A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 57
Piscando o seu olho intacto, Barra raspou as garras do chão e soltou um grunhido.
<Barra, o que tem errado com você?>
Não era hora de fazer bullying comigo, então só saia da frente. Enquanto eu sinalizava para ele com a pata dianteira, senti um calafrio. Ao meu redor, pássaros começaram a voar para longe, gritando. Ash também começou a emitir um rosnado baixinho atrás de mim. Logo, os arbustos começaram a se mover, revelando várias panteras negras. Obviamente, se tratava do bando que morava na floresta fronteiriça. Eles se posicionaram atrás de Barra, como se fossem subordinados dele.
<O quê…?>
Me sentindo ameaçada, corri para o lado de Ash, rápida como um raio. Parecia que Barra tinha pensado que aqui, longe dos olhos de Ahin, Valence, Meimi e dos empregados, seria a oportunidade perfeita para acabar comigo, sua rival amorosa.
<Seu desgraçado…!>
Ergui um punho para Barra. Ele nunca teria uma chance com Ash desse jeito… Parecendo ter me entendido, ele começou a se aproximar, seguido pelas outras panteras. Eles estavam vindo! Tadak, tadak. Várias panteras saltaram ao mesmo tempo. Ash, as bloqueando com o próprio corpo, mordeu a garganta de uma delas. A pantera ferida grunhiu e saiu correndo para dentro da floresta.
Ao ver isso, os outros começaram a recuar, se afastando de Barra. Isso me fez lembrar do que Evelyn tinha dito há muito tempo.
“As panteras negras da floresta não caçam em bando, mas a Senhorita Ash é a mais forte de todos, por isso os outros a respeitam.”
Pude ver que era mesmo verdade. Ash, fazendo com que todas as outras panteras saíssem correndo apenas com o olhar, agitou a cauda como se pedisse que eu a elogiasse.
<S-sim, boa menina.>
Dei tapinhas nela e me voltei para frente outra vez. Ainda havia a questão de Barra, que continuava bloqueando o caminho. Ele parecia que não perderia a oportunidade, e seu olho estava grudado em mim. Os únicos sons que se ouviam eram grilos e as nossas respirações. Finalmente, Barra saltou.
<Aaah!>
Ash me atirou para o lado com a boca para me tirar do caminho. Eu rolei alguns metros no chão enquanto os dois começavam uma batalha intensa. Eu precisava pará-los! Eles poderiam se ferir de verdade… Me lembrando do estado de Ash naquele dia, na barraca, me senti muito ansiosa.
<O que eu faço??>
Meus olhos giravam seguindo os dois predadores, que rolavam no chão. Quando pensei que precisaria usar meus feromônios para parar essa briga, de repente, senti alguém se aproximar por trás.
“Acho melhor você usar os feromônios de forma direcionada. Mire no alvo.”
Rune, que eu não tinha visto por muito tempo, estava agachado ao meu lado. Não sabia se ele tinha acabado de acordar, mas seu cabelo estava virado para cima como se marcado pelo travesseiro.
<Por que está aqui….?>
Fiquei encarando Rune, surpresa. A bochecha dele estava vermelha e inchada, como se tivesse apanhado. Percebendo meu olhar, ele cobriu a bochecha com a mão, parecendo envergonhado.
“Oh, isso? Tenho que ir a um evento no território das lebres como representante do meu clã, mas fiquei enrolando e me atrasei, e minha irmã me bateu na cara. É o de sempre.”
<Ash!>
Não consegui prestar atenção no que ele falava, pois Ash tinha sido encurralada por Barra.
“Olhe aqui, com esse gesto fica mais fácil. Assim.”
Rune ergueu a mão e fez um gesto que parecia um peteleco no ar. Ao mesmo tempo, uma pantera negra que estava distante caiu no chão.
<Ele desmaiou?!>
Meus olhos trêmulos foram da pantera caída para o rosto tranquilão de Rune.
