A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 73
Ahin deve se casar e ter filhos algum dia, já que é o próximo líder do clã. Na verdade, considerando que ele já tinha completado a maioridade faz um tempo, não seria estranho que logo firmasse um noivado. Olhei para o coelho que estava sentado em meu colo. Ele precisava fazer uma dieta, pois estava muito pesado.
‘Quem seria a noiva?’
Provavelmente alguma filha de um nobre importante do território das panteras negras. Ou talvez de algum outro território predador aliado. Não era incomum haver casamentos entre clãs diferentes. No entanto, como no caso da mulher-besta mestiça de lobo e pantera que me atacou na mansão Grace, era desaprovado porque os filhos não tinham a cor de olhos e aparência condizentes com alguém que era puramente de um só clã.
‘Para começar, seria impossível entre nós… Não é?’
Só tinha ouvido falar de pouquíssimos casos de casamentos entre herbívoros e predadores, mas, obviamente, nunca quando se aplicava ao líder do clã. O coelho em meu colo, insensível a minha angústia, começou a mastigar a manga de minha capa.
“Vivi.”
Imaginar uma criança filha de uma coelha com um pantera negra era muito estranho para começar… Era irônico imaginar alguém com olhos violeta claro e caninos ao mesmo tempo…
“Vivi?”
Quando escutei Ahin falar, depois de um tempo, girei a cabeça. Russell estava alimentando os coelhos com feno, e Ahin, que tinha ficado ao meu lado, estava observando o coelho gordo. Então, ele se inclinou para o animal e emitiu um som.
“Hiik?~”
“…Pare de fingir que está se comunicando com o coelho. Ele não é um homem-besta, então nunca vai te compreender.”
Ele deveria estar querendo rir da minha cara. Ao ouvir minha cortada, Ahin piscou, em silêncio. Ele parecia sem palavras. Logo, seus lábios começaram a tremer como se estivesse se segurando para não gargalhar. Enquanto ele cobria a boca, percebi que havia um arranhão em sua bochecha. Era o lugar onde eu tinha o ferido durante a briga de hoje de manhã. Sem perceber, comecei a esticar a mão na direção do corte. Minha mão ficou parada no ar.
“…Está ardendo muito?”
Sem responder, ele ficou olhando a mão parada. Por causa do pôr-do-sol, os olhos vermelhos estavam refletindo um olhar diferente da expressão de anseio que vi na noite anterior. Quando percebi, Ahin me puxou e em um único movimento estava sentada no seu colo. O coelho gordo se surpreendeu e fugiu. Enquanto o olhava, chocada, Ahin se curvou e colocou a bochecha em minha mão.
“Arde muito.”
Senti sua pele macia e ligeiramente fria com a palma de minha mão. Ahin, esfregando sua bochecha como um gato pedindo afago, sorriu.
“Por isso, me cure.”
A essa altura, tinha certeza de que ele estava usando sua aparência como arma para compensar sua personalidade. Minhas mãos começaram a tremer, então coloquei força nelas para estabilizá-las, ao ponto de que as veias saltaram.
“Vivi, sua cara está assustadora. Parece que quer brigar.”
A minha luta era apenas com a mão que não queria parar de tremer. Disfarçando, falei com dificuldade.
“…Eu posso te curar. Mas…”
Acho que Ahin não sabia que se eu usasse meus feromônios voltaria a forma de coelha. Ou talvez soubesse…
“Eu gosto de Vivi porque ela é uma coelha.”
Ele sabia o peso dessas palavras para um coelho bebê como eu, que sempre fui criticada a vida inteira por não me humanizar? No entanto, depois de começar a mudar de forma entre humana e coelha várias vezes, essas palavras que tinham me alegrado passaram a me preocupar. O tempo que passei com Ahin foi tão precioso que cheguei a pensar que não era tão ruim ser uma coelha… mas…
“Eu acho que prefiro que você seja humana.”
E agora, ele dizia isso? Eu odiei o Ahin que ficava brincando com meus sentimentos.
“Posso te curar, mas depois disso, voltarei à forma de coelha. Tudo bem?”
“Não está bem.”
A resposta veio sem nenhuma hesitação. Um coelho pequeno e cinzento se aproximou. Ahin o apanhou e ele olhou para nós com um olhar confuso.
“E você, entendeu a situação?”
Do nada, ele começou a falar com o coelho. Eu pisquei. Será que o coelho estava solitário? Quando estirei o dedo para afagá-lo, ele virou a cabeça para longe.
“Ele não gostou de mim?”
Logo, o coelho se desvencilhou e correu para o chão. Aproveitei a oportunidade para fugir de Ahin, rapidamente. Fiquei abalada ao ser rejeitada por essa bolinha de algodão. Talvez Meimi fosse secretamente uma expert em coelhos. Parecia que não era uma coincidência ela saber quando colocar uma almofada no chão para que eu cochilasse, só de me ver esfregando os olhos. Já eu, apesar de ser um coelho, não entendia como aquele se sentia… Um pouco deprimida, me espreguicei.
“É díficil…”
“Eu também não consigo entender as expressões de um coelho bebê.”
O olhar que Ahn me lançou mostrava que ele compartilhava meus sentimentos.
“Ahin…”
Ahin, sorrindo, respondeu um segundo depois.
“Por isso, prefiro ver sua cara quando é humana, mesmo que faça essas expressões bizarras.”
“Ei!”
“É emocionante quando você me encara assim.”
