A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 35
Os meus dedos seguraram apenas o ar, pois meu pulso havia sido agarrado por Ahin. Ele me impediu, mesmo sem ter ideia da dor que eu sentia… Minha expressão provavelmente demonstrava ódio e amargura. Estava com tanta dor que a imagem dele estava borrada. Queria gritar, mas estava tão cansada que só saiu um sussurro.
“Só dessa vez…”
Precisava tomar o remédio só uma vez. Eu controlaria melhor os feromônios na próxima vez. Já não tinha confiança de que conseguiria manter a consciência, a essa altura.
“Eu… Ugh…”
Segurei a manga da blusa de Ahin, implorando. Sem dizer nada, ele tocou o lençol que cobria meu pescoço.
“Se a condição dela não tem nada a ver com as drogas…”
A marca de mordida, que ainda não havia se curado, ficou exposta ao ar frio.
“Basta injetar feromônios que a crise deve passar.”
“Quê? Ah, sim, mas…”
A médica fez uma cara de espanto ao final da fala dele. Ela não parecia entender as intenções de Ahin. Sem mais explicações, ele se curvou na minha direção.
“O que você está… Ei! Por acaso é louco?!”
A médica, assustada, o segurou pelos ombros, tentando impedi-lo.
“Pare de ser tão arrogante! Vai cobri-la com seus próprios feromônios?!”
“É possível, então me solte.”
“A mistura de feromônios correndo no corpo pode levar a paciente à morte!”
Ahin removeu a mão dela de seu ombro.
“Os meus feromônios têm o poder de dominação.”
“Ah…”
Ela pareceu assustada. Eu me remexi de dor. Ahin estirou a mão e me puxou, dando suporte às minhas costas com a mão. No momento que senti um toque no meu pescoço, a médica falou.
“Espere um minuto!”
Mais uma vez, a médica agitou as mãos para intervir. Olhando para ela de cima a baixo, Ahin falou.
“Se continuar interferindo, vou me irritar.”
Era um aviso claro. Entendendo o que ele quis dizer, ela se engasgou.
“Não, o que quero dizer é… Os seus feromônios podem de fato se sobrepor e dominar os dela, que estão em descontrole, mas…”
O olhar da médica se dirigiu ao meu pescoço e então para o chão.
“O fato de que ela tem marcas de mordida no pescoço… Isso não é aceitável. Ela é uma herbívora. Os feromônios de um predador são demais pra ela.”
Os olhos pretos dela mostravam uma determinação firme. Olhando para ela sobre o ombro de Ahin, eu mordi os lábios. No momento, queria me livrar da dor a qualquer custo, mesmo que isso envolvesse ter meu pescoço mordido. Os olhos vermelhos de Ahin se voltaram para a marca em meu pescoço. O seu rosto sem expressão e o calor de sua mão, que podia sentir, formavam um contraste estranho.
Nossos olhares se encontraram. E, quando mais uma vez a dor fez meu corpo se contorcer, Ahin me puxou pela nuca. Ele inclinou minha cabeça e tocou meu queixo de leve com a outra mão. E, quando aproximou seu rosto de mim, senti algo tocar meus lábios.
Feromônios começaram a entrar através de minha boca. O hálito de Ahin estava quente. Não me movi, chocada pelos feromônios que se espalhavam. Devagar, senti meu corpo se estabilizar. A dor desapareceu tão rápido que parecia ter sido uma mentira. Quando ele afastou os lábios por um momento, os olhos vermelhos se entreabriram.
“Não pare…”
Ele me puxou para perto novamente enquanto eu segurava o seu colarinho como se fosse uma corda da salvação. Mais uma vez, a energia dos feromônios dele pressionou os meus como se estivesse os suprimindo. De repente, me lembrei de algo do passado.
“Hoje durante o treinamento… Não, quero dizer, o clã dos lobos me atacou novamente. E com isso, estou ferido.”
