A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 99
Na mansão Grace.
Rune, que conseguiu se desvencilhar de um persistente Restin, encontrou Vivi bem rapidamente. Foi graças às conversas de criados que ele escutou, pois diziam que bastava ir até a área de treinamento e não seria difícil localizá-la.
Os fios cabelo cor-de-rosa voavam enquanto ele corria na direção da arena improvisada.
Logo, ele enxergou uma coelha encarando duas panteras negras em posição de ataque.
Parando de supetão, Rune penteou os cabelos, que tinham ficado desarrumados. Os cachos que ele penteou voltaram a subir, desafiando a gravidade.
Rune estava até mesmo usando um broche decorado, algo com o que nunca tinha se importado antes. Ele esfregou as orelhas vermelhas.
“Por que você teria medo de uma coelha, quando é um leão?”
Por um momento, a brincadeira de sua irmã ressoou nos ouvidos dele.
“Se não consegue conquistá-la, por que não volta à sua forma original e faz uma dança de acasalamento para ela?”
‘Dança de acasalamento…’
Rune coçou a nuca, imaginando-se dançando em sua forma original. Se qualquer um pudesse ler sua mente, diria que ele estava completamente louco, e ele não iria poder refutar.
Distraído, olhando para Vivi, ele não percebeu Ezran e Lillian, que estavam do outro lado da arena.
‘Enlouqueci de vez…’
Rune tentou acalmar a respiração e caminhou na direção dela. Essa poderia ser a última vez… Ao pensar isso, seu coração disparou como um tambor.
Quando Meimi, que o enxergou primeiro, tentou cumprimentá-lo, ele levou o dedo à boca para silenciá-la.
Os olhos dourados se focaram nas mãos da Meimi, que remexia no bolso do avental. Ele sabia que ela era uma criada bem preparada e que sempre levava adagas consigo. Logo, Rune se aproximou mais e falou.
“Vivi.”
“O que é?”
A voz de Vivi era assim tão grossa?
“Como você está?”
“Estarei bem depois que você morrer.”
O tom de voz de Vivi, que era fino e expressivo, estava particularmente agressivo hoje. Suspirando, Rune girou e olhou irritadamente para o dono da voz, a pessoa atrás dele.
“Estava falando com Vivi.”
Ahin, tendo chegado há poucos segundos, o encarou.
“Então escolheu este lugar para ser seu túmulo.”
Os dois homens, Vivi, Ash e Barra ficaram em silêncio. Vivi passou o olhar de Ahin para Rune, chocada.
<Por que Rune está aqui…?>
Lembrando que logo seria o aniversário de Ahin, ela verificou a situação. A atmosfera estava particularmente gélida hoje. Não importa o quão má fosse a relação desses dois, parecia que iriam puxar as espadas e começar a se matar a qualquer instante.
<…Mas o que houve?>
Vivi, olhando ao redor, confusa, de repente cobriu a boca com as patas. Talvez fosse por causa dela mesma…!
Os dois pareciam ter algum tipo de rixa envolvendo ela. Olhando para si mesma, na forma de uma coelha bebê suja de poeira, ela coçou a bochecha, envergonhada.
Percebendo seu movimento, Ahin apontou para Vivi com a cenoura que ele ainda segurava.
“Vivi, você está lançando olhares lascivos para esse leão.”
<Que absurdo ele está falando agora?>
Vivi saltou, negando com a cabeça e erguendo as patas dianteiras para os dois. Rune a olhou e suas bochechas ficaram vermelhas instantaneamente.
“Rune Manionz. Parece ter esquecido de onde você está.”
Como ele ousava não lembrar do fato de que estava no meio do território de seu inimigo? Ahin, encarando Rune, que ainda estava distraído pela coelha, jogou a cenoura que estava em sua mão da cabeça do rival.
A cenoura voou no ar e foi apanhada por Ash, que saltou e a abocanhou. No entanto, não apreciando o sabor, ela a cuspiu logo em seguida.
<Calma, vocês dois!>
Vivi abriu os braços, sinalizando para os dois pararem de gerar esse clima pesado. No entanto, os dois apenas se olhavam, soltando faíscas, e não prestaram atenção à bola de algodão.
“Eu fui convidado para vir aqui, por acaso há algum problema? E já que vim, decidi cumprimentar Vivi.”
“Não fale o nome dela.”
Ansiosa, Vivi olhou para os dois.
