A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 84
Ahin suspirou, lembrando-se dos documentos estampados com o selo “pé de coelho” guardados na gaveta.
“Mantenha-se informado sobre o que acontece com os Labians. Se houver qualquer sinal de que tentarão contatar Vivi, lide com isso.”
“Sim, meu Lorde. Mudando de assunto, sobre a execução de Barra…”
“Dessa vez não posso evitá-la. Ele passou dos limites.”
“Não é isso… Talvez a ajuda do Lorde seja necessária…”
Ahin piscou, sem entender o que isso queria dizer.
“Por favor, veja por si mesmo.”
Evelyn, hesitando, guiou Ahin até a janela, onde, através da névoa, era possível ver o gramado da mansão. Quando Ahin se aproximou, pode enxergar Barra e Vivi, frente a frente. Um vento gelado soprava sobre os dois animais, que pareciam tensos. Atrás deles, Meimi estava com uma adaga pronta para atirar a qualquer momento, e Ash, em posição de alerta, parecia preocupada. Além disso, vários cavaleiros assistiam, formando um círculo ao redor.
“O que está acontecendo?”
Ahin, olhando pela janela, perguntou.
“É um duelo entre a Senhorita Coelha e Barra.”
“De quem foi essa ideia?”
“A Senhorita Coelha que pediu isso.”
“Não é possível…”
Era inimaginável que Vivi, a coelha mais covarde do mundo, fosse querer enfrentar uma pantera negra por conta própria. Parecia que ela tinha escutado que Barra só obedecia aqueles que julgava serem mais fortes que ele. Então, ela devia ter planejado usar seus feromônios para derrotá-lo. Mas, com tanta gente assistindo, estaria tudo bem?
“Ela deve usar os feromônios para fazê-lo dormir.”
O que Ahin deveria fazer? Puxando a franja para trás, ele olhou para Quinn, que voou para fora, circulando a cena. Com um comando, ele estaria pronto para mergulhar e agarrar Vivi, trazendo-a para longe. Apesar de normalmente não hesitar, Ahin olhou para a pequena coelha, que estava de pé com firmeza. A mesma Vivi que normalmente tremia de medo só de sentir a presença de um predador.
“Será que ela vai ficar com raiva se eu for lá e impedir tudo?”
“Ela iria odiar isso, meu Lorde.”
Com um suspiro, Ahin se encostou na moldura da janela. Apenas uma pantera negra não era um problema para alguém que tinha conseguido nocautear ambos Evelyn e Quinn.
“Quando disse que minha ajuda podia ser necessária, estava falando de usar meus feromônios em Barra.”
“Sim. Não creio que a Senhorita Coelha vá perder, mas, para garantir… E os empregados da mansão já a consideram como um ser poderoso, então está bem que descubram sobre os feromônios dela.”
“É verdade. Escuto toda hora eles a chamarem, como era mesmo? ‘Senhorita Coelha, a nossa’…?”
“Nossa general?”
“Isso.”
Enquanto eles conversavam, a batalha começou.
No início, foi silenciosa. Barra e Vivi ficaram distantes, apenas se encarando. Quando um vento frio soprou do nada, Vivi estremeceu. Essa guerra de nervos era exaustiva. Os cavaleiros que assistiam engoliram em seco.
<Eu devia estar louca…>
Enquanto isso, Vivi estava se arrependendo de sua decisão. Barra não apenas era grande, mas também tinha muitos músculos e garras afiadas. De acordo com a “lei” do grupo de panteras da floresta, só se devia obedecer a quem tivesse te derrotado. Apesar de Vivi já ter nocauteado Barra uma vez na floresta fronteiriça, ele tinha acreditado que o disparo de feromônios tinha sido dado por Rune, que estava ao lado dela naquele momento.
