lo perante ninguém.
Enquanto pensava sobre isso, agarrei o colarinho de Ahin sem perceber, com a mão trêmula.
“Por favor, espere mais um pouco. Confie nesta Vivi.”
Lancei um olhar confiável para ele. Ahin, me encarando sem responder, abriu os lábios lentamente.
“Então, eu vou junto.”
“…Como?”
“Para a Academia.”
Ele ficou louco?! Ia ficar perambulando pela Academia, vestindo um uniforme, no meio de toda a confusão política?
Dei um tapa na boca dele e lutei para sair dos braços de Ahin. Mas ele apertou minha cintura, fazendo meu esforço ser inútil.
“Vivi, já é tarde demais para ir à aula hoje, de qualquer modo. E meu avô está aqui na mansão, também.”
“O vovô está aqui?!”
“Vocês ficaram bem próximos, hmm. Sua voz parece alegre.”
Perante a interrogação de Ahin, mudei minhas palavras.
“Bem, já que vim até aqui, quero dizer oi à Senhora Valence primeiro.”
Eu não precisava mais evitar todo mundo… Meu coração começou a vibrar de alegria, pensando em todos os rostos que eu queria ver. Estava ansiosa. De repente, perguntei.
“Ahin, onde está Ash?”
“Ash? Bem…”
Ele parou a frase na metade, fazendo meu coração disparar. Ansiosa, esperei que ele continuasse.
“Tem uns pequenos problemas com ela.”
“…Problemas?”
“Literalmente, é algo pequeno…”
Como assim? Não consegui entender. Me senti empalidecer.
“Onde está Ash?!”
“Depois do café da manhã, posso te levar…”
Parei de escutar a voz de Ahin. Quando dei por mim, estava abrindo as cortinas da janela.
“… Vivi?”
Saí para a varanda enrolada no lençol. Quinn, que estava empoleirado no parapeito, moveu as asas, envergonhado.
“Quinn, não vá embora. Sei que você esteve ao meu lado o tempo todo.”
Desde o dia que eu tinha deixado a mansão Grace, sabia que Quinn sempre estava em algum lugar próximo, cuidando de mim. Por isso, consegui ter coragem durante esse um ano e meio.
“Me leve para onde Ash está.”
Eu não tinha um minuto a perder.
“Por favor.”
Sem esconder meu nervosismo, envolvi meu corpo em uma luz branca. Logo, o lençol caído no chão se moveu quando uma lebre cavou um caminho para fora e se agarrou com força na perna de Quinn.
Flap. Felizmente, a águia não resistiu e alçou voo. Enquanto isso, Ahin, deixado para trás, ficou repassando a cena que tinha acabado de acontecer.
Antes de voltar a sua forma original, Vivi tinha sacudido os quadris, enrolada em um lençol? Pareciam ser movimentos calculados, como se ela não os tivesse feito apenas uma ou duas vezes.
Sentindo que estava alucinando, ele saiu para a varanda. A bola de algodão agarrada na águia estava se afastando no ar.
Era estranho. Somente ao ver essa cena bizarra ele se deu conta de que Vivi realmente tinha voltado para casa.
Além disso, ele tinha imaginado que, uma vez tendo se humanizado definitivamente, ela ficaria relutante em voltar à sua forma animal. Mas era ao contrário, pois ela parecia ter muita experiência em mudar de forma.
Como ele poderia conter uma coelha que sabia voar? Ahin, rindo sozinho, se sentiu solitário.
***
O trabalho de Meimi era ser uma “sombra” da família Grace. A adaga era seu meio de vida, e infiltrar-se era sua especialidade.
Não demonstrar emoções era essencial para espiões como ela, que tinham que operar nas sombras. Parcialmente por sua personalidade quieta, Ahin tinha a designado para o posto permanente de criada e guarda-costas de Vivi.
Clack. Paf. Clack.
As adagas voaram, perfurando os olhos do boneco de madeira. Depois do treinamento matinal, Meimi afastou o cabelo vermelho, que tinha sido cortado na altura das orelhas.
Sua rotina era monótona. Desde que Vivi tinha desaparecido, Meimi havia recebido uma folga permanente, sem data final definida. A maioria dos empregados pularia de alegria, mas ela estava estranhamente entediada.
