A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 67
Toc toc. A porta de vidro na qual eu estava encostada vibrou com as batidas.
“Abra a porta.”
Eu chacoalhei a cabeça, sem olhar para trás. Felizmente, meus olhos, que mais pareciam torneiras de lágrimas, pareciam estar fechados hoje.
“Não sei como você descobriu essas coisas, mas não é nada demais. Você ficou esses dias todos com estranhos e eu não estou falando nada.”
Respirando fundo, tentei me acalmar. Pensei que me sentiria miserável se cedesse agora.
“Você sabia que a minha família eram os Labians. Talvez já até conhecesse minha mãe.”
Somente mágoa tinha se acumulado até agora. Não conseguia acreditar que Ahin sabia de tudo, e eu, de nada.
“Vivi, abra a porta e vamos conversar.”
Ahin bateu novamente na porta de vidro, com uma voz frustrada.
“Só quero dizer que…”
Quando girei e vi o rosto dele através do vidro, não consegui falar mais. Não sabia porque ele tinha uma expressão tão desesperada.
“…Quero dizer que tem mais. Você não me contou que meus feromônios tinham poderes curativos. Teria sido bom saber que existia essa possibilidade. Só curei Ash da beira da morte por pura sorte.”
As minhas emoções acumuladas se soltaram como uma barragem rompida.
“Fiquei chateada no começo, mas parando para pensar, teria sido bom saber. Assim eu não teria ficado me preocupando a cada segundo com quando seria abandonada novamente.”
Eu não ficaria frustrada e triste se ele me tratasse da maneira como fazia quando me recolheu, desde que não mentisse para mim ou escondesse as coisas. Talvez eu estivesse sendo gananciosa, depois de tudo que passei.
“Só vou dizer mais uma coisa. Se souber algo mais sobre meus feromônios, você tem que me dizer. Se souber algo da minha família, conte para mim….”
“Não.”
Ahin, que estava escutando calado, falou de repente.
“No futuro, não pretendo te contar nada.”
“…Por quê?”
Ele não respondeu nada. Meio aliviada por não receber uma resposta ríspida, encostei a cabeça na porta de vidro outra vez. Um acessório de cabelo que eu nem sabia que estava usando deslizou no chão. Eu o apanhei e fiquei brincando com ele nas mãos.
Ahin não era obrigado a me contar nada. No entanto, eu ficava nervosa todos os dias por causa disso. Essas palavras desapareceram em minha garganta, sem serem ditas.
***
O ponteiro das horas do relógio de bolso, amarrado em meu tornozelo, estava quase na posição das 3 horas. Sentada no chão do banheiro, comecei a organizar meus pensamentos. Ao menos nunca estive amaldiçoada.
Com o queixo enterrado nos joelhos, após minhas emoções se acalmarem, comecei a sentir remorso. Talvez eu tenha culpado demais Ahin, depois de ter feito ele se preocupar.
‘Mas, ele se preocupou mesmo?’
Quando olhei para o lado de fora com o canto do olho, de repente arregalei os olhos. Ahin estava sentado com as costas para a porta e a cabeça derrubada.
“Ahin?”
Bati na porta de vidro, mas ele não se moveu. Não me diga que dormiu nessa posição? Talvez fosse possível para Ahin, que tinha comportamentos sempre imprevisíveis…
Eu não podia ficar ali para sempre, então levantei cuidadosamente e destranquei a maçaneta, abrindo a porta de vidro com muito cuidado. Quando ela abriu para dentro, o corpo de Ahin lentamente desabou para dentro do banheiro.
“…”
Meus olhos tremeram como uma árvore sob uma tempestade. Era impossível que ele estivesse apenas dormindo, já que estava encharcado de suor frio.
“Ahin!!”
Me ajoelhei e dei suporte a parte de cima do corpo dele. Ele estava suando tanto que seu cabelo estava grudado na testa. Parecia estar com febre… Toquei sua bochecha para checar e então o deitei de novo, cuidadosamente.
“A professora Janna…”
Tinha uma médica hospedada em um quarto não muito longe deste. Me levantei sem hesitar, mas logo em seguida caí quando Ahin me puxou pelo braço.
“Não chame ninguém.”
“Quê?”
Ahin, soltando meu pulso, se deitou novamente no chão, respirando pesadamente.
“Eu ficarei bem depois de um tempo.”
Só de olhar dava para ver que ele não ia melhorar sozinho. Ansiosamente o olhando, me lembrei do dia no qual Ahin voltou à sua forma verdadeira.
“Isso já aconteceu antes. O que você tem? Porque não quer ver um médico?”
Ahin não poderia ter nenhuma doença crônica. Ele nem mesmo pegou um resfriado que seja nos meses em que o conheço… Mordi os lábios.
“Então, ao menos, deixe-me chamar Evelyn…”
“Não, ninguém.”
Respondendo teimosamente, ele fechou os olhos semicerrados. Será que não queria que ninguém o visse quando estava fraco? Nem mesmo um médico, estando doente? Verifiquei que a porta de vidro estava totalmente aberta. A primeira coisa a fazer seria tirá-lo do chão frio. Depois de andar pelo quarto, decidi pelo sofá. Voltei e dei uma tapinha na bochecha de Ahin
“Ahin, consegue andar?”
Ele abriu os olhos um pouco e respirou com dificuldade.
“Não consigo…”
Encarei o grande sofá de veludo. Comecei a empurrá-lo na direção do banheiro com toda a força, mas ele mal se movia. O sofá era de um material resistente e pesado. Nunca iria conseguir. Voltando para a porta do banheiro, medi Ahin. O seu corpo era inutilmente grande. Amarrando meu vestido na altura dos joelhos, o agarrei pelos tornozelos. Carregá-lo nos braços estava fora de cogitação. Puxando com toda minha força, percebi que, felizmente, ele começou a deslizar um pouco. Só mais um pouco… enquanto o puxava, de repente, Bam! Ouvi um som assustador atrás de mim.
