A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 63
Quando Ahin e o líder do clã foram para direções opostas, Aven também começou a se mover. Ahin Grace, o mais notável entre os predadores, chamava a atenção com sua figura imponente e seu cabelo prateado. À primeira vista, ele parecia emanar um ar frio, mas era conhecido por ser um pouco excêntrico. A impressão feita naquele baile de “um homem adulto carregando um coelho bebê por aí” não tinha desaparecido da mente das pessoas.
Ahin Grace não desconhecia os rumores que circulavam sobre ele. Mas, ao contrário deles, nos olhos de Aven, ele parecia muito aristocrático, correto e arrumado. Era mais plausível assumir que ele não andaria por aí com um coelho comum. E considerando o timing e as probabilidades, o coelho poderia ser a filha dela.
Seria um desastre. Mas mesmo considerando a hipótese, Aven ainda a considerava absurda. Uma criatura tão humilde… Ela apenas estava pensando na pior possibilidade e o que isso poderia acarretar sobre a imagem da família dela perante outros territórios.
Felizmente, hoje, Ahin Grace não havia trazido coelho nenhum. Quando Aven passou por ele, os passos do jovem sobre o carpete se interromperam. Ela se perguntou se tinha sido apenas impressão, mas não conseguia se livrar da sensação de que, naquele local com tantas pessoas, Ahin estava olhando diretamente para ela. Aven cobriu a boca com o leque aberto e olhou para ele. Seus lábios pareciam estar formando palavras, e ela apertou a vista para lê-los.
[Se me encarar tanto com esses olhões, vai fazer um furo na minha cara.]
Em um instante, o rosto de Aven corou. O próximo líder de um clã usou uma linguagem tão vulgar…! Ahin começou a se aproximar antes que ela pudesse esconder sua vergonha. Ele estava distante o suficiente, mas Aven, sentindo uma pressão que ele emanava a cada passo que dava, deu um passo para trás instintivamente.
À medida que ele caminhava, as pessoas iam abrindo caminho de modo automático. Logo, Aven nem conseguia mais escutar os barulhos do salão de baile. Quando a distância estava quase terminando, Evelyn se aproximou de Ahin por trás, com uma expressão urgente. Após conversarem em voz baixa, os dois se retiraram do salão.
“..Ufa…”
Só então Aven soltou a respiração que estava prendendo. Os dedos dela tremiam. Aqueles olhos vermelhos pareciam mostrar a animosidade perante um inimigo. Ela apenas ficou respirando, tentando apagar a imagem do olhar da besta.
Ela percebeu por puro instinto. Os homens que ela tinha mandado para a floresta próxima à fronteira não tinham simplesmente desaparecido nem sido atacados por panteras negras selvagens. O cabo do leque que ela segurava estava encharcado de suor.
***
Enquanto Ahin saía do prédio, Quinn, dando um rasante sob o céu noturno, pousou em seu braço. Ele trazia um bilhete de Lile, que Ahin tinha mandando retornar à mansão Grace só para garantir.
Quando Valence recebeu a resposta de Ahin através de sua coruja, percebeu que Ahin e Vivi não tinham se encontrado. Lile ainda escreveu que tinham encontrado Barra na floresta próxima à fronteira, mas Vivi e Ash não estavam em nenhuma parte.
“Se ela saiu da mansão junto com Barra, foi perigoso.”
Ahin apertou a carta em sua mão até ela virar pó.
“Barra respeita a hierarquia, até um certo ponto. Ele não seria capaz de aceitar obedecer a Vivi, ainda.”
“Como? Mas, Lorde, ele obedeceu até agora…”
“Você não sabe o que ele pensa por dentro. Além disso, Vivi não demonstra ter força nenhuma. É só eu pisar fora da mansão, e acontece isso.”
“Está dizendo que acredita que ele pode tê-la devorado, meu Lorde…?”
A preocupação aumentou no tom de voz de Evelyn.
“Vamos voltar para o território imediatamente.”