“Você não vai me curar?”
Pouco tempo depois de eu chegar na mansão Grace, Ahin havia feito esse pedido absurdo. Na hora, pensei que ele era apenas uma besta estranha.
“Vivi, hoje você irá me ajudar.”
Ele havia dito algo estranho logo antes de virmos para Qatar. E, quando eu feri as patas fugindo de Rune, havia estirado-as para ele, pedindo que me curasse, e…
“Eu vou te levar para casa e aplicar tratamento para que você melhore.”
Ele havia checado o ferimento com uma cara de desagrado, mas não tinha o curado. Se os feromônios dele pudessem curar, ele não teria tido razão para não fazê-lo.
“Os meus feromônios têm o poder de dominação.’
Então, quem tinha curado Ash, que estava à beira da morte, em um instante? Meu coração se acelerou. A habilidade de curar ferimentos e pôr os outros para dormir. Vendo as circunstâncias, os feromônios de Ahin pareciam ter sido os responsáveis, mais do que os meus, que não serviam pra nada. Mesmo que ele tivesse uma habilidade de dominação, haviam homens-besta com mais de um poder.
Pensei que não podia ser eu… Apertei tanto os punhos que minhas mãos ficaram brancas. Ahin sabia de tudo desde o início, mas não me falou nada de propósito.
‘…Por quê?’
Ahin, segurando a parte de trás de minha cabeça, injetou mais feromônios. Cada vez que eu tomava ar, sentia que eles se misturavam aos meus. E então, dominada por essa energia, me senti caindo em um abismo.
***
O som de pássaros cantando sinalizou que o sol estava nascendo.
A médica, dormindo sentada, finalmente encostou a cabeça na mesa. Graças aos feromônios de Vivi, que tinham se espalhado por toda a casa, mesmo após bater com a testa na mesa, a médica não mostrava sinais de que ia acordar.
Ao lado da cama, Ahin, que estava sentado em uma cadeira, se espreguiçou e se encostou. Ele estava sem palavras. Enquanto injetava os feromônios, sentiu que os seus se misturavam aos de Vivi, e percebeu que, se baixasse a guarda, ele seria engolido pelos feromônios dela.
Como efeito colateral, mesmo já tendo se passado várias horas, ele ainda se sentia aéreo, como se estivesse caminhando em nuvens. Ele olhou os pés dela, as cobertas, a camisola que vestia, emprestada pela médica, e seu olhar finalmente pousou no rosto de Vivi.
A expressão desesperada dela parecia uma mentira agora que estava sonhando, sorrindo enquanto dormia. Diferente da vez anterior, ela não tinha voltado a ser coelha, e continuava em sua forma humana.
Ahin estirou o braço e tapou o nariz de Vivi. Ela abriu a boca e respirou fundo enquanto dormia – e os feromônios fluíram pelo ar.
“Será que estão mais fortes porque ela está na forma humana?”
Por causa do cheiro dos feromônios, Ahin se sentiu sufocado e afrouxou sua gravata. Vivi continuou dormindo com um sorriso.
A paciência dele começou a diminuir enquanto resistia aos feromônios de Vivi. Ele cairia no sono pelo poder deles caso se descuidasse por um segundo que fosse. Vivi usava seus feromônios sem perceber quanto estava com as emoções fora de controle. No entanto, talvez por tudo que tinha acontecido e por estar na forma humana, o poder deles estava forte demais. Era estranho.
Ahin suspeitava que a família de Vivi eram nobres de baixo ranking. No entanto, quanto mais ele aprendia sobre os poderes dela, mais via que ela tinha o que era preciso para se tornar a líder do clã das lebres.
“A família que lidera o clã das lebres… era a família Amon?”
No entanto, essa família já tinha um sucessor conhecido. Ademais, o fato de que ela ser deixada para morrer do território das panteras negras não faria sentido, pois mesmo que não conseguisse sair da forma de coelho bebê, uma descendente da linhagem do líder do clã não poderia ser negligenciada a tal ponto. Ahin continuou pensando.
