A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 97
Ela não era a líder de um território por nada.
A pressão do ambiente me deixou tão atordoada que esqueci de respirar.
Quando a Senhora Valence retirou o olhar de mim, apontou para a porta e falou.
“Todos, podem se retirar. Podem pensar nisso como um descanso. Cavaleiros, fiquem do lado de fora.”
Valence enviou todos os criados, incluindo Meimi, para fora. Quando Ash e Barra saíram, o escritório ficou em total silêncio.
Esticando a mão, ela desamarrou a fita da minha capa com cuidado. Engolindo em seco, fiquei paralisada.
<….Por quê?>
Com a capa preta removida, Valence começou a mexer em uma gaveta, retirando um tecido que parecia caro.
Ela o passou por cima da minha cabeça. Tudo que se ouvia no total silêncio era o som do tecido contra meu pelo.
“Hmm, está meio frouxo.”
Logo, a Senhora Valence passou um elástico de borracha por minha cintura, secando o suor da testa como se tivesse terminado um trabalho bem feito.
<O que ela fez?>
De pé das patas traseiras, olhei para mim mesma. Estava usando uma saia de coelho, com design semelhante a um tutu que bailarinas usariam.
<Mas o que é isso?>
Preocupada com o significado, encarei a Senhora Valence. Ela ergueu a xícara de chá, sorrindo como se tivesse terminado todas suas obrigações e estivesse em paz.
“Ahin falou que você dançou para o leão. Eu também quero ver. Com essa roupa, você já está preparada.”
“Se quiser algo, precisa pagar o preço.”
Respirei fundo para não ficar brava com a Senhora Valence. Mexendo os bigodes, toquei o braço dela com a pata dianteira, após me aproximar. Era um sinal de resignação.
O dedo indicador dela se moveu em um ritmo lento. Após dar uma pirueta seguindo o ritmo, mexi as patas traseiras rapidamente.
“É como disse aquele jornal de fofocas…. excelente.”
Seja como tenha sido minha dança, a Senhora Valence estava sorrindo.
<Que bom…?>
Pensei que se isso era o bastante para fazê-la sorrir, tinha que tentar mais. Me esforcei para fazer um giro triplo. Ela aplaudiu enquanto eu continuava a dançar.
Então, fiz a minha melhor pose final, respirando pesadamente.
“Que maravilha! Seria perfeito para uma apresentação no banquete de aniversário!”
Minha única plateia deu um feedback positivo. Tendo ganhado ambas uma vergonha enorme e um favor da Senhora Valence, me sentei na mesa. Pensei que se tivesse desmaiado, teria sido menos embaraçoso.
“Obrigada. Graças a você, pude sorrir depois de muito tempo.”
Com um sorriso radiante, ela alisou meus pelos, que tinham ficado desarrumados com a dança. Fazia cócegas.
“Agora, vou te dar o que quer como pagamento pela apresentação. Sei que quer saber mais sobre Edith e os ataques de feromônios.”
A Senhora Valence, que estava alisando meu pelo por muito tempo, falou.
“Ahin me contou recentemente, mas seus ataques de feromônios já acontecem há um tempo. Creio que ele não sabia como dizer, por isso escondeu.”
Olhei para ela com cautela enquanto esfregava minha bochecha. Os lábios de Valence se curvaram, mas seus olhos não estavam sorrindo.
“Eu imaginei que isso aconteceria um dia. É um feromônio poderoso demais, mesmo para alguém com sangue Grace. Que habilidades você acha que os feromônios de dominação possuem?”
Refleti sobre o passado, com a pata sob o queixo. Os feromônios de Ahin eram capazes de rivalizar com os feromônios de cura em potência, e eram úteis em combate. Além disso, eu podia sentir que nunca tinha visto Ahin usá-los em sua capacidade máxima.
“Os limites são desconhecidos. Eu creio que, se levados ao nível extremo, seria possível inclusive controlar a mente das pessoas.”
Não podia acreditar. Boquiaberta, a escutei enquanto ela seguia.
“Edith, meu marido, nunca usava seus feromônios de dominação conscientemente. Mas mesmo assim, era muito difícil controlar a quantidade de poder por si só. No entanto, Ahin tem usado os seus feromônios desde pequeno, já que é o próximo líder dos Grace.”
Parando por um momento, Valence olhou pela janela.
“Eu disse a ele que os usasse o mínimo de vezes possível, mas era inevitável que o próximo líder precisasse usá-los com frequência. Talvez, por isso, seus ataques começaram antes dos de Edith.”
Apesar do tom de voz gentil, senti que ela estava melancólica.
“Os ataques de Edith não pararam, nem mesmo tomando remédios estabilizadores de feromônios. Por isso, ele passou a se esconder em algum lugar da mansão toda vez que tinha um ataque. Eu o dizia para ficar no quarto, mas ele era muito teimoso.”
Me levantei, pegando o lenço que a Senhora Valence tinha preparado para que eu sentasse, o entregando a ela. Só para se fosse necessário.
“Obrigada.”
Ela o pegou, acariciando meu pelo.
“Por isso, parei de vê-lo durante os ataques. No dia em que ele faleceu, Ahin saiu procurando pelo pai. Ele pensava naquilo como uma brincadeira de esconde-esconde.”
<….>
“Por que está chorando?”
A Senhora Valence falou, parecendo achar curioso que era eu quem chorava. Engoli com força e esfreguei os olhos com as patas dianteiras. Rindo, ela secou meus olhos com o lenço.
“Desse dia em diante, sinto que Ahin ficou determinado em conseguir um certo objetivo. Tenho certeza que você descobrirá, no futuro. Você é uma garota esperta, então ele não conseguirá esconder, mesmo que tente.”