Uma luz leve começou a emanar de Ahin. Ele estava prestes a se transformar em sua forma verdadeira.
“Lorde Ahin, espere um minuto!”
Evelyn, que estava puxando a camisa de Ahin, tirou sua mão imediatamente após ser atingido por feromônios. Com dificuldade, ele prosseguiu.
“Somente Barra estava na floresta. E se ela não voltou para a mansão, quer dizer que foi para outro lugar.”
“Então para onde eu devo ir?”
“Temos que procurá-la. Certamente Ash está com ela, e a Senhorita Coelha estará bem, porque ela não é um coelho normal.”
“Ela ainda é um coelho.”
“Como?”
Ahin, não escondendo sua frustração, respondeu numa voz contida.
“Ela pode não ser normal, mas no fim do dia, é um coelho.”
Ele cobriu os olhos com suas grandes mãos e respirou. Seus dedos estavam gelados. Ele sabia que ela era frágil e se machucaria com facilidade. Rindo de sua própria complacência, Ahin ficou ainda mais nervoso que antes.
Agora que ele queria que Vivi ficasse segura, ele percebeu o quão fraca ela era. Ele não podia apenas rir e dizer “vai ficar tudo bem”. Ela era diferente dele, que era um predador desde que nasceu. Não importava o quão fortes eram os feromônios dela ou quanto ela soubesse sobre métodos de sobrevivência, no fim, ela era apenas um coelho bebê. Até mesmo uma pisada de Ash poderia feri-la seriamente.
O comportamento de Vivi, fugindo desesperada até mesmo quando uma criada derrubava um objeto, não era porque ela era assustada demais. Era uma questão de sobrevivência. Na cabeça de Ahin, a imagem de uma bolinha de algodão fugindo desesperada não parava de rodar. Era perturbador e sinistro. E se ela encontrasse um predador forte? Ou se tornasse presa de algum animal carnívoro? Tinham inúmeras possibilidades de situações perigosas para Vivi. Ele estava transbordando de preocupação.
“Tio, está chorando?”
Ao ouvir essa pergunta do nada, Ahin tirou a mão que cobria seus olhos. Um menino estava olhando para ele de baixo. Era uma das crianças que estavam discutindo mais cedo.
“Que bom. Pensei que estava chorando.”
Os guardas observaram preocupados, sem saber o que fazer. Esse garoto não era o único problema. Na base das escadas, o cabelo de Russel podia ser visto saindo de um arbusto. Os homens procuraram os responsáveis das crianças, olhando ao redor, mas os supostos pais estavam conversando no jardim, tranquilos.
“Jovem mestre, essa pessoa…”
“Esperem.”
Ahin, parando os guardas relutantes com um gesto, se agachou para olhar o menino nos olhos. Ele tinha se lembrado de algo.
“Mas a guerreira… Ela disse que as panteras negras não eram malvadas.”
O menino estremeceu, mas não fugiu. Ahin aplicou feromônios através de sua mão no ombro do garoto.
“Quem é essa guerreira?”
Era um feromônio leve, suficiente para ser afastado com um sopro, mas os olhos do menino ficaram enevoados rapidamente.
“Pantera negra…”
“Pantera negra?”
“Sim… a destruidora de panteras negras… Viv…- Ack!”
Russell apareceu correndo e tapou a boca do menino rapidamente, o arrastando para longe. Os olhos negros estavam cheios de críticas por ele ter contado o segredo.
“…Hein?”
Só então o menino “acordou” dos feromônios e empalideceu. Porque ele dedurou a guerreira? O que faria agora?
“Podem ficar tranquilos, vou guardar o segredo.”
O menino e Russell olharam para Ahin, que lhes mostrou um sorriso angelical. Após despentear o cabelo de ambos, ele pulou a cerca rapidamente.
“Lorde Ahin, para onde está indo?”
“Para o leão.”