<Não acredito que estou fazendo isso só para salvar essa besta…>
No entanto, Vivi não podia voltar atrás. Se ao menos Ash não tivesse chorado ao ver Barra ser arrastado para sua execução. Se ao menos Barra não tivesse docemente lambido as lágrimas dela… Vivi cerrou os punhos. Esse cabeça de vento. Bastava derrubá-lo e ele viraria seu seguidor. Então vão deixá-lo viver.
<Dessa vez vou te deixar provar o sabor dos punhos de Vivi. Vamos ver como você…>
Voosh.
<Ah!>
Barra voou na direção de Vivi, com a boca bem aberta. Depois de rolar no chão, ela escorregou por entre as pernas de Barra e se posicionou atrás dele. Assistindo tudo, nervosamente, Ahin focou feromônios nas pontas dos dedos e assistiu, atento. Se Vivi se ferisse, ele mataria Barra no mesmo momento.
Esquerda. Direita. A medida que o olhar dele seguia a batalha, ele ouviu o som de uma caneta correndo sob um papel.
“Evelyn, o que está escrevendo?”
Vivi se moveu rapidamente, evitando mais um ataque. Outra vez, ela se colocou nas costas do inimigo, impedindo-o de vê-la. Evelyn estava escrevendo tudo, sem perder um movimento.
“Estou registrando tudo para a posteridade, meu Lorde. Uma pena que não possa ver mais de perto. Mas não se preocupe. Como alguém que já foi atingido pelos feromônios da Senhorita Coelha, eu sei que ela tem grandes habilidades.”
Enquanto Barra procurava a coelha, que tinha desaparecido, Vivi se abrigava no ponto cego do lado direito de seu rosto. Vivi então saltou e chutou Barra na cara. Surpreendido pela força inesperada, ele cambaleou para trás.
“Enquanto os panteras negros se aproveitam apenas de força bruta, a Senhorita Coelha luta usando a inteligência e a cabeça fria.”
Vivi, pousando no chão, ficou de pé nas patas traseiras e reuniu feromônios nas patas dianteiras. A guarda de Barra estava aberta. Deitado no chão, ele se sentia encurralado.
Tadak!
Barra saltou diretamente sobre Vivi. Sem conseguir se segurar, Ahin estirou a mão para atingi-lo com seus feromônios. Mas, no mesmo instante…
Paf!
Vivi havia erguido as patas dianteiras heroicamente. O corpo de Barra parou no ar, no meio do salto, e um momento de silêncio seguiu. Logo, um pantera negro adormecido desabou no chão.
De pé nas patas traseiras, Vivi respirava pesadamente. Ela estava preparada para o caso de ele voltar a se mexer. Mas, um minuto depois, ele não mostrou nenhum sinal. Em vez disso, um ronco profundo pôde ser ouvido.
<Barra?>
Se aproximando com cuidado, Vivi tocou o corpo de Barra com a pata dianteira. Ele estava dormindo tão profundamente que havia uma bolha se formando de seu nariz.
<Eu ganhei…!>
Vivi, quase chorando de emoção, cobriu a boca com as patas. Ela tinha nocauteado uma pantera negra sem a ajuda de ninguém. A vitória a tinha emocionado, e ela escalou o corpo de Barra.
<Meimi!>
De pé sobre a besta negra caída que ela tinha abatido com sucesso, Vivi ergueu as patas para Meimi e Ash.
“Senhorita Coelha…!”
Tenho assistindo toda a batalha com a respiração presa, Meimi se lembrou do passado. Quando tinha visto Ash pela primeira vez, Vivi tinha se escondido atrás da saia dela, tremendo… Os cavaleiros ao redor, ao verem Vivi triunfante, começaram a aplaudir e gritar.
“Agora o senhor irá poupar a vida de Barra, não é… Lorde Ahin?”
Ainda registrando a emoção coletiva, Evelyn olhou para o lado. Ahin estava muito calado.
“O que houve?”
Ahin estava parado, apenas piscando. Ele não tinha tido tempo de usar os próprios feromônios, pois ela tinha sido mais rápida e eficiente.
