A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 31
Assustada, mordi o dedo do homem que me segurava. Deve ter doído, porque ele contorceu o rosto, mas, infelizmente, não me soltou.
“…Não é um coelho comum. Amarre o coelho também.”
Um dos colegas do homem que me segurava falou. Ele negou com a cabeça.
“Não, vou levá-lo assim mesmo.”
Felizmente, não colocaram uma corda ao redor de mim. O homem, que começou a andar, estava me segurando com uma delicadeza surpreendente. Ele alisava minha cabeça com sua mão do tamanho de uma pá e corava me olhando toda vez que os outros não estavam prestando atenção, ou olhava para minhas patas feridas e lacrimejava. Era um alívio que não estivesse sendo maltratada, mas me sentia estranha. Não tinha nada de bom em ser tratada como um pet queridinho de um homem estranho que parecia um gorila.
Olhando para trás do homem, vi Ahin, que estava nos observando com atenção. Ele parecia ter esquecido seu plano de atuar como se estivesse assustado e não tinha expressão, mas por vezes, notei sua boca tremer.
“Bebê, olhe pra mim.”
Assim que o homem que me carregava falou isso, me foquei em Ahin e ele virou a cara para baixo. Seus ombros tremiam levemente.
<…Eu sabia.>
Ele sempre ri quando eu estou em apuros. O homem-besta que guiava Ahin, que continuava rindo silenciosamente, negou com a cabeça. Devia estar pensando algo como ‘esse aqui tem um parafuso solto’. Como pensava igual ao homem, o compreendi perfeitamente.
Logo, a mão do homem que me levava cobriu meus olhos. Pude escutar e inferir que estávamos entrando em um prédio, e que Ahin e Rune também haviam sido vendados.
“Onde está o líder do grêmio?”
“Não está aqui. Vamos mantê-los presos por enquanto.”
“Aquele leão… Não deve ser alguém de alto ranking do clã dos leões.”
“Ele ficou assim com só um pouquinho de pó. Acho que nem todos os leões são fortes, afinal.”
Rune, que estava sendo tratado como um fracote, bufou. Eles continuaram conversando enquanto nos empurravam para um lugar que cheirava a mofo. O homem me colocou no chão após uma longa pausa.
“Coma isso.”
Ele colocou uma cenoura inteira na minha frente. Então o colega dele falou, com uma voz irritada.
“Cara, outra vez você e esses animais pequenos. Tome jeito e feche a porta.”
Eventualmente, com um suspiro de preocupação, ele girou e fechou a porta. Os olhos que pude ver pelo vão da porta estavam lacrimejando e tremendo.
***
A porta se fechou e os sons do mundo exterior desapareceram completamente. Apesar do lugar ser velho, a porta era de aço reforçado. O lugar parecia algum tipo de depósito.
<…Não posso comer isso.>
Olhei a cenoura que o homem havia deixado. Quando pisei nela para fazê-la rolar, acabei perdendo o equilíbrio e caindo no chão. Ao mesmo tempo, ouvi um barulho do canto do aposento. Eram Ahin e Rune, ainda amarrados, rindo.
Me levantando, constrangida, me sentei contra a parede. Então olhei para os dois. Quando Rune estava na forma humana, seus olhos dourados pareciam gentis, mas a sua aparência verdadeira era brutal. A expressão ‘besta assassina’ não era o bastante para descrevê-lo.
<Não posso chegar perto deles de jeito nenhum.>
Os olhos de Ahin, que sorriam para minha expressão desconfiada, se voltaram para Rune. A cor azul, iluminada pela tocha acesa, continuava parecendo estranha para mim.
“Lorde Manionz, ainda não consegue voltar para a forma humana?”
Rune, com as 4 patas amarradas, assentiu com a cabeça. O pó cinzento ainda não tinha perdido o efeito, fazendo com que não conseguisse controlar sua humanização.
“Você é realmente inútil.”
Escutando o insulto, Rune rugiu e tentou se virar no chão com todas as forças.
“Um leão idiota.”
Ahin, recitando todos tipos de insultos, sorriu maldosamente. Como estava com todas as patas amarradas, Rune se debatia. Ele era filho da líder do clã dos leões, mas estava sendo tratado desse jeito. A juba, que estava toda desgrenhada, parecia patética.
Após ver isso, Ahin tranquilamente torceu os próprios pulsos algumas vezes. Antes que eu percebesse, ele havia soltado seus pulsos e usou as mãos para liberar os seus tornozelos.
“Não consegue fazer igual porque é preguiçoso.”
Vendo que Ahin estava solto, Rune rugiu empolgado. Ahin, ignorando totalmente a mensagem de ‘agora, desamarre minhas patas’, se aproximou de mim e me pegou nas mãos.
O rosto dele se aproximou enquanto tentava checar minhas patas feridas. Não consegui adivinhar o que ele estava pensando, devido a sua poker face. O rosto elegante estava tão perto que fechei os olhos para não vê-lo. Ao contrário dos olhos vermelhos de sempre, o Ahin de olhos azuis parecia ter uma atmosfera mais tranquila.
Como diabos ele tinha trocado a cor dos olhos? Enquanto o encarava, Ahin, entendendo o que eu pensava, deu tapinhas ao redor dos olhos.
“É uma droga feita pelo clã dos guaxinins. O efeito passa em algumas horas.”
De acordo com o que eu tinha lido em [A Teoria dos Feromônios], o clã dos guaxinins geralmente possuem poderes de feromônios relativos à mudança de aparência. E então eles haviam usado isso para desenvolver um tipo de droga. Era tão rara que não podia ser comprada com poucas moedas de ouro, então não esperava que ele tivesse o usado para algo tão trivial assim. Ahin gentilmente coçou o meu queixo, que estava caído.