Evelyn, o seguindo, parecia estupefato. Se Vivi saiu da mansão e tomou o caminho mais curto, o portão sul da floresta fronteiriça estaria por perto. E Ahin havia passado pelo portão norte, para evitar a caravana dos Manionz, que foi pelo sul. E essa manhã, do nada, aquelas crianças estavam o observando e comentando sobre panteras negras. Evelyn, correndo atrás de Ahn, murmurou.
“Não sei o que está acontecendo, mas acho que há grandes chances de a guerreira ser a Senhorita Coelha.”
“Quem sabe.”
Ahin, respondendo sem sinceridade, subiu na árvore mais alta próximo ao salão de banquetes. Pela personalidade de Rune, a chance de ele estar vagando pelo lado de fora era grande. Logo ele o avistou, e saltou em cima dele de uma só vez.
“Onde está a coelha, Manionz?”
Foi uma voz ameaçadora. Rune, que estava contra a parede, tirou um galho do cabelo de Ahin.
“Não usa mais honoríficos quando estamos a sós?”
“Responda minha pergunta.”
“Não sei porque está perguntando isso para mim.”
Rune, o evitando, olhou para o lado. Ahin, com os olhos faiscando, estava se preparando para usar a força, quando começou uma comoção na parte externa do salão de banquetes.
“O que um animal selvagem está fazendo aqui?!”
“Tragam um arqueiro agora mesmo!”
“Esperem um minuto! Não ataquem!! Se acalmem, um minuto-!!”
Era a voz de Restin, seguido por uma pantera negra – que não era um animal comum no território das lebres. O som de Ash rugindo encheu o ar. Por um momento, os olhos de Rune tremeram. Tendo localizado Ahin, Ash se preparou para saltar e pular o muro para ir até ele. Os olhos vermelhos brilhavam.
“Que tipo de besta salta um muro em um banquete desse jeito! Se acalme! Logo o banquete vai terminar e você voltará para sua dona! Por que eu tenho que fazer isso…!?”
Restin choramingou e segurou o corpo de Ash com toda a sua força, a impedindo de saltar e se deitando na grama no processo. Ele estava cansado demais para controlar Ash como conseguia a Coelha.
“Senhor, está bem?!”
Guardar armados com espadas se aproximaram. Restin, suando e agarrando as patas traseiras dela, falou em voz baixa.
“Estou bem, podem recolher as armas. Agora, bebê, vamos voltar para o quarto de hóspedes… Ugh!”
Ash, que não tinha se intimidado pelas espadas, se desvencilhou. O rugido novamente foi ouvido em toda a área.
***
Dentro do salão de banquetes, um desafio inédito havia se apresentado. Era porque, enquanto tentava sair por uma porta lateral, um jovem não parava de tentar flertar comigo. Estava prestes a usar feromônios para colocá-lo para dormir, mas não queria voltar à forma de coelha justo agora. Somente após meia hora consegui me livrar dele com sucesso e corri, apressada.
Uma mistura de irritação, surpresa e medo me deixaram sem palavras. Pressionei a região do coração para me acalmar. Após entrar numa varanda, no primeiro andar, olhei ao redor.
‘Acho que consigo ao menos usar essa árvore para descer rapidamente.’
Não tinha nenhum guarda ou criado passando lá embaixo. Após rotacionar meus ombros e preparar meus músculos, pulei e me agarrei num galho.
Crack.
O galho imediatamente se partiu e eu caí no chão.
“Quem está aí? Oh, céus!”
Eu havia caído em cima de algum objeto. Assim que rolei para o lado, percebi que era um leque.
“O que é isso?”
Apanhando o leque caído na grama, me petrifiquei. O padrão no leque, de um semicírculo com um cone triangular e o prato gravado no cabo… era o símbolo da família Labian.
“Céus, ele escorregou de minhas mãos. Mas você está bem, senhorita?”
A voz elegante acima de minha cabeça me paralisou. Tinha medo de remover o leque que cobria meu rosto. Porque conhecia a dona daquela voz.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.