Não é seu filho - Capítulo 57
— O que infernos aconteceu no meio da noite? O que há de errado com o pai? Como pode, de repente…
— O lorde nunca foi de fazer algo estranho…
Vendo o estado do lorde, inconsciente e suando frio, os subordinados do lorde lançaram olhares inquisitivos à Hemming.
Eles queriam que ela explicasse a situação, que não conseguiam entender de jeito nenhum. Entretanto, Hemming também estava em uma posição em que precisava de explicações, então a situação se tornou mais absurda. Nesta situação, não era certo de Hemming suspeitar que o lorde se aproximou dela com más intenções e entrou no quarto para fazer algo ruim?
No entanto, as pessoas do castelo tinham muita fé no lorde para ter tais dúvidas. Um ótimo pai, um ótimo lorde e um simples nobre. Essa era a reputação e realidade do Visconde Sheilton, o lorde de Lua.
Essa era… até ontem a noite.
Bem, o lorde condizia com sua reputação na primeira vez que Hemming o encontrou. Naquele dia, ela seguiu Kalia até o castelo do lorde para relatar seu estabelecimento em Lua.
— É uma cidade que não tem muito, mas eu espero que possam se instalar e viver confortavelmente aqui.
Ela estava bem impressionada com o quão amigavelmente o lorde sorria para Kalia e o jeito como ele cumprimentou elas enquanto segurava a mão de sua esposa.
“…Será que exagerei?”
Ela se sentiu mal pelo lorde com o quão brutalmente ela o acertou com o joelho. É claro, se ela não o fizesse naquela hora, ela não saberia se estaria bem agora… De qualquer forma, ela estava feliz que não deformou o raro lorde bom. Por sorte.
Ao final da manhã, ela tinha ganhado o ódio de quase todos do castelo. Sua esposa e quatro filhos estavam grudados do lado do lorde e assistiam de perto enquanto ele resmungava suando frio. Os funcionários do castelo também não dormiram e rezaram pela segurança do lorde, isso só era o suficiente para mostrar o quão bom o lorde era.
“Seria legal se houvesse mais aristocratas de classe média com caráter assim.”
Hemming pensou quase distraída.
Por causa de tudo que aconteceu nas últimas horas, tinha tensão excessiva pelo seu corpo, na verdade, ela sentia que iria desmaiar se não encontrasse algo para pensar.
Sua mente vagava e, involuntariamente, ela se lembrou de uma certa memória.
Um olhar penetrante, tão firme, que se olhares pudessem matar…
“…Ah, a nobreza da classe média. Se aquele nobre medíocre não fosse tão ganancioso, eu não estaria aqui agora.”
A maioria da nobreza da classe média era gananciosa. Para satisfazer sua ganância, eles atormentavam seus próprios subordinados, deixando-os sofrer e até machucando outros pelo seu próprio bem. O mesmo valia para o lorde que governava o lugar onde Hemming vivia.
Cherlo era uma rica cidade não muito distante da capital. Hemming era residente dela. Apesar de sua família viver como plebeus, suas vidas não eram ruins, pois seu pai e irmão eram habilidosos em trabalhar com couro.
No entanto, uma praga se espalhou, todos os médicos de Cherlo foram levados ao castelo à força pelo lorde tirano. Para receber tratamento médico ou receber a prescrição para remédio, tinha que pagar uma grande quantia de dinheiro para o lorde. Hemming foi sortuda o suficiente para não pegar a doença, mas todos os seus familiares foram afetados pela epidemia. Começando pela sua mãe, então seu pai e, finalmente, seu irmão.
Hemming vendeu todos os bens da família e correu para o lorde, mas ela conseguiu a prescrição muito tarde e, eventualmente, todos os seus familiares…
“Ainda assim. Pelo menos eles se foram juntos, então não ficaram solitários, mesmo em morte. Minha família…”
Hemming, que vendeu tudo e gastou toda a fortuna da família para comprar remédio para salvar sua família, não teve tempo para lamentar. Completamente dura, ela foi ao castelo daquele maldito lorde para trabalhar.
Por volta desse tempo, Kalia estava em seu caminho para a capital quando ela parou por lá e descobriu a situação de Cherlo. Kalia libertou os médicos que foram presos contra sua vontade no castelo e retornou a propriedade do povo, que o ultrajante tirano confiscou. O lorde tinha um filho que era igual a ele, cegado pela riqueza que havia tomado, arremessou xingamentos para Kalia.
O filho do lorde era um homem obcecado ao extremo com a hierarquia aristocrática. Como resultado de tais ideologias, ele insultou-a bravamente, sem hesitação, zombando dela e a criticando como um herói de guerra ‘comum’ por fazê-lo de piada.
— Como uma plebeia ousa empunhar uma espada, tentando ser uma heroína? Acha que pode arbitrariamente se livrar da propriedade de um nobre? Vou contar ao Imperador e pedir que ele a puna por pelo menos quatro anos!
Então, Kalia se zangou?
Não.
Sem piscar os olhos, Kalia descobriu todas as propriedades roubadas e as retornou ao povo. O Imperador, a quem o filho do lorde estava chamando, sequer respondeu quando a propriedade de sua família foi confiscada. Kalia deixou a cidade bem calma, com grande fanfarra, entre os clamores dos plebeus da cidade depois de sugar o lorde de sua riqueza.
