A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 59
<…Talvez?>
Enquanto me preocupava, vi um cabelo rosa se movendo com o canto do olho. Assim que movi o olhar, fiz contato visual com Rune. Os olhos dourados brilhavam misteriosamente sob a luz da lamparina. Ele parecia uma pessoa sem preocupações, mas, naquele instante, senti que Rune também era um predador perigoso.
“Pensei que você estava confortável comigo, mas vejo que subiu a guarda outra vez.”
Como pensei, não podia me sentir segura. Comecei a recuar na cama.
“Olhe só, esses olhos desconfiados. E eu nem fiz nada, estou chateado. Agora perdi a vontade de viver por sua causa.”
Eu não queria ouvir isso de alguém cuja cara não mostrava vontade nenhuma de viver. Felizmente, com isso, Rune parou de mencionar o cheiro. Ele continuou conversando sobre a brutalidade de sua irmã, e me contou algo que eu não sabia sobre o dia no qual eu fugi dele no restaurante no Qatar. Aparentemente, após eu ir até o telhado, Rune havia sido capturado por policiais graças a Ahin, que tinha denunciado ele como um sequestrador.
“Aquele desgraçado…”
Percebi que Rune tinha um olhar mais ameaçador quando falou isso do que quando falava sobre como o policial o interrogou.
“Ah, não deveria ter dito isso, desculpe.”
Enquanto ele colocava a mão na parte de trás da cabeça, envergonhado, pensei que, comparando com Ahin e Evlyn e sua falta de noção, o senso comum de Rune era bem refrescante. Era bom também que ele não tivesse feito nenhuma pergunta complicada.
“…Estou sentindo muito sono. Que estranho…”
À medida que ia ficando mais tarde, os olhos dourados iam se fechando. Era normal ficar com sono nesse horário… Enquanto secretamente planejava como escapar dali, Rune, se virando no sofá, tapou o rosto com o braço e murmurou.
“…Tem uma razão pela qual Grace te cobriu com o cheiro dele…”
De repente, me senti congelada. Achava que o cheiro de Ahin realmente tinha desaparecido… Rune continuou murmurando, meio adormecido.
“Aquele pantera negra de um olho só caiu dormindo… Feromônios que induzem o sono…?”
A hipótese dele estava cada vez mais próxima da verdade. Rune tinha sido exposto aos meus feromônios na floresta fronteiriça também, mas ele era um homem-besta, com muito mais resistência que um animal comum, por isso esperava que não percebesse nada…
<O que eu faço?>
Meus feromônios começaram a se agitar. Precisava procurar Ahin para que ele cobrisse meu cheiro imediatamente, antes que mais pessoas percebessem… Comecei a suar frio quando senti uma energia sendo emanada de Rune, que continuava deitado. Feromônios. Ficou claro que o corpo dele estava produzindo feromônios para repelir os meus. Se fossem feromônios fracos, não haveria problema, mas Rune era da linhagem da líder do clã dos leões…
<Não…! Sua besta preguiçosa, acorda!>
Se eu me transformasse aqui, seria muito complicado e embaraçoso. Rune girou no sofá e falou.
“Me sinto anestesiado…”
Ele olhou para mim. Pensei que já tinha se adormecido, mas ele estava sorrindo. Não tinha dúvida que ele tinha se deixado afetar pelos feromônios de propósito.
“…Esses feromônios não são comuns para uma pessoa do território das lebres… Qual é o nome da sua família? Você tem alguma ocupação?”
<Não!!>
Não podia lidar com isso agora. Sentindo que estava perdendo a cabeça, dei um tapa na minha própria cara para me controlar. Rune não podia saber as condições para minha humanização, e por isso não estava parando de liberar seus próprios feromônios…
“Se sentir que está prestes a se humanizar, faça uma dança.”
<Por favor, entenda!>
Me levantando nas patas traseiras, comecei a me chacoalhar. Fiz a dança tradicional do clã das lebres até parar após uma pirueta.
“Você dança bem…”
Rune, me olhando com os olhos enevoados, parecia uma gelatina mole.
“Ah, entendi, sua ocupação era de dançarina… Por isso seu cabelo é tão longo assim.”
Rune, interpretando tudo errado, fechou os olhos.
“Será que você ganhará a Coroa de Imond?”
Do que estava falando? A Coroa de Imond era um prêmio dado apenas aos melhores dançarinos do continente. Não era hora de ficar falando besteira.
<Acorda! Entenda o significado da dança!>
Nesse momento, consegui voltar à racionalidade. Rune não tinha como reconhecer o sinal que eu tinha combinado apenas com Ahin. Ele caiu no sono completamente e eu olhei pelo quarto. Não tinha como pular para fora da cama, que era muito alta. Olhei ao redor, desesperada. A esse ritmo, ficaria presa ali, sem poder procurar Ahin, até o dia seguinte… Até que meus olhos pousaram na mochila de Ash.
<…Ferenium.>
Após entrar na mochila e cavar um pouco, bati a cabeça em cheio no relógio de Ahin.
***
Assim que o sol nasceu, Ahin e Evelyn, usando capas que cobriam todo o corpo, entraram em um prédio no meio de um beco suspeito. Parecia ser um lugar ordinário, mas na verdade era um grêmio de informações que tinha acesso à maior quantidade de informações do território das lebres. Estava tão escuro que não dava para ver a um palmo do nariz.