“Aqui é uma área afastada, então não se preocupe e aproveite para praticar seu controle com os feromônios.”
Talvez ele não soubesse, mas eu não tenho controle nenhum. Neguei com a pata dianteira.
“Sua pantera negra pode estar resistindo bem nessa luta, mas quem sabe como terminará?”
Em resposta a isso, olhei para frente. As duas bolas de pêlo negro ainda rolavam sobre o chão. Não tinha tempo a perder. Tentei invocar os feromônios para as patas. Observando do lado, Rune aconselhou.
“É como atirar uma flecha.”
Abri as patas traseiras para ter mais suporte e estiquei a pata dianteira como se segurasse um arco. Fechei um olho e preparei a outra pata. Logo, um som de risada disfarçada de tosse surgiu ao meu lado.
“Eu quis dizer no sentido de direcionar a mira, não precisava fazer uma pose de verdade.”
Teria sido bom se tivesse explicado antes! Percebendo meu olhar assassino, Rune mostrou o punho em encorajamento.
“Você consegue, fighting!”
Com essa torcida, meu ódio se dissipou. Quando continuei a encará-lo, ele tocou na nuca para demonstrar vergonha. O rosto puro e corado não parecia ser de um predador. Neste instante, Ash caiu voando em um arbusto.
<Não tenho tempo pra isso. Rápido!!>
Juntando os feromônios em minhas patas dianteiras, me lembrei do momento em que o Vovô esfregou o polegar e o indicador.
<Foi esse movimento que enviou os feromônios para o alvo.>
Talvez sentindo a minha concentração de feromônios, Rune se inclinou e instruiu.
“Agora.”
Me foquei em Barra, levantei as patas dianteiras e bati palmas dramaticamente. E nada aconteceu. Ainda que continuasse tentando, o resultado era o mesmo.
“Puxa.”
Rune, fazendo bico, parecia bem despontado.
“…Não funcionou como você esperava, não é? E se continuar batendo palmas, vai atrair o predador pra cá.”
Ele quem tinha falado para eu fazer esse gesto! Céus!
<Fiz o que pude!!>
“Olha só, ele está vindo.”
Parando de protestar, fiquei pálida. Barra, tendo deixado Ash caída, estava correndo para mim. Sua boca estava tão aberta que podia ver o fundo de sua garganta. Assustada, comecei a bater palmas como louca.
<Não vem pra cá!!!>
Clap, clap. A distância só diminuiu… Realmente parecia que estava o atraindo para mim. Quando percebi, os caninos de Barra estavam a poucos metros. Por instinto, eu ergui as patas em uma posição defensiva, e a sensação dos feromônios acumulados ali se fortaleceu.
“Grof.”
O corpo de Barra cambaleou para o lado. Paf. O enorme pantera desabou e a poeira subiu. Logo depois, um ronco profundo pôde ser ouvido.
<Ele dormiu?>
Enquanto eu encarava minhas patas dianteiras, Rune sorriu, alegre.
“Conseguiu na segunda tentativa.”
Se eu falhasse, teria morrido! Enquanto tentava gravar a sensação de quando liberei os feromônios, Rune segurou minha pata e a sacudiu.
“Bom trabalho!”
Ele então acariciou minha cabeça com um dedo. Nesse instante, Ash, que se levantou e saltou como um raio, o empurrou para longe imediatamente. Rune estirou o dedo novamente, mas foi barrado pela fortaleza intransponível que era Ash.
<Ash, tudo bem.>
Tentei me mover, mas minhas pernas tremiam. Era preocupante ter encontrado Rune nessa situação. Por sorte, eu não tinha usado poderes curativos, mas ele podia ter notado que eu havia curado o ferimento perto de seu lábio na vez anterior. E o pior era que, olhando para esse rosto relaxado, não dava para adivinhar o que ele estava pensando nem um pouco.
“Mas para onde você estava indo? E qual é a desse pantera de um olho só que foi nocauteado?”