<Parem com isso!!>
Se eles iam brigar, que não a envolvessem, ao menos. Vivi não conseguiu atrair a atenção de Ahin ou de Rune, que tinha um olhar amargurado.
“…Lorde Grace, está sendo muito possessivo. Tem um limite até onde isso é aceitável, levando em conta a sua posição.”
Rune claramente não podia esquecer que aquele homem o tinha abandonado, quando estava preso na forma de leão, junto a um bando de assassinos. Não importa o quanto ele tentasse reprimi-los, seus instintos de predador estavam aflorando.
<Olhem para mim!!>
Vivi continuou tentando desesperadamente chamar a atenção. Rune estava com um olhar frio, como ela nunca tinha visto antes, e Ahin sorria com desdém. A essa altura, ia começar uma briga de bestas selvagens bem na frente da coelha.
“Isso não é da sua conta.”
Ahin, já colocando a mão da espada em sua cintura, respondeu friamente.
<Esses dois animais!>
Infelizmente, Vivi, que era minúscula, estava fora do campo de visão dos dois. Depois de correr em círculos, ela puxou a barra da calça de Ahin. Então, fez o mesmo com Rune. Só então eles olharam para baixo.
“Vivi?”
“Vivi?”
Ahin e Rune, após falarem em uníssono, olharam um para o outro, com carrancas.
Vivi, temendo que a guerra entre os predadores exaltados fosse continuar, estava irritada. Não era suficiente eles estarem atrapalhando sua prática de feromônios, mas, ainda por cima a ignoravam? Se fossem fazer isso, que não brigassem por ela, para começar.
Vivi começou a correr na direção da mansão, determinada em ir embora dali e praticar mais sozinha.
“Para onde vai?”
“Para onde está indo?”
Ahin e Rune, mais uma vez em perfeita sincronia, a acompanharam.
<Não me sigam!>
Parando de correr, Vivi traçou uma linha no chão com a pata dianteira.
“Espera!”
“Espera um minuto!”
Quando os dois a chamaram, ela deu as costas para eles e pegou impulso. Logo, Vivi estava correndo a toda velocidade.
‘Por que ela está tão brava…?’
Os dois ficaram olhando sem expressão para a bolinha branca que ia sumindo no horizonte.
Ash, Barra e Meimi os encararam, sentindo pena. Vivi estava muito sensível a respeito de suas práticas de feromônios, e esses dois tinham aparecido para atrapalhá-la.
Logo, eles também foram embora, deixando Ahin e Rune, parados como dois postes, olhando a direção na qual Vivi tinha desaparecido.
Enquanto isso, Ezran, que tinha assistido tudo, sacudiu a manga da túnica de Lillian.
“O que eu acabo de ver… Ahin e Rune estavam discutindo e tinha uma coelha bebê no meio dos dois…? O que foi isso?”
“…Era uma coelha bebê.”
Lillian, respondendo atrasado, deu um tapa na mão de Ezran, para que este largasse suas roupas.
Ele estava envergonhado também, mas por outras razões. Ele nunca tinha pensado que Rune viria aqui, perseguindo a coelha.
Sentindo que uma crise se aproximava, Lillian começou a andar, se afastando. Ezran gritou, frustrado.
“Eu sei que era uma coelha bebê! Por acaso esses dois estavam brigando pela coelha? Estão discutindo por essa razão?! Ficaram loucos?!”
Os olhos dele tremiam, como se ele estivesse prestes a desmaiar. Lillian, enxergando o seu eu do passado nessa reação, ficou com as orelhas vermelhas.
Ele estava envergonhado de como sua mente era pequena naquela época.
***
Depois de receber o Ferenium do artesão, Evelyn começou a entrar no escritório de Ahin, parando de supetão.
Seu mestre parecia estar trabalhando diligentemente, mas logo Evelyn notou que uma tensão enorme pairava sobre o ambiente. Ele olhou para os três assistentes que estavam de costas para a parede, no lado esquerdo do escritório.
Os três, sem emitir um único som, escreveram o motivo em um pedaço de papel e o seguraram de modo que Evelyn pudesse ler.
Para resumir, eles tinham que manter um certo leão fora da vista do Lorde. A presença dele parecia tê-lo deixado de péssimo humor, e, para piorar, quando ele confrontou o leão, ainda obteve o ódio de Vivi.
Evelyn encarou Ahin, que trabalhava com movimentos ininterruptos. Que tipo de planos cruéis ele estaria bolando por trás daquele olhar tranquilo?