Uma coelhinha bebê tinha aparecido na sua vida de repente. Ela tentava encobrir as bagunças que Ash fazia, fingindo que tinha sido ela mesma. Ela sempre ia cedo para o quarto, para que Meimi pudesse descansar mais rápido, e mesmo quando rolava na lama, pedia um lenço para se limpar por si mesma.
No dia em que a coelha bebê quase morreu pelo ataque da mulher-besta lobo, enquanto Meimi estava longe, Vivi havia implorado para Ahin não cortar o seu pescoço. Não era incomum que uma sombra como ela perdesse sua vida ao cometer um erro daqueles.
Percebendo que toda vez que deixava sua mente divagar, ela pensava na coelha, Meimi coçou a nuca, constrangida. E então…
“O que é aquilo…. Quinn? Mas… na perna dele…”
A mão de Meimi afrouxou, e a adaga que segurava caiu no chão com um estrondo. Os criados ao redor também estavam olhando para cima e cochichando entre si. Jardineiros, no meio das podas matinais, abandonaram seus serviços para olhar para o céu.
Uma expressão de assombro começou a surgir no rosto inexpressivo de Meimi. Os olhos vermelhos se arregalaram.
“…Senhorita Coelha…?”
Uma bola de algodão sendo carregada pela águia se refletia nos olhos dela. Ela tinha mudado de aparência, mas só havia uma lebre nesse mundo que era capaz de montar em uma águia.
“Senhorita Coelha!!”
<Meimi!!>
Pensando que era perigoso, a criada gritou e estendeu os braços, como se preparando para agarrar a bola de algodão no ar.
<Mas o que isso quer dizer?>
Vivi olhou para baixo, vendo que Meimi acenava os braços com urgência. Era uma boas-vindas radical para ela, que nunca se alterava.
<Tenho medo, mas…>
Apesar disso, Vivi não podia ignorar as boas-vindas de Meimi. Era a primeira vez que ela se emocionava tanto assim.
Então, Vivi soltou as pernas da águia e pulou. Ela não tinha dúvidas de que Meimi a pegaria em segurança. Enquanto isso, Meimi estava em pânico de cometer algum erro, como tropeçar, por exemplo. Incapaz de piscar, ela correu com os braços estendidos.
A figura da lebre ia aumentando, como um panorama. Logo, o corpo de Vivi foi apanhado pelas mãos calejadas da criada.
<Há quanto tempo.>
Alegre, Vivi agarrou o polegar de Meimi e o sacudiu. No entanto, sem sorrir junto, Meimi acalmou seu coração disparado e gritou.
“O que a Senhorita está fazendo?!”
Surpreendida pela repreensão, Vivi abaixou as orelhas. Meimi era quem tinha dito para ela pulasse… Achando que a bronca era injusta, Vivi logo percebeu que a expressão no rosto de Meimi era de total preocupação.
“Sabe o quanto que eu…!!”
Meimi, gritando outra vez, olhou para a lebre, que agora tinha o tamanho de dois punhos. Ela parecia ter se humanizado definitivamente, e não parecia mais ter medo de predadores. Tinha valido a pena ficar esperando na frente do portão principal todo o inverno.
Com os lábios trêmulos e lágrimas nos olhos, Meimi chorou por um longo tempo, abraçando a coelha por quem tanto tinha esperado.
***
Depois do reencontro com Meimi, voltei a subir em Quinn para procurar Ash outra vez. O destino final onde a águia me levou não foi o quarto de Evelyn, onde Ash costumava ficar, mas uma varanda decorada com um parapeito dourado.
<Ela realmente está aqui?>
Olhando ao redor com suspeitas, saltei da águia e entrei no quarto pela porta aberta da varanda.
<Ash…?>
Puxei as cortinas com as patas dianteiras, revelando um quarto grande e confortável. Olhei para cada canto, mas não vi Ash.
“Miauuu…”
Então, ouvi o som de um animal. Mas o miado de Ash não era tão fino. Quando virei a cabeça, me petrifiquei. Duas panteras negras estavam se aproximando.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.