A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 72
Apesar de eu ter muitas perguntas para fazer, no fim, tudo convergia para um único ponto: os feromônios de Ahin. Com eles, era possível reduzir a dor que eu sentia ao me humanizar, e quando usávamos feromônios juntos, eu conseguia controlá-los com mais facilidade. E teve a questão do ataque de feromônios de Ahin na noite passada…
‘Como convenço Evelyn a me contar a informação que eu quero?’
Apesar de ser um fato conhecido que Evelyn era um tagarela, a lealdade dele era forte. Enquanto eu pensava no assunto, uma criança saltou em meus braços. Era Russell, que ainda estava hospedado na mansão com a professora Janna.
“Capturou mais um, Senhorita Coelha.”
Ignorei Evelyn e sentei Russell no meu colo. Duas horas atrás, Ahin, que estava com uns arranhões, chamou os cuidados médicos da professora Janna antes de sair para a reunião. Russell, que tinha a seguido, agarrou a cauda de Ash e insistiu em ficar ali comigo.
“Esse menino…”
A Professora Janna deixou o quarto após pedir que eu olhasse Russell por umas horas. Ele não esqueceu de acenar com a cabeça, mostrando que parecia gostar muito de mim.
“Guerreira, guerreira.”
Russell, no meu colo, olhou para Evelyn e cochichou em meu ouvido.
“Esse pantera negra é muito esquisito.”
“Sou um pantera negra perfeitamente comum.”
A resposta de Evelyn saiu antes que eu conseguisse entender o que o menino tinha cochichado. As orelhas dele também eram muito boas. Colocando minhas mãos em um círculo, sussurrei de volta para Russell.
“Ele é mesmo esquisito. Sentiu energias ruins nele?”
“Não.”
“Então qual é o problema?”
“Não consigo sentir a energia dele. É a primeira vez que isso acontece.”
A professora Janna tinha claramente dito que Russell tem feromônios que lhe permitem sentir a energia de outros homens-besta, desde que estivessem vivos. Parando para pensar, Evelyn era meio macabro, às vezes.
“…Então vocês descobriram.”
Uma voz grave e assustadora saiu do outro lado do quarto. Com calafrios, olhei para Evelyn. O rosto sem nenhuma expressão parecia mais suspeito naquele momento. Russell, assustado, se enterrou em meus braços. Assim que o abracei, ele sussurrou.
“Ele é um fantasma?”
Não seria possível…. Certo? Eu não podia demonstrar medo na frente do garotinho, então sussurrei de volta.
“Se for, eu o derrotarei.”
O ar ficou pesado. Evelyn olhava para o nada, com os olhos desfocados.
“Senhorita Coelha… Atrás de você…”
“O quê?”
“Olhe para trás.”
“Já chega de brincadeiras…!”
Fingi não me importar, mas minha voz rachou. Russell, olhando para trás com curiosidade, tremeu e enfiou a cabeça em meus braços. Ele estava com medo de verdade. Ele murmurou em meu ouvido.
“Preto…”
Era uma explicação urgente, que não parecia ser mentira. Ficando sem fôlego, olhei apenas para Evelyn, como se meu pescoço estivesse incapaz de girar. Os olhos vermelhos dele estavam arregalados, como se estivesse assustado.
Nessa hora, Evelyn falou com a voz mais grave que o normal.
“Você não conseguiu sentir minha energia porque meus feromônios têm uma habilidade especial. Os feromônios mais fracos que os meus não são capazes de atuar em mim.”
Entendi, então é assim que funciona. O poder dos feromônios de Evelyn cancelou a habilidade de Russell. Foi uma colheita inesperada de informações.
***
Ahin se recostou no sofá e olhou pela janela. Vivi, que estava desmaiada na ponta oposta do sofá, tinha o rosto pálido. A pergunta do ano era como ela tinha tido coragem de deixar a mansão Grace e segui-lo até o território das lebres.
“Evelyn, você exagerou.”
“Perdão, meu Lorde. Eu não esperava que ela fosse virar para trás, ver a Senhorita Ash e desmaiar de medo.”
Evelyn, que estava apanhando de uma Ash furiosa, respondeu.
“Você tem um parafuso solto.”
“Não chego aos pés do Lorde Ahin.”
“Deve ter esquecido que está com as mãos e pés amarrados.”
“Sinto muito.”
As reações dela na forma de coelha eram interessantes, mas a Vivi humana tinha expressões faciais que mudavam a cada minuto. Ela não tinha aprendido a controlar sua cara. Ahin queria que Vivi aprendesse a usar uma poker face logo.
‘Me pergunto se tem algo do que você não tenha medo?’
Enquanto beliscava o nariz de Vivi, ele olhou para Evelyn, amarrado, parecendo desconfortável.
“Mas o que aconteceu aqui?”
“São rastros da Senhorita Coelha tentando me interrogar para descobrir as fraquezas do Lorde Ahin.”
“Por minhas costas? Isso é um pouco emocionante.”
“Se ela tentar novamente, o quanto eu posso contar?”
“Pode contar tudo, menos sobre o boneco de coelho que eu carregava quando pequeno.”
Ahin era uma criança que não tinha largado de seu boneco amado até completar sete anos. Pensando no passado por um momento, ele tocou numa pequena mão, agarrada ao corpo desmaiado de Vivi.
“Não aperte tanto ela.”
Russell estava se agarrando com força. Ele tentou chutar, mas sua perna curta não conseguiu tocar Ahin.
“Se você não se comportar, eu vou devorar a guerreira.”