“Eu só…”
Ele cobriu a boca com a mão.
“Quero ver mais disso.”
Como Vivi já tinha percebido, ele não era um louco normal.
***
O ambiente estava silencioso. O único som vinha de uma caneta riscando o papel, o que, tarde da noite, me soava reconfortante. Deitada em uma almofada, olhei ao redor do escritório de Ahin. Todos os secretários dele tinham saído, então só estávamos os dois ali. Como tinha passado muito tempo no território das lebres, Ahin tinha montanhas de papelada para resolver. Por isso, ele estava fazendo horas-extras, e tinha me levado para a sua mesa em uma almofada, dizendo que se sentia solitário. Mas não era tão ruim assim. Eu estava preocupada que Ahin pudesse ter um ataque de feromônios enquanto estivesse sozinho, o que me fazia ficar rodando na cama sem dormir esses dias, quando ele chegava tarde.
A atitude de Barra, depois de ter despertado, não mudou da noite pro dia. No entanto, ele pareceu ter reconhecido meu ranking. Quando alguém se aproximava de mim sem permissão, ele se colocava na frente, e quando eu ia para qualquer lugar, ele naturalmente ia atrás. Quando Ash demonstrava amor por mim, ele apenas olhava com uma cara de quem não sabia o que fazer. Os atos de antes, de me chicotear com a cauda ou me fazer tropeçar tinham desaparecido. Ele parecia estar mudando, aos poucos.
Ahin, que aparentemente tinha escutado sobre o duelo, tinha autorizado o cancelamento da execução de Barra. Ele tinha dito que não interferiria mais em absoluto, e que Barra estava completamente sob o meu controle. Mas estava com um sorriso meio sombrio nesse momento, o que me deixou desconfortável. Ainda assim, rolei na almofada, deitando de lado, satisfeita com minha performance. Então, vi o rosto de Ahin, com os olhos fixados no documento.
‘Ele só fica lendo, nem me percebeu…’
Rolei de um lado para o outro, focada em Ahin. Não estava conseguindo olhar direito para o rosto dele ultimamente.
‘O que ele quis dizer com “a pessoa com a qual eu me importo” naquela hora?’
Será que era o que eu estava pensando? Quanto mais eu imaginava, menos conseguia olhá-lo nos olhos. Estava tão envergonhada que tinha medo que meu pelo ficasse vermelho. Rolando e rolando, vi seu perfil. Os cabelos prateados estavam ligeiramente desarrumados. Os cílios longos criavam uma sombra sobre seu rosto, enquanto encarava os documentos. Como alguém podia ser tão bonito? Corri o olhar pelo nariz dele, e parei nos lábios vermelhos. Meu rosto estava queimando outra vez. Secretamente esfreguei o meu nariz, mas felizmente não estava sangrando.
Meu olhar mudou para a mão segurando a caneta. Na verdade, as mãos de Ahin eram as melhores. A parte de trás era suave e tinha veias que saltavam, e a palma era grossa e com calos. Nosso relacionamento tinha começado com aquelas mãos. Ao olhar a palma que tinha sido oferecida para mim naquele dia, me senti comovida. Então, a mão que eu encarava, vidrada, começou a se aproximar cada vez mais. O dedo indicador de Ahin passou por minha bochecha.
“Não estava dormindo?”
Ia começar a negar com a cabeça, mas tive uma ideia e me levantei. De pé, fiz um X com as patas dianteiras. Ahin me cutucou com a caneta.
“Pode dormir.”
Ele tinha interpretado como um “não”, mas na verdade o que eu tinha formado com as patas era um coração. Está bem que ele não perceba, desde que eu saiba. Envergonhada, cobri a boca com as patas e fiquei com vontade de me enfiar em um buraco. No entanto, sabendo que, com meu tamanho atual, isso era bastante possível, me senti um pouco conflitada.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.