Toc toc. Uma batida na porta o interrompeu. Ele se levantou e pegou uma adaga decorativa na parede. Se aproximou da porta e preparou a lâmina.
“Quem é?”
“Sou eu, as competentes mãos e pés do Lorde Ahin.”
Pelo que Ahin sabia, só tinha uma pessoa no mundo que tinha tanta confiança em sua competência. A porta rangeu ao se abrir e Evelyn apareceu. O ar fresco que entrou diluiu o cheiro dos feromônios de Vivi.
“Finalmente nos alcançou.”
“Perdão pelo atraso… Relatarei tudo que aconteceu, mas, antes disso… tem um homem que parece um gorila do lado de fora da casa, tremendo de frio. Ele está completamente pelado.”
Ahin, que tinha acabado de se lembrar da existência de Lile, ergueu as sobrancelhas. Um homem-besta normalmente não conseguia ficar mais de meia hora em sua forma animal. Ele procurou pela casa e pegou um tecido que provavelmente era um pano de chão, e entregou a Evelyn.
“Mande ele cobrir a parte inferior do corpo com isso e se mantenha do lado de fora.”
Ahin guardou a adaga e fechou a porta com frieza. Mais uma vez, as batidas ecoaram. Quando ele abriu a porta novamente, Evelyn continuava ali parado, segurando o tecido.
“Lorde, eu também não posso entrar?”
“Perdão, mas aqui não entra ninguém mais feio que eu.”
Ahin sorriu e voltou a fechar a porta, mas Evelyn a bloqueou.
“Nesse caso, eu posso entrar.”
“Evelyn, está dizendo que pensa que é mais bonito que eu?”
“Posso ser honesto, meu Lorde?”
“Pode falar.”
“Então, sim~”
Ahin fechou a porta na cara dele e voltou para a cadeira. Ele nunca tinha tido a intenção de deixar Evelyn entrar, para começar. Cruzou as pernas e coçou o queixo. Os olhos vermelhos se fixaram na mulher adormecida outra vez. Suas bochechas eram redondas e coradas.
“Todos os herbívoros são assim?”
Comparada com os predadores, que tinham traços mais afiados, ela era mais arredondada. Quando estava acordada, ficava assustada se ele a encarasse, então era a primeira vez que ele a olhava com calma.
“O que devo fazer?”
Vivi era atrapalhada por ter passado tantos anos num corpo de coelho, mas ela era tão esperta quanto assustada. Agora que tinha escutado Ahin falar que o poder de seus feromônios era dominação, ela deduziria a quem pertencia o feromônio com poderes de cura. Talvez ela já soubesse, e estivesse apenas fingido.
O que ele faria se Vivi quisesse ir embora após se humanizar? Uma vez que aprendesse a controlar seus feromônios, poderia ir para qualquer lugar e viver de sua habilidade de curar. Quando ele pensava nisso, seu estômago começava a ferver.
Ele fechou os olhos devagar e voltou a abri-los, batendo no braço da cadeira com os dedos. Não queria deixá-la ir embora, nem mandá-la de volta ao território das lebres. Se ela quisesse voltar para sua família…
Enquanto ele pensava nisso, o cheiro de Vivi invadiu o nariz de Ahin. Ele começou a ter vontade de deixar outra marca naquele pescoço branco. No momento em que ele estava entre razão e instinto, uma mancha preta rapidamente surgiu por trás da cama. Era Ash.
Tonta pelos feromônios de Vivi, Ash piscava os olhos como se fossem se fechar a qualquer momento. Ainda assim, ela se colocou entre Ahin e Vivi.
“Bem, dizem que bestas com pêlo negro não sabem quando desisitr.”
Ahin, olhando para a traidora que não mais o considerava seu mestre, mas sim um alvo, riu.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.