A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 80
Aven era uma pessoa muito cautelosa. Apesar de Ahin ter intencionalmente anunciado seu “relacionamento” com Vivi, ele nunca tinha ouvido o nome Labian até os últimos seis meses. A única maneira dela derrotar esse homem era aproveitar enquanto ele não estivesse e atacar a carruagem para trazer Vivi, sem o obstáculo chamado Ahin. Não surpreendentemente, assim que ela obteve a informação, começou a se movimentar. Em menos de um dia, havia mandado dinheiro ao grêmio e contratado mercenários para entrarem na floresta da fronteira e trazerem Vivi até a carruagem dela.
A floresta fronteiriça era um lugar deserto, e por isso era o melhor local para pôr em efeito seu plano. Tirando os portões da fronteira, sequer havia guardas por ali. Então, ela tomou a iniciativa, incluindo colocar um espião para lhe informar os movimentos de Ahin em tempo real.
“Ugh… poupe minha vida…”
O espião, capturado por Ahin, enviou informações falsas, dizendo que ele ainda estava dentro da mansão. Assim, Aven entrou na carruagem e seguiu para a floresta. Normalmente, ela teria checado a informação, mas, naquele momento, não tinha tempo para isso. Enquanto isso, Ahin, tendo confirmado que ela havia saído, subiu em seu cavalo e foi atrás da carruagem de Vivi. Ele imaginou que os 3 cavaleiros, junto com Quinn e Evelyn, seriam o suficiente para deter os homens de Aven, mas, impulsivamente, decidiu ir também.
Assim que ele alcançou a carruagem, o ataque começou. Ele pensou que lá dentro estava tudo muito silencioso, e enquanto usava seus feromônios para derrubar os homens, grudou o ouvido na janela, escutando as vozes de Vivi e Evelyn.
“Mas, se forem homens-besta lobos, como da última vez… Não são perigosos?”
“Pode se esconder aqui dentro dessa cartola. Estará segura, vamos….”
Então, ele escutou um barulho de Vivi ofegando. Era sinal de que ela estava assustada com os sons da batalha. Assim, Ahin concluiu que as chances de ela sair da carruagem eram baixas, mas, para garantir, ele trancou a janela. Então, a possibilidade de feromônios entrarem voando, como da última vez, estava eliminada.
Vivi, às vezes, agia como um general. Por isso, as advertências que ele deu a Evelyn tinham razão de ser. Ahin lidou com os mercenários sem usar sua espada. O fez pela possibilidade de Vivi derrotar ambos Quinn e Evelyn e acabar saltando da carruagem. Ele instruiu os seus cavaleiros.
“Não deixem manchas de sangue, tanto quanto possível.”
“Como assim, não podemos fazê-los sangrar…?”
Os cavaleiros ficaram com os olhos tremendo, como se tivessem ouvido algo impossível.
“Não conseguem?”
“…Sim, meu Lorde.”
Dessa forma, eles tiveram a experiência inédita de derrotar vários homens sem derramar uma única gota de sangue durante a batalha. Perdido nessas lembranças, Ahin lambeu os lábios, desconfortável. Ele percebeu que tinha ido atrás de Aven apressado e deixado os mercenários do clã das lebres ainda vivos, apenas desacordados. Enquanto ele estava imerso nesses pensamentos, Aven o olhou, irritada, e falou.
“O que está fazendo?”
Assustado, o coelho que estava sentado no sapato de Ahin saiu correndo. Se sentindo desapontado, Ahin verificou a hora em seu relógio. A ansiedade dele diminuiu ao concluir que, a essa altura, a carruagem já devia ter seguido adiante e Vivi estaria segura, no território das panteras negras.
“Vamos acabar com isso rápido. Estou muito ocupado.”
***
Os homens-besta lebres. Minha mãe. Incêndio. Ahin. Várias palavras giravam em minha cabeça. Andando por entre os arbustos, seguindo as pegadas de Ahin, tentei me concentrar.
“Ash, não vá atrás deles.”
Um grupo de coelhos brancos podia ser visto a uma curta distância, em cima das raízes de uma árvore. O instinto de caça de Ash não tinha desaparecido. Ela não me atacava porque Ahin tinha lhe ordenado que me tratasse como sua mestra, mas não seria estranho se ela caçasse esses coelhos selvagens agora. Mas eu não queria ver isso. No momento, me dava muito bem com ela, mas tinha receio de voltar a ter medo de Ash.
“Ash, sentido!”
Quando ela parou de olhar os coelhos e ergueu a pata até a cabeça, a afaguei enquanto pisava forte no chão, para assustá-los e fazer com que fugissem. Eles se afastaram um pouco, mas não foram longe.
‘O que tem de errado com eles?’
Achando estranho, me aproximei e logo vi algo que me fez parar. Um deles estava preso nas raízes da árvore, com a pata perfurada por um pedaço de madeira afiado.
‘Como isso aconteceu …?’
A pata branquinha tinha sido atravessada pelo galho e estava encharcada de sangue, que ainda jorrava. O coelho nem sequer era um adulto, então a cena toda parecia ainda mais brutal. Parece que ele não tinha conseguido fugir mesmo após ver Ash, e os outros não queriam deixá-lo para trás. Devia estar com muita dor… Ele grunhiu pesadamente. Pensei em rasgar um pedaço de minha roupa, mas parei. Precisaria puxar o galho para fora, mas então, ele iria sangrar excessivamente…
“Ugh…”
Ele iria morrer se eu o deixasse assim. E mesmo que sobrevivesse, não conseguiria mais correr e seria devorado rapidamente. Não queria isso. Apertei o Ferenium, amarrado em meu pulso. Balançando, o relógio de bolso cintilou. Só tinha mais um uso agora… E se eu curasse o animal e acabasse, logo em seguida, voltando à forma de coelho? Então, estaria sozinha na floresta, sem nenhuma garantia de que encontraria logo Ahin. Mas eu ainda tinha um uso, o que quer dizer que seria o suficiente… verdade?