Não importa como se veja, ele é louco. Dei as costas para Ahin. Não valia a pena responder. O coelho gordo voltou e, quando sentei no chão, ele se sentou novamente em meu colo.
“Ao menos com esse, posso entender como se sente.”
Estava vendo que ainda tinha um pouco de feno na boca. Ele estava de barriga cheia e com sono. Devia querer ser afagado. Fiz isso com cuidado, com o som da voz de Ahin ressoando atrás de mim.
“Sabe, no fim das contas, não importa. Seja coelha ou humana, pode fazer o que você quiser.”
Primeiro diz uma coisa, agora diz outra?! Perdi minhas forças com essas palavras inesperadas. Quando relaxei as costas, elas tocaram em algo. Então percebi que Ahin estava perto demais. O coelho gordo, tendo sido despertado, parecia estar com raiva. Quando levantei o rosto, Ahin estava bem ali.
“Só não fuja novamente.”
Engoli em seco, com as costas coladas nele. Ao contrário do coração de um coelho, pequeno como um feijão, o som do meu coração humano era alto demais.
“Estou ficando sem paciência.”
Sorrindo inocentemente, ele pegou o coelho gordo do chão e o colocou em meus braços.
“…Eu vou fazer o meu melhor para não desaparecer.”
Quando tentei desviar o olhar, uma mão apareceu e girou meu pescoço, me impedindo. Incapaz de lutar, tive que olhá-lo nos olhos.
“Você deveria dizer que definitivamente não vai desaparecer, não que vai se esforçar.”
Ahin, falando em um tom gentil, começou a emanar feromônios. Era claro que sua intenção era apagar o cheiro de Rune, que ele tinha mencionado de manhã. Cercada pelos feromônios de dominação, com cuidado, liberei feromônios de cura. Só um pouco. Não precisei de muitos porque era só um arranhão. Logo, a bochecha de Ahin estava completamente curada.
“…Tudo bem..”
A possessividade persistente dele já tinha se tornado irrelevante. Em primeiro lugar, ficar especulando sobre quem seria a noiva de Ahin era inútil. Com um cara tão egoísta como ele, quem iria aguentar?
“Nada de fugir.”
Enquanto fechava os olhos para escapar da realidade à minha frente, ouvi Ahin falar.
“Não sei como você convenceu Quinn a te levar até a prisão subterrânea.”
Que besta assustadora. Com os olhos tremendo, falei.
“Então você descobriu.”
Ele não parecia saber que Quinn era mais fraco do que parecia e tinha sido fácil derrotá-lo.
“Agora, o fedor de leão se foi.”
Ahin, farejando o ar, murmurou satisfeito.
“Agora, você cheira a batata doce assada.”
Rune tinha dito que era cheiro de manteiga… Cansada, apenas olhei Russell brincando com os coelhos. Batata ou manteiga, de qualquer modo, ambos eram coisas de comer.
***
A reunião era para ter sido inteiramente confidencial, mas os rumores escandalosos andavam mais rápido que cavalos galopando. Graças a isso, o servo pessoal de Ahin, Yuan, estava sendo rodeado por empregados de nobres do território das lebres desde cedo. Ele estava prestes a enlouquecer.
A coelha, a qual ele via todas as manhãs na mansão Grace, de repente era uma dançarina talentosíssima para os empregados da mansão Amon. Aparentemente, a dança dela era capaz de tocar o coração até mesmo da pessoa mais fria, e havia controlado os futuros líderes de ambos os clãs das panteras negras e dos leões, a ponto de que os dois dariam qualquer coisa por ela.
Mas a coelha que Yuan conhecia tropeçava nos próprios pés. E era durona o suficiente para domar a pantera negra Ash. Em vez de dançarina, ela estava mais para general. Ao entrar no quarto de hóspedes de Ahin, o jovem rosto de Yuan se contorceu com os fatos que ele teve que absorver.
Vivi estava deitada no sofá, sem se mover. Ash, que frequentemente a imitava, estava deitada no chão, ao seu lado. Ahin estava sentado no mesmo sofá, do lado oposto, lendo um jornal tranquilamente. Yuan não conseguiu imaginar o que diabos estava acontecendo mesmo que tentasse.
No entanto, sua função era servir o futuro líder do clã, posto pelo qual ele tinha lutado com vários outros servos para obter. Yuan, que tinha talento em controlar suas expressões faciais, levantou a bandeja que carregava.
“Trouxe um chá feito com folhas que só crescem no território das lebres, meu Lorde.”
Ahin, mal olhando por cima do jornal, falou.
“Deixe em cima da mesa.”
Apesar disso, Vivi não se moveu. Ahin, percebendo que os dedos do servo tremiam enquanto ele despejava o chá na xícara, abaixou o jornal e falou.
“Ela está bem, só está se fingindo de morta porque estávamos discutindo. Vivi, se vai continuar com isso, ao menos coloque a capa. Ou fique mais perto da lareira.”
Vivi, mantendo o protesto silencioso, não falou nada, mas moveu a perna de leve, como se tivesse o reflexo de chutar alguém. Yuan, que por um segundo teve uma ilusão de ótica da forma de coelho dela, esfregou os olhos.
“Yuan, vá para a cozinha agora.”
“O senhor quer algo para comer, meu Lorde?”
“Não, fale para eles que aqui tem uma coelha que perdeu a vontade de viver.”
Yuan, sem compreender, encarou Ahin, que continuou.
“Eles podem querer usá-la como ingrediente para o jantar.”
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.