“Os outros clãs são muito desconfiados com panteras negras que tem feromônios fortes.”
Parecia que ele havia mudado seus olhos para enganar os residentes da região de Qatar, que possuía habitantes provindos de vários clãs diferentes. Ahin começou a alisar o ferimento na minha pata dianteira. Eu me senti envergonhada por alguma razão e puxei a pata para longe dele.
O que ele estava pensando por trás dessa cara sem expressão? A atitude de Ahin não havia mudado muito, mesmo depois de ele me descobrir transformada em humana. Não consegui conversar sobre o que aconteceu devido a uma série de incidentes, mas tinha medo do que ele faria agora que sabia que sou uma mulher-besta. Os olhos dele se abaixaram.
“Graaaaauuu.”
Rune choramingou. Ele não havia desistido de pedir a Ahin que o desamarrasse.
“Que incômodo.”
Eventualmente, ele se aproximou de Rune, dando um tapinha em seu rosto. Desviando de uma mordida que Rune tentou lhe dar, ele começou a desamarrar a corda.
Como enxerguei os caninos do leão, abaixei a cabeça rápido, e então senti algo em meu nariz. Havia um pó cinzento no chão. Era da mesma cor do pó que aquele homem-besta hiena havia espalhado. Meu nariz coçou, reconhecendo o odor.
“Vivi, tenho certeza que Evelyn nos seguiu, ele deve chegar aqui logo.”
Ahin parou de falar ao me escutar espirrar. Eu tapei o nariz com as patas dianteiras, mas não conseguia parar de espirrar.
<Atchim! Não… consigo… parar-Atchim!>
Essa não… drogas feitas com feromônios devem exercer um efeito muito forte sobre mim. Até mesmo Rune não tinha conseguido suportar seu efeito… Nesse instante, senti algo cobrir meu corpo.
***
O grupo de meliantes que levou Ahin e Rune se moveu para longe do centro da cidade. Eles haviam entrado em um prédio cuja placa indicava ser a sede de um grêmio e que estava à venda.
Restin, que havia seguido o grupo escondido, olhou para Evelyn. Os olhos azuis, aparecendo por baixo do cabelo preto, eram estranhos. Evelyn, que sentiu o olhar de Restin, olhou de volta tranquilo.
“Tomei uma droga feita por homens-besta guaxinins. Acha que combinou comigo?”
“Não combinou. Mas, mais do que isso…”
O secretário estava louco de curiosidade. Sem conseguir mais se conter, Restin perguntou.
“Bem, Senhor Evelyn… sobre aquela coelha….”
“Por favor, se refira a ela como Senhorita Coelha.”
“Quê!? Não, não. O que é essa coelha, afinal?!”
Ele encarava Evelyn com a pergunta ‘é um animal normal ou não?’ estampada em sua cara. Evelyn olhou para frente sem expressão. Parecia que o Lorde Ahin tinha descoberto algo a mais, mas não havia dito a ele. Tudo que Evelyn sabia é que ela era uma mulher-besta.
Ademais, parecia conhecer bem os hábitos dos nobres, pois sempre cumprimentava a Senhora Valence, a chefe da mansão, e não se sentia constrangida em ser atendida todo o tempo por Meimi.
“Senhor Evelyn?”
A expressão de Restin mostrava que estava muito desconfiado de Evelyn, que se manteve em silêncio. Para evitar mais perguntas sobre Vivi, Evelyn deu meia volta.
“Perdão, senti algo estranho agora.”
“Parando pra pensar…. Eu também senti um cheiro estranho ainda agora.”
“Sério? De verdade?”
“O quê?”
“Ah, nada.”
De fato, o que Restin havia dito era verdade. Já que tinham um olfato apurado, Evelyn, Restin e os cavaleiros se concentraram no cheiro suspeito que vinha de algum lugar. Era diferente dos aromas de especiarias da rua, e lembrava o odor de uma carcaça se decompondo.
Andando pelos becos, encontraram um homem caído no chão. Um dos cavaleiros se aproximou, o olhou de perto e chacoalhou a cabeça.
“Está morto. Mas a cor da pele é um pouco estranha… não acho que seja um homem-besta hiena, mas a pele está escurecida.”
Vício em drogas, pensou Evelyn. Tocando no ombro de Restin, ele falou em uma voz pesada.
“Senhor Restin, por favor toque no cadáver e verifique como estão seus feromônios.”
Apesar da expressão solene, seus olhos cintilavam. Se agachando, Restin tocou o pulso do homem e se focou na energia de seus feromônios. De fato, apesar de o homem ter morrido, os feromônios ainda circulavam por seu corpo.
“Eles estão todos misturados, uma bagunça.”
“Acho que ele era viciado em drogas feitas de feromônios. Escutei que tomar demais pode levar à morte.”
Dando as costas ao cadáver, Evelyn olhou para o prédio com uma expressão inquieta. Ahin e Rune não teriam problemas, mas Vivi, uma herbívora, causava preocupação. Apesar de ela já estar na forma de coelha para começar, ele não tinha como saber de que maneira as drogas poderiam afetá-la.
Pensando que deveriam se apressar, Evelyn dissuadiu Restin de investigar mais o corpo.
“Vamos embora. Os feromônios do Senhor Restin podem ser contaminados, então melhor largar esse pulso.”
“Argh!”
Restin entrou em pânico e soltou o braço do homem furiosamente. Evelyn tinha sido quem havia mandado que ele investigasse o cadáver, sem nenhuma preocupação por sua segurança.
‘Ele é um canalha….!’
O punho de Restin, que conteve os insultos que ele não podia dizer em voz alta, tremeu.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.