Girei a cabeça, esperando que tivesse sido uma ilusão. Mas, como esperado, a cabeça de Ahin estava presa na perna de madeira de um móvel.
“Ai, meu Deus!”
Esfreguei a parte onde ele tinha se ferido. Ahin, abrindo um pouco os olhos, falou numa voz fraca.
“…Doeu.”
Vendo que ele conseguia reclamar, pensei que não devia estar tão mal assim.
“Deixa que eu vou sozinho.”
Se sentando no chão, ele puxou o cabelo suado para trás. Sua testa foi revelada, iluminando o rosto que estava oculto. Ele parecia triste…?
“Deixe que eu te ajudo.”
Para o caso de ele desabar, dobrei o joelho e ofereci minhas costas como apoio para ele. Um braço pesado foi colocado em torno de meu ombro e ouvi uma risada fraca. Me sentia como se estivesse carregando uma montanha, apesar de ser só metade de seu torso.
“Vamos passo a passo.”
“Está falando sério?”
Com raiva, fui andando devagar. A posição, nem carregando nem apoiando, era estranha, mas finalmente conseguimos alcançar o sofá. Depois de terminar de deitá-lo completamente, enxuguei o suor de suas têmporas com as costas da mão.
“Ahin, me fale se precisar de algo.”
“Você…. não me odeia?”
Ele respondeu, com o fôlego curto.
“…Por que eu te odiaria?”
“Você falou que eu era uma besta cretina.”
Ele tinha um ouvido bom. Deve ter escutado tudo que murmurei para mim mesma no banheiro. Fingindo não ter escutado nada, fui até a janela, a fechei completamente e cerrei as cortinas. Assim, nenhum vento entraria no quarto. Voltei para o sofá com um cobertor macio, e Ahin estava suando baldes. As gotas escorriam por suas sobrancelhas. Ele fingia estar bem, mas estava muito mal.
‘Não acho que seja um resfriado.’
Seria bom chamar um médico. Meu estômago doía de preocupação. A temperatura de Ahin estava alta demais, e minhas mãos não eram frias, para começar. Depois de encaixar um travesseiro em sua cabeça, procurei ao redor do quarto algo que pudesse usar como uma toalha molhada. Era a única coisa para febre que eu conhecia.
Depois de me sentar no sofá e secar o suor de seu rosto com a toalha, vi que o paletó de baile deveria ser desconfortável para ele. Depois de ter maus pensamentos por um momento, olhei ao redor e pensei no que faria.
“Sinto que vou virar presa de uma coelha.”
A voz debochada de Ahin chegou aos meus ouvidos. Eu estive dormindo na mesma cama que ele há meses, então tirar seu paletó não deveria ser nada demais. O ignorei e levei minhas mãos trêmulas aos botões. Mas elas ficavam escorregando. Depois, desabotoei o
colete e comecei a lutar contra a gravata.
“Precisa de ajuda?”
“Estou ocupada demais para conversar, ok?”
Coloquei as mãos dobradas sobre o colo, com elegância.
“Do que adianta essa pose, se posso ver a maldade em seus olhos.”
“Não!”
Preferia que ele tivesse ferido a boca, assim não poderia falar. Não podia dizer essas palavras, então apenas o encarei com ódio. Ahin, sentando-se no sofá, tirou o próprio paletó e colete e deitou de novo, como se desabasse. Ele normalmente teria falado mais, mas parecia não ter forças.
Com os olhos entreabertos, ele puxou a gravata e mordeu o dedo da luva, para puxá-la. Eu fiquei tão distraída que derrubei a toalha na bacia de água ao ver o corpo dele por baixo da camisa suada, que estava transparente.
“Vivi, vá dormir. Eu vou melhorar com o tempo.”
O problema é que essa não era a voz de alguém que iria melhorar sozinho. Ignorando as palavras de Ahin, passei a toalha molhada novamente por sua testa e pescoço. Por dentro, só pensava em meus feromônios de cura. Estava em um intenso debate sobre se deveria usá-los ou não. Não sabia se era uma doença, mas, não sendo um ferimento, como agiriam os feromônios? E se tivesse um efeito contrário?
Ahin, ainda respirando pesadamente, estirou o braço devagar. O dedo calejado e áspero tocou uma lágrima em meus olhos.
“Por que está chorando?”
Ele levou a lágrima até a boca e a lambeu. A língua vermelha passou por seu dedo.
‘Esse predador tem ideia do quão obscena está sua aparência agora?’
Estremeci com a vontade de jogar a toalha sobre ele, para tapar sua visão.
“Eu sei que chorar é seu hobby, mas depois da questão com sua família, é diferente.”
Ahin estava se referindo ao que eu falei no banheiro. A camisa dele estava escura das manchas das minhas lágrimas, que não paravam de cair. Era estranho. Consegui segurá-las muito bem até agora pouco, mas, com uma palavra dele, saíram todas de uma vez. Minha bochecha estava encharcada.
A verdade é que eu estava preocupada. Não sabia o que fazer quanto à dor de Ahin, algo que ele não queria compartilhar nem mesmo com Evelyn, que dirá com um médico. Que sintomas eram esses, se ele não está nem mesmo resfriado? Não conseguia falar nem mesmo uma palavra, mas mordi os lábios. Ahin, me olhando com olhos desfocados, sorriu com os lábios secos e falou.
“Como eu poderia te abandonar quando você é assim?”
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.