“O que eu devo fazer?”
Girei a cabeça para os outros coelhos, que estavam escondidos atrás do tronco, me olhando. Talvez fossem os familiares e amigos do bebê ferido. Eles não tinham o deixado para trás, mesmo sabendo que Ash estava por perto. Olhei para o coelho, que estava chorando. E se eu o levasse comigo, ainda que ferido, encontrasse Ahin, e, após explicar tudo a ele, curasse o bebê e depois…
‘E depois….’
Eu sabia que era impossível. Podia sentir a vida se esvaindo dos olhos do coelho. Não havia tempo para que eu encontrasse Ahin. Era a lei da natureza. Mesmo que ele tivesse nascido como um predador, ao ser ferido, seria abandonado. Igual a como eu fui abandonada por minha família por não ter me humanizado. Deixei de lado as desculpas e decisões e sentei no chão.
“Ei, coelhinho. Está com dor? Sua família está te esperando. Aguente só mais um minutinho.”
Por que o filhote tinha que ser branco? Ele era igualzinho a mim… me preparei e puxei o galho que atravessava o seu pé, de uma só vez.
“Khiiiiiiii!”
Assim que puxei, o coelho gritou como se eu tivesse arrancado sua perna. Me apressei e agarrei o Ferenium, enquanto reunia meus feromônios. Rapidamente, pude ver a ferida se fechando por baixo de meus dedos. Era algo fascinante, mesmo depois de eu ter visto várias vezes. Limpei o suor da testa, confirmando que, embaixo do pêlo ensanguentado, a pele estava intacta. E eu ainda estava na forma humana, então a aposta tinha valido a pena.
“Que bom…”
Sem entender minhas emoções conflitadas, o coelho moveu a perna com uma expressão confusa.
“Você não está mais doente, não é? Foi por causa da habilidade desta Vivi aqui.”
O coelho, incapaz de me compreender, pulou, testando a perna. Logo, os coelhos escondidos no tronco começaram a se aproximar, um por um. Parecia uma manada de bolas de algodão, o que me fez rir. Enquanto os olhava, encantada, de repente me levantei. Não tinha tempo a perder, já que o uso do Ferenium estava completamente esgotado.
<Ash, vamos lá.>
Precisava encontrar Ahin. No entanto, enquanto acenava para ela, percebi algo estranho. Eu tinha falado em voz alta, então, porque não tinha saído nenhum som? Logo, vi algo enorme com o canto do olho.
<Eh?>
Quando levantei a vista, só podia ver coelhos por todos os lados. No entanto, eles eram maiores que eu, de modo que suas sombras me cobriram por completo. Coelhos gigantes. Me sentindo ameaçada, balancei as mãos para sinalizar que se afastassem. Mas o que apareceu no meu campo de visão não foram dedos humanos, e sim patas brancas. De pé nas patas traseiras, apalpei meu corpo inteiro.
<Quando voltei a ser coelha…?>
Eu tinha certeza que ainda havia um uso do Ferenium naquele momento… Enquanto pensava na razão, uma sombra maior ainda caiu sobre mim.
<Ash!>
Os coelhos, apavorados, saltaram para todos os lados, entrando em raízes e arbustos. Se Ash os atacasse agora… Frustrada, estirei a pata dianteira para mediar a situação. Ash, me olhando, lambeu minha bochecha gentilmente. Meus pêlos se arrepiaram com a língua áspera, mas assenti, pois ela estava demonstrando a eles que era amigável. Felizmente, parecia que ela não tinha nenhuma intenção de atacar os coelhos.
<Precisamos ir.>
Podia pensar no porquê de ter virado coelha depois de encontrar Ahin. Apontei na direção das pegadas, e na do relógio de bolso. As roupas e a adaga de Quinn, tive que deixar para trás. Ash segurou o relógio com os dentes, e me preparei para montar nas costas dela.
<Parando para pensar, assim irei mais rápido, e devo encontrar Ahin antes do que conseguiria na forma humana… Arrrgh!>
Assim que pensei isso, tropecei em algo e caí. Logo percebi que era o coelho que parecia comigo, cuja pata eu tinha acabado de curar. O coelhinho balançou a cabeça como se dissesse que eu deveria segui-lo. Será que eu estava vendo coisas? Esfreguei os olhos, e comecei a seguir o coelho, porque não tinha nada a perder.
<A primeira vez foi quando eu me humanizei logo após chegar ao território das lebres… a segunda foi hoje…>
Enquanto caminhava e contava os usos do Ferenium, me senti deprimida. Quando quase usei meus feromônios contra o cavaleiro de minha mãe no dia do baile, podia ter ativado ele sem perceber, porque Ahin chegou logo depois. Seria impossível para mim manter minha forma humana sozinha, afinal? Mas, ao menos, não era tão difícil lidar com os feromônios agora como era no começo… Tentando ser otimista de propósito, olhei ao redor. A cena atual, de uma manada de coelhos caminhando ao lado de uma pantera negra, era bem surpreendente. Olhei para Ash, preocupada. Será que os coelhos não estavam estimulando o apetite dela? Ou não se importava? Quando o olhar dela encontrou o meu, sua cauda balançou como um catavento. Eu não sabia se estava realmente tudo bem para mim criar um predador como bicho de estimação, afinal.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.