Ahin, sentado em uma cadeira, tirou uma moeda de ouro do bolso. Ele olhou para o vidro opaco na sua frente, jogando a moeda no ar e a apanhando. Ele precisava de informações que só poderiam ser obtidas em um grêmio de informações do território das lebres.
“Um predador, isso é raro.”
Do outro lado do vidro, uma voz ressoou.
“Um vidro que só permite ver de dentro pra fora. Que truque sujo.”
“Você também está com uma capa que cobre todo seu rosto, cliente. Apenas adivinhei ao ver seus caninos.”
Logo, Ahin colocou uma bolsa pesada em um compartimento que tinha o tamanho de um punho. Ali, além de moedas de ouro, havia um envelope contendo um pó cinzento.
“Fale-me sobre esse pó.”
“É uma droga feita da seiva da árvore de Blum. Quase não se vê ela por aqui, no território das lebres.”
O informante, que parecia satisfeito com as moedas de ouro, respondeu rapidamente.
“Era popular entre os herbívoros faz uns 10 anos, mas hoje se vê mais pelos territórios de predadores. Então não tem muito do que se falar sobre ela por aqui.”
“Quero uma lista dos nobres do território das lebres que já obtiveram essa droga em algum momento.”
Quando Ahin mencionou revelar nomes de nobres, a voz do outro lado do vidro parou. Ahin, cuja boca era a única coisa que aparecia por baixo do capuz, sorriu.
“Procuro nobres que não são muito importantes, uma família de nível intermediário. Melhor ainda se eles tiverem cabelos brancos.”
Tuk. Uma bolsa de moedas ainda mais pesada foi colocada no compartimento. O som de moedas se chocando, como se estivessem sendo contatadas, pôde ser ouvido do outro lado do vidro.
“…Não posso dar os nomes completos de todos os indivíduos, mas posso dar uma lista de nomes de famílias que tiveram contato com a droga.”
“Por que não fala de uma vez tudo que sabe?”
“Temos que prezar por nossas vidas, também. Entenda que temos que mudar a base de endereço todas vez que damos qualquer informação relacionada a nobres.”
O informante, grunhindo, pegou a bolsa de moedas.
“Os nobres têm muitas vantagens, mas mesmo eles, se forem pegos mexendo com drogas… É um crime pesado. A maioria das drogas é gerenciada apenas por nobres menores e gangues.”
O mercador estava usando uma lupa e mexendo em uma pilha de papéis.
“Bem, há registros de que a droga foi usada antes, em brigas, e gerou feromônios mais fortes que ajudaram as pessoas a vencê-las. Não tenho registros de despertar de feromônios.”
O informante empurrou um documento contendo uma lista de famílias que chegaram a comprar a droga.
“Entre eles, se quer saber das famílias que tenham indivíduos de cabelos brancos…”
Tuk. Ahin colocou mais moedas no compartimento, sorrindo. O som do farfalhar dos papéis ficou mais veloz.
“Espere um minuto… Há os Wixings… os Benzels… e… Ah. Os Labians.”
***
Uma luz piscou. Então, tudo ficou escuro. E clareou de novo. Era como se alguém estivesse agitando sua mão sobre minhas pálpebras fechadas. Assim que abri os olhos, vi quatro pares de olhos me encarando. 4 pessoas estavam com as cabeças juntas, me olhando de cima. Eram crianças gorduchas que não pareciam ter mais de cinco anos de idade.
“Olha, será que ela acordou?”
“Jovem mestre Evena, você é idiota? Ela abriu os olhos, então óbvio que está acordada.”
“Cala a boca!”
O som dessa conversa, dita por vozes infantis, me fez me encolher. Eram apenas crianças, mas poderia ser perigoso se quisessem brincar com o coelho bebê e acabassem me ferindo. Assim que me levantei, um tecido cor de mármore que cobria meu corpo começou a escorregar. Assim que o agarrei por instinto, vi longas pernas e braços.
‘Ah, eu sabia.’
Eu tinha me humanizado. Enquanto arrumava o tecido, apressada, vi que havia um relógio pendurado em meu pulso. O que aconteceu? Eu entrei na mochila de Ash para tirar o Ferenium, e tinha acabado de acordar agora, sem lembrar de nada.
“Olha só, ela é uma mulher-besta coelho sim. Veja os olhos. Eu falei!”
“Mas, por que ela está aqui? Jovem mestre, pergunte a ela.”
“Por que eu?!”
As vozes das crianças distraíram meus pensamentos. Então, ouvi o som de passos e uma bola de pelos negra entrou em meus braços.
“Ash!”
Ash lambeu minhas bochechas como se estivesse feliz por ver alguém que não via há muito tempo. Fiquei um pouco assustada pelos caninos roçando em minha bochecha, mas aguentei. Então, olhei ao redor. De algum modo, já tinha amanhecido e o lugar onde eu estive deitada não era o quarto de hóspedes de Rune, apesar da estrutura ser semelhante. Olhando para os quadros, moldura, vasos e etc, todos antigos, parecia ser um quarto que não era usado hoje em dia. Verificando o estado de meus feromônios, mexi no relógio de bolso. Considerando que eu não sentia dor nenhuma e meus feromônios estavam estáveis, era muito provável que eu tivesse usado o Ferenium inconscientemente.
‘…Só tenho dois usos agora…’
Soltei a respiração, preocupada. Quando fiz contato visual com as 4 crianças, elas deram um salto para trás, cobrindo os olhos com as mãos, mas ainda me olhando pelos dedos entreabertos.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.