Os olhos dourados pareciam cheios de suspeitas enquanto olhavam as mochilas que eu e Ash carregávamos. Rune coçou a cabeça como se estivesse com preocupações. Graças a isso, o cabelo ondulado ficou bagunçado para todos os lados.
“Você está indo atrás de Ahin Grace?”
<…?>
De repente, tive um pressentimento do porquê de esse leão estar aqui. O banquete de aniversário do líder do clã das lebres… Certamente o clã dos leões, cujo líder era a família Manionz, teria recebido um convite. E, se ele estivesse indo para lá, a floresta próxima à fronteira seria parte do caminho.
“Se estiver, te aviso que ele pegou o lado oposto da floresta, para passar pelo portão norte, Lindeoall. Ele fez isso de propósito para não cruzar com minha delegação. Ah, só para explicar, estamos bem próximos ao portão sul, Pentreal.”
Pensei ter escutado errado. Limpei as orelhas porque não conseguia acreditar.
“Mas parece que estamos indo para o mesmo lugar, no final. Quer uma carona?”
***
Barra e várias panteras negras habitantes da floresta ficaram caídas para trás. Iria puní-lo severamente quando retornarmos. Eu e Ash não tivemos escolha a não ser embarcar na carruagem Manionz.
Trepidando, a carruagem havia passado pela fronteira e já estávamos dentro do território das lebres. Não tínhamos cruzado com a carruagem de Ahin até o momento. Essa jornada tinha acabado virando um jogo de pega-pega. Sentada em uma almofada na carruagem, olhei para a janela. Como estava num ângulo muito baixo, tudo que podia ver eram telhados, mas reconhecia o material, comum no território das lebres. Quando encarei um telhado vermelho e largo…
“Quer olhar pro lado de fora?”
Rune, que tinha aberto a janela para comprar carne-seca de um vendedor ambulante, perguntou. Neguei com a cabeça e olhei para baixo. Não pensei que os olhos dourados dele estariam me acompanhando.
“Aqui vai.”
Em um instante, uma grande mão havia me levantado na altura da janela. Sentando na palma por reflexo, olhei para o lado de fora e pude ver o território das lebres. Homens-besta coelho com olhos violeta-claro por todas as partes. Haviam tendas vendendo frutas e tudo era colorido.
“É verdade que homens-besta coelho gostam de comer cenoura?”
Parei de olhar para fora e o encarei com censura. Por acaso você só comia carne crua por ser um leão?
“Bem, eu gosto muito de carne.”
Ele conseguiu compreender meu olhar e respondeu na lata. Eu não devia ter perguntado. Ignorando a carne-seca pendurada nos lábios de Rune, encostei o queixo na moldura da janela.
“Um território de herbívoros parece um lugar pacífico. Você morava aqui antes? A senhora Valence me disse que Grace te recolheu.”
Rune falou com uma voz tranquila, bocejando ao final.
“Ele não te sequestrou, não é? Se ele estiver te ameaçando pra ficar calada, levante a pata.”
Encarei Rune com o canto do olho. Que homem estranho. Ele parecia estar sempre tranquilo e sonolento, mas seus olhos brilharam quando comprou a carne-seca. Ficar com alguém que parecia sempre estar com preguiça me fazia ficar nervosa.
“Lorde Rune… Pare de falar sozinho e olhe ali.”
A voz de Restin ecoou ansiosa.
“Não importa o quanto tentemos convencê-los, eles não vão acreditar que o senhor trouxe dois animais de estimação para o banquete.”
“Qual é o problema?”
“Muitos! Olhe essa pantera negra! É claramente um predador selvagem… Acabou. Nunca vamos conseguir entrar na mansão.”
Restin, cuja bochecha também estava vermelha e inchada, protestou. Que tipo de pessoa era a irmã de Rune para fazer o rosto deles ficar daquele jeito? Agoniada, concordei com Restin e olhei para Ash, enquanto os dois discutiam.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.