A Senhora Valence se esticou e deitou a parte superior do corpo sobre a mesa, com a cabeça sobre os braços. Foi a primeira vez desde que a conheci que a vi quebrar o decoro.
“Quando Ahin completou 15 anos, no dia de sua primeira cerimônia de maioridade, ele sugeriu que eu me casasse outra vez. Falou que eu ainda tinha idade para dar à luz a um novo herdeiro.”
Percebi que ele tinha dito isso por cogitar a possibilidade de morrer.
“Nós brigamos pela primeira vez naquele dia. Mas depois descobri que era porque ele tinha tido seu primeiro ataque de feromônios.”
Me aproximei do rosto dela e o toquei com a pata dianteira. Estava um pouco úmido.
“Ele nasceu com um corpo mais forte do que Edith, então pensei que seus ataques começariam mais tarde… Ou talvez, isso era apenas o que eu queria acreditar.”
<Não chore…>
Eu não podia fazer nada, então sequei os olhos dela com a pata outra vez.
“Seu pelo vai ficar encharcado.”
Mesmo com lágrimas nos olhos, a Senhora Valence tocou minhas patas molhadas. Sua voz suave estranhamente me deu vontade de chorar outra vez.
“Na verdade, Ahin não estava errado. Como líder do clã das panteras negras, não posso pôr em risco a sucessão. O correto teria sido arrumar outro sucessor, mesmo que tivesse que adotar o filho de algum parente.”
Ela se ergueu e esfregou o lenço em meu rosto desajeitadamente.
“Mas se eu fizesse isso, sinto que… Já perdi Edith para sempre. E perder Ahin, também…. Não poderia suportar isso. Eu os amo mais do que pensei ser possível.”
Ela sacudiu a cabeça. E acrescentou.
“É patético, não é? Apesar de ser a líder do clã, estou tomando decisões guiada por minhas emoções…”
<….>
“Meu sogro contou que você tem feromônios especiais.”
A Senhora Valence, após secar meu pelo, me ergueu com ambas as mãos. Logo, ela suspirou.
“Se você tem poderes curativos, talvez seja possível resolver esse problema. Existe uma teoria de que feromônios de cura podem aliviar ataques. Te dou o que você pedir. Honra, poder, dinheiro, terras…”
A Senhora Valence, após listar mais prêmios, como títulos, mansões e etc, sorriu fracamente. Ela parou de falar depois de um tempo.
Tendo acabado de me humanizar pela primeira vez recentemente, ela pareceu perceber que eu não teria interesse nessas coisas. Então, ela fez um pedido, que não era nem uma ordem nem uma oferta.
“Por favor, nos ajude.”
***
Já era tarde da noite, e todos os secretários tinham ido embora. Valence, assinando um documento, olhou para a coelha bebê apoiada em sua mão esquerda.
Ela tinha chorado até adormecer. O braço de Valence estava dolorido por manter a mesma posição, mas ela não podia movê-lo ou acordaria a coelha, que parecia pensar que sua mão era uma cama muito confortável.
No fim das contas, ela resolveu manter as coisas assim até que Ahin chegasse, e falou com Ash e Barra, que estavam sentados no chão do escritório, alertas e mantendo distância.
“Podem relaxar e se deitar. Não vou ferir sua mestra.”
Apesar da oferta, os dois não se moveram. Os animais estavam inquietos há horas.
Valence, pensando que não poderia dizer se tal lealdade provinha do feromônio de dominação de Ahin ou do feromônio de cura de Vivi, olhou para a porta.
Logo, Ahin adentrou no escritório, sem bater. Os olhos vermelhos varreram o local, até pousarem na mão esquerda de Valence.
‘Ela passou o dia inteiro com minha mãe depois de me trair com o Yuan?’
Quando Ahin ia começar a falar, Valence levou a caneta que segurava a boca. Era um sinal para que ele se calasse ou acordaria a coelha. Ela sussurrou.
“Ela passou por momentos difíceis por minha causa, então deixe-a descansar. Leve-a com cuidado.”
Abaixando a caneta, ela indicou com a cabeça. Ahin, afastando sua franja prateada da testa, segurou suavemente em suas mãos uma coelha que roncava.
Ele olhou para os dois panteras negras, que continuaram firmes e alertas.
‘Eles são traidores. Não confiam nem no seu antigo mestre?’
Ahin, rindo amargamente, assentiu para Valence.
“Julgando pela reação dela, imagino que você contou tudo.”
“Acho que fui insensível…. fiz ela chorar.”
Ahin a colocou na mão esquerda, olhando a bolinha de algodão e esfregando seu rosto com o dedo indicador. Quando ele coçou seus olhos fechados, Vivi, adormecida, rolou sobre sua mão, parecendo satisfeita.
Valence encarou Ahin, que estava completamente distraído com Vivi. À primeira vista, ele parecia um louco que não hesitaria em eliminar quantos coelhos aparecessem em sua frente.
“Ahin, você parece totalmente cativado pela coelha.”
“Bem, tenho que admitir que estou sob os pés dela.”
“Quer dizer que vai lamber os pés dela, como um escravo?”
“Isso não estaria nada mau.”
Com um sorriso refrescante no rosto, Ahin mexeu nas patas traseiras de Vivi. Pensando que a brincadeira era absurda, Valence suspirou e voltou a olhar para os seus papéis.
“Mãe.”
“Se vai me dizer que tem vontade de lamber os pés da coelha, vou pedir que se retire.”
“Eu quero visitar o território dos ursos depois do banquete de aniversário.”
“…Um lugar tão longe?”
Só então ela tirou os olhos dos documentos e encarou Ahin.
“Quinn trouxe informações sobre um homem de lá que tinha feromônios de dominação. Foi há 300 anos.”
Ouvindo as notícias inesperadas, Valence arregalou os olhos.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.