Russell, assustado, soltou Vivi. Foi uma mudança rápida para uma criança, pois ele sentiu a energia de Ahin.
“Evelyn, se prepare para voltar para a mansão Grace com Vivi amanhã.”
“Tudo bem ela deixar a mansão Amon, tão cedo?”
“Eu vou cuidar desse assunto, por isso ficarei aqui uns dias mais.”
“Então mandarei prepararem a carruagem. Pode, por favor, soltar meus pés e minhas mãos?”
Russell empalideceu após ouvir essa conversa. Ele não tinha entendido tudo, mas conseguiu inferir que teria que se separar de Vivi.
“A guerreira… vai embora…?”
Russell, agarrando a manga de Ahin, mostrou olhos chorosos.
“A guerreira precisa proteger o território das panteras negras.”
“Lorde Ahin, meus pés e minhas mãos…”
O pedido de Evelyn desapareceu por baixo das lágrimas de Russell.
“Não quero que ela vá…”
“Você pode passar o resto do dia de hoje com ela.”
“Ei, Lorde…”
Parecia que a atenção de Ahin e Russell não voltaria jamais para o lado de Evelyn. Se esforçando sozinho, ele conseguiu se pôr de pé. No entanto, perdeu o equilíbrio e começou a pular como um canguru para não cair.
“Ugh!”
Ash, ainda ressentida por Vivi, aproveitou a chance para empurrar Evelyn, que caiu de cara no chão. Ele murmurou, derrotado.
“Senhorita Ash, como é cruel…”
Enquanto isso, Vivi, que tinha acordado, olhou ao redor do quarto e voltou a fechar os olhos. Com essas panteras negras, nunca havia algo como um dia tranquilo.
***
O sol estava se pondo. Na casa do líder do clã das lebres, havia uma estufa com teto em forma de domo. Espalhadas pelo interior da estrutura estavam mesas de chá, instaladas sobre peças de mármore. Todo o local parecia ter sido planejado para que coelhos pudessem se mover livremente. Sentada numa mesa, constrangida, olhei para os animais que saltavam ao meu redor.
Eram muito pequenos. Na minha forma de coelho, eu era tão pequena assim? Talvez, por estar sempre com Ash, eu não me sentia tão minúscula… Ash, obviamente, tinha ficado com Evelyn e sido proibida de entrar na estufa. Basicamente, predadores e herbívoros não podiam coexistir num espaço tão pequeno. Ash reclamou, mas não pude trazê-la.
‘Me pergunto se a coexistência… é mesmo impossível?’
Mexendo na capa branca que vestia, olhei para Ahin. Ele estava sentado, com as costas esticadas, e sendo atacado por uma horda de coelhos.
“Parem com isso, faz cócegas.”
Os coelhos, que não entendiam a linguagem humana, continuaram andando sobre ele, farejando as decorações de sua roupa e se esfregando em suas pernas. Me sentindo deixada de lado, lambi os lábios. Obviamente, eu que era a mulher-besta lebre, mas os coelhos tinham escolhido pular em cima de Ahin. Por dentro, estava com inveja.
“Tudo bem eu andar pela mansão livremente assim?”
A comemoração tinha sido interrompida por causa do incêndio, e a mansão ainda estava uma confusão. E eu fui pega como sendo a intrusa que entrou na mansão na forma de coelho bebê. Apesar de estar me preparando para ser severamente interrogada, Ahin estava calmamente observando a estufa.
“Está tudo bem. Eles não podem tratar mal alguém cuja identidade não foi confirmada mas que tem laços comigo e com aquele leão.”
“Então não preciso ir ver o líder do clã?”
“Não precisa.”
Ahin alisou com o dedo um dos coelhos que roçavam nele.
“Já que o leão a identificou como uma dançarina, seria estranho ser chamada pelo líder do clã.”
Murmurei, chocada.
“Mas por que uma dançarina…?”
“É o que eu queria te perguntar.”
Depois de perceber a razão, empalideci. O segredo de que eu havia dançado para Rune estava em risco.
“Ah, quando era criança, meu sonho era ser uma bailarina!”
Sim, a história seria que, como coelho bebê, sempre sonhei em dançar ballet. A vergonha veio em ondas fortes quando me lembrei da cena onde chacoalhei os quadris.
“Vivi, seu rosto está vermelho.”
Ahin se inclinou, me encarando.
“É porque estou com calor!”
“Nesse clima, usando uma capa?”
O olhar gentil ficou com suspeitas.
“Às vezes Vivi esconde as coisas de mim.”
“Caninos!”
No meio de minha vergonha, Russell, que estava brincando com os coelhos ao lado, surgiu ao lado de Ahin.
“Me mostra eles!”
Russell levantou os lábios de Ahin com sua pequena mão. Ao ver os caninos, expostos até a gengiva, cobri a boca com as mãos. O corpo alto de Ahin, ainda que sentado, era mais intimidador do que a maioria dos predadores.
“Esho incomodsha.”
A pronúncia de Ahin, com os lábios puxados, era engraçada, e Russell sorriu largo. Era a primeira vez que o via sorrir tanto desde que o conheci. Acabei murmurando.
“Que graça.”
“Está falando de mim?”
Ahin inclinou a cabeça, e os cabelos prateados caíram para o lado. Era um movimento calculado. A conversa estava estranha, mas, ao contrário de minhas preocupações, Ahin estava se dando bem com Russell. Vir para essa estufa, onde haviam muitos coelhos, ajudou a quebrar o gelo entre os dois. Eu me senti estranha, enquanto Ahin me olhava.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.