Considerando se estava ou não na hora de escrever uma carta de demissão, Evelyn se aproximou de Ahin.
“O Ferenium está pronto, meu lorde. O número total de usos é 3, assim como na vez anterior.”
O relógio de bolso foi desembrulhado. O futuro presente de Ahin para Vivi.
“Demorou bastante.”
Clang. A corrente do relógio balançou em sua mão.
Ahin, encarando o relógio indo de um lado para o outro como se fosse um pêndulo, ficou perdido em seus pensamentos.
Lillian era um excelente professor. Usando seu processo sistemático de ensino, Vivi estava controlando seus feromônios cada vez mais facilmente esses dias.
A paixão dela pelo aprendizado era tão grande que, quando ele acordava antes dela, a via praticando nos seus sonhos, batendo no travesseiro.
E Ahin tinha a desconfiança de que a razão de todo esse entusiasmo por obter controle o quanto antes era ele.
Depois de que ela havia conversado com Valence, devia estar preocupada com o que poderia fazer no caso de ele ter mais um ataque de feromônios. Ele gostava dessa dedicação secreta.
Se enterrando mais fundo na cadeira, ele segurou o relógio, que tinha parado de balançar, em sua mão. Em breve, o Ferenium, e até mesmo o feromônio de dominação poderia não mais ser necessário para Vivi.
Daqui que ela utilizasse o relógio três vezes, talvez tivesse alcançado o controle completo dos feromônios de cura.
“Por que está sendo tão cruel com a Senhorita Coelha esses dias?”
Evelyn, parado na frente de Ahin, que encarava o relógio, perguntou.
“Com todo o respeito, pedirei ao Lorde que devolva as joias que roubou do esconderijo secreto da Senhorita Coelha.”
“É Vivi quem está sendo cruel comigo. Não poderá me ver por muito tempo enquanto eu estiver no território dos ursos.”
“E porque não a leva junto dessa vez? Eu me voluntario para carregar a Senhorita Coelha em meu bolso, e garantir sua segurança em seu lugar, Lorde Ahin.”
“Evelyn, olha a boca.”
“…Devo mesmo me calar?”
Os 3 ajudantes, chocados porque Evelyn tinha respondido algo diferente de “sim, senhor”, ficaram boquiabertos. Ahin o olhou com dureza, e Evelyn devolveu o olhar.
Quando os ajudantes estavam prestes a sair correndo e se jogar pela janela, Evelyn deu de ombros.
“É brincadeira.”
“Você está mais corajoso esses dias.”
“É tudo graças ao meu Lorde, que expôs seus medos primeiro.”
“Pode parar de falar agora.”
Toc toc.
A conversa entre os dois foi interrompida por uma batida na janela.
Quinn, que tinha ficado com ordens de observar Vivi, estava bicando a janela do escritório pelo lado de fora.
Quando Evelyn a abriu, ele voou para dentro e pousou na mesa de Ahin. Com um olhar tenebroso, Ahin falou.
“Rune Manionz se aproximou dela?”
Quin, negando com a cabeça, começou a indicar o espaço debaixo de seu bico com uma asa.
“Está usando as asas para se expressar outra vez… Tem planos de desistir de ser um homem-besta e ficar como águia para sempre?”
Ahin estava prestes a desistir de compreender quando interpretou a mímica. Era a longa barba de Lillian.
“Ela está tomando chá com os dois velhos?”
Quinn assentiu. Ahin, se lembrando de ambos Ezran e Lillian observando Vivi na arena, sacudiu a cabeça.
“Fique de olho neles.”
Como Ezran era um convidado, provavelmente não diria nada ofensivo. Além disso, Lillian, que parecia ser o mais novo fã de Vivi, estava ali também.
Ahin, pensando em voltar ao trabalho, de repente ergueu as sobrancelhas. Foi porque uma ideia assustadora surgiu em sua mente.
“Quinn, espere um minuto. E Evelyn.”
Quinn e Evelyn inclinaram as cabeças para ficarem mais próximos, sem entender, e Ahin sussurrou, de modo que os assistentes não pudessem escutar a conversa.
“Por acaso meu avô sabe que Vivi se humaniza quando absorve os feromônios dos outros?”
Para ser exato, precisavam ser feromônios poderosos. Quinn e Evelyn, que sabiam da informação graças a Ahin, piscaram vagamente.
Eles tentaram se lembrar, mas não havia nenhuma recordação de que isso jamais tinha sido informado a Lillian.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.