No dia em que Kalia saiu, o filho do lorde, que havia despejado diversas ofensas nela, nas suas costas, caiu as escadas vazias sozinho, resultando em pernas quebradas e costelas esmagadas. Teve um boato de que uma panela caiu do segundo andar, estilhaçando no meio de suas pernas e, por pouco, não acertando sua virilha.
Era um machucado bem grave para a queda de uma escada pequena de apenas 7 degraus.
Mas Hemming viu.
Imediatamente depois de Kalia sair, um mago bonito com olhos ferozes, murmurou algo brevemente na direção do jovem lorde que ainda xingava Kalia. Quando a palavra ‘Rai-’ saiu de sua boca, Hemming não teve dúvidas de que se Kalia não o tivesse chamado, o jovem lorde teria sido atingido por um raio naquele dia.
“Tenho certeza de que era ele.”
Assim que olhou ao redor, seu olhar se desviou. Tremendo, ela fixou seus olhos em Allen, que estava prescrevendo um remédio para ela.
Naquele dia, com o mesmo olhar, ele encarou silenciosamente Hemming. O olhar feroz parecia preparado para matar alguém.
Gulp.
Sua saliva desceu sua garganta seca com um som audível. Na mesma hora, ela sentiu que o ar frio que emanava ao lado estava se aproximando.
Depois de completar a prescrição, Allen se levantou de seu lugar e ouviu uma baixa e aveludada voz chamando o nome de Hemming.
“Droga, acho que ele lembrou meu nome.”
Hemming encontrou sua coragem e olhou de volta para Sheyman.
Ele a apressou com um sorriso gélido.
— Eu acho que está na hora de me falar, agora que já limparam suas mentes…
Allen, que também se aproximou, olhou Sheyman, com um olhar estranho.
Hemming, que nervosamente mordia os lábios, abaixou seus olhos aterrorizados e forçadamente esquivou da pergunta ao mudar de assunto.
— Não está aqui para recuperar o ovo? Não se importa com o ovo…
— O outro mago é o suficiente para lidar com isso. Não se preocupe. Eu gostaria que me dissesse outra coisa.
Ele cruzou os braços e inclinou a cabeça para encarar Hemming.
O modo que ele falava era polido, mas seus olhos eram bem ferozes.
— Com licença, mas quem é você?
Num instante, o olhar de Sheyman estava sobre Allen. Olhos em chamas, ele murmurou sob sua respiração.
— Cabelo preto…
Do outro lado, Allen deu uma rápida olhada nas vestimentas do mago com curiosidade. Um uniforme branco como a neve e meia-luvas de couro preto. Em adição, maravilhoso cabelo prateado e encantadores olhos dourados. Ele era bem similar em aparência com uma das mais famosas pessoas do Império, mas ele não estaria aqui… certo?
Esta era uma das regiões mais distantes da Capital, e não importa o quão precioso seja o ovo de dragão, a distância não era curta o suficiente para um arquimago viajar em menos de um dia.
— Eu estou bem curioso sobre quem você é… – a voz de Sheyman pingava gelo enquanto divagava.
— Um homem de cabelo preto que é bem amigável.
— O quê? O que quer dizer…?
Sheyman respondeu curtamente à confusão de Allen.
— Kalia.
Os olhos de Allen estremeceram com sua resposta.
Sheyman olhou direto para ele e um canto de sua boca se levantou, em um sorriso pretensioso.
— Onde está ela?
O tom polido desapareceu rápido, e só havia uma leve zombaria direcionada a Allen, que estava olhando para ele com um olhar suspeito.
Com uma tez pálida, Allen olhou para Hemming e, em resposta, ela apertou sua testa envergonhada.
Apesar de o amanhecer se aproximar, ainda estava escuro do lado de fora e a chuva só piorava.
***
Quanto mais os três ficavam juntos, mais estranho era o ar que eles davam. Os três não podiam mais permanecer no quarto do lorde, então, eventualmente, se moveram. Depois de se acalmar, a Senhora do castelo preparou o melhor quarto de hóspede para Sheyman. Porém, não foi no quarto de hóspede, mas sim no quarto de recepção que Sheyman ficou.
O quarto era espaçoso com uma lanterna queimando que mal iluminava o quarto, envolto em escuridão do amanhecer. Os três se sentaram em confronto, opostos um ao outro, na sala de espera, sem se importar que o sol aparecia em algumas horas.
Com suas pernas cruzadas, Sheyman recostou-se em um dos sofás e encarou intensamente os dois diante dele. Sua postura parecia com um coração torto.*
(N/T.: Torto pode significar distorcido, perverso.)
Já fazia uma hora desde que os três se moveram para a sala de espera.
Sheyman manteve Hemming e Allen em sua custódia, continuando a profunda e silenciosa guerra com os dois sobre a localização de Kalia.
— Precisam de mais tempo para pensar?
— …Já te falamos que não sabemos.
— É muito ingênuo agir inocente e dizer isso com uma expressão que revela tudo. É tão…
Sheyman pausou no meio da sentença, lábios franzidos, como se escolhesse cuidadosamente a palavra.
Então, ele sorriu ligeiramente e escolheu a palavra certa para terminar.
— Estúpido.
Ele estava claramente sorrindo com seus lábios, mas irradiava completa hostilidade com seus olhos e voz. O que era desconcertante que sua hostilidade estava focada em uma única pessoa.
— Se está pensando em enrolar, posso esperar o quanto quiser. Eu já estive num inferno por vários meses…
Fixando seus olhos em Allen, Sheyman murmurou lânguido.
— Não é como se fosse difícil aguentar por uma noite.
Tradução: Kaon.
Revisão: Michi.