A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 21
Os olhos da besta brilhavam mesmo sob a luz fraca. Fiquei congelada por imaginar que Ash não me reconheceria na forma humana e talvez pudesse me atacar. Ou então, fazer um barulho alto e acordar Ahin. A encarei por muito tempo, e vi que seus olhos estavam vidrados.
“A…Ash…?”
Chamei o nome dela com uma voz baixinha, mas ela não se mexeu. Parecia estar drogada.
“Você dormiu…?”
A pantera estava dormindo de olhos abertos e sentada. Me sentindo confusa, me inclinei na cama devagar. Estava quase escapando dali…
Então escutei a respiração de Ahin, que estava se mexendo enquanto dormia. Isso quase me distraiu, mas não podia tirar os olhos de Ash, então não olhei para trás.
Logo depois, senti ele mexer a mão sobre meu cabelo, que estava espalhado pela cama, o que me deu calafrios. Comecei a suspeitar.
‘E se ele não estiver realmente dormindo?’
Ele já me maltratou tantas vezes. No primeiro dia que cheguei, ele me ordenou que chorasse, e no segundo, ameaçou me devorar.
Estiquei a perna e pus um pé no chão. Ahin não poderia estar acordado e não reagir, a não ser que tudo fosse algum plano elaborado. Ele ficaria surpreso ao me ver transformada em humana. Ou ele tinha conseguido me ver na noite do baile de algum modo?
Olhei novamente para Ash. Tentando me sentar, cambaleei um pouco. E percebi que não estava usando roupas outra vez.
‘O que eu faço…’
Se Ahin estivesse acordado, e olhasse para esse lado… Meu coração acelerou.
Vi o rosto dele com o canto dos olhos. Era um rosto que sempre havia sido belo, mas agora que eu era humana, podia ver melhor seu cabelo prateado desarrumado e seu pescoço, com uma linha definida. Estava tendo pensamentos obscenos enquanto ele dormia.
Ao contrário dos herbívoros, os predadores tinham uma aparência mais cativante. Parando para pensar, Evelyn era bonito se ficasse o tempo todo com a boca fechada, e tinha ouvido muitos empregados da mansão comentando como Rune era maravilhoso.
Após hesitar por um longo tempo, eu sussurrei.
“…Ahin.”
Eu experimentei dizer o nome dele. Fiquei tão envergonhada que fiquei vermelha até as orelhas. Mas ele, que parecia realmente estar profundamente adormecido, não moveu um músculo. Não houve resposta.
Enquanto o olhava com o rosto franzido, juntei mais um pouco de coragem e falei.
“Ahin?”
Minutos de silêncio passaram. Minhas suspeitas ainda estavam ali. Estirei a mão. Senti a pele suave de Ahin ao tocar seu rosto de leve. Era uma sensação estranha.
Ahin grunhiu e se moveu um pouco, mas não mostrou sinais de ter acordado. Mesmo quando o cutuquei e até dei tapinhas, ele não reagiu. Não coloquei nenhuma força, mas não acordar depois disso tudo era estranho… Ele estava mesmo dormindo?
Olhei para Ahin, que ressonava, e então para Ash. Estava na hora de me levantar.
Minha cabeça girava como se estivesse bêbada. Era estranho. De repente, senti os feromônios de meu corpo se revirando. Não sabia como, mas achava que estava os concentrando sem perceber.
‘…Essa não.’
Frustrada, me encolhi. Não me diga que… o meu poder apareceu de repente ou algo assim?
“Seu cheiro me acalma.”
“Não quero me levantar quando durmo ao lado de Vivi.”
Meus olhos trêmulos se moveram entre Ahin, que dormia tranquilo, e Ash, que continuava dormindo de olhos abertos. Se era como eu estava pensando, o poder contido em meus feromônios devia ser forte.
Depois de um tempo me esforçando para conter os feromônios, Ash piscou. Ela deve ter acordado mais rápido porque estava os absorvendo de longe, no chão, ao contrário de Ahin, que estava ao meu lado.
Juntando os pontos, fiquei boquiaberta. Talvez a habilidade especial de meus feromônios seja…
‘A habilidade de fazer os outros dormirem?’
Isso era um absurdo. Era um poder sobre o qual jamais tinha ouvido falar. Enquanto pensava nisso, olhei para mim mesma. Bem, eu era uma mulher-besta coelha como nunca se tinha ouvido falar, então creio que faz sentido ter feromônios estranhos.
Mordendo os lábios, senti um calafrio. Ash, que tinha se aproximado da cama, estava me olhando com o queixo apoiado na borda do colchão.
“Sai daqui!”
Se afaste! Ainda com medo de Ash, estiquei o braço e abanei o ar. Em vez de seguir meus desejos e ir para longe, Ash grunhiu como se estivesse insatisfeita. Isso fez seus caninos ficarem expostos. Nesse momento, escutei Ahin se remexer na cama. Me paralisei.
‘E agora?’
Estava entre a cruz e a espada. Ash grunhiu novamente. Apressada, me inclinei e levei o dedo indicador aos lábios.
“Ash, shhhhh!”
Não sabia se ela conseguiria compreender. Mas ela parou de fazer barulho de imediato, a cauda preta balançando no ar como se tivesse me reconhecido pelo cheiro.
Enquanto um suspiro de alívio surgia em mim, me movi devagar. Senti que o tempo que havia passado na forma humana já estava mais longo do que quando eu me transformei durante o baile.
Pra começar…. precisava de alguma roupa. Olhando para Ahin, me preparei para sair da cama com movimentos cuidadosos. Ao contrário de quando eu era coelha, as cobertas não pareciam tão grandes.
‘Saia do caminho, Ash.’
Ash, com a cauda abanando, estava me seguindo com o olhar, não importava pra que lado eu fosse. Era como se estivesse esperando a comida vir até ela.
Desconfortável, não tive opção a não ser engatinhar até a ponta da cama. Finalmente, cheguei ao final e pus uma perna para fora. Assim que coloquei o peso do corpo sobre a perna, ela cedeu e caí no chão com um baque.
Surpreendida, Ash arregalou os olhos. Consegui acalmá-la com mais “shhhh!” enquanto ela tentava grunhir de novo.
Será que o barulho o acordou? Ainda no chão, levantei a cabeça e olhei para a cama. Felizmente, Ahin, ainda enrolado no cobertor, estava dormindo.
‘O quê?’
De repente, senti algo tocar os meus ombros. Era o tecido que cobria o sofá de Ahin. Me virei e vi Ash, me cobrindo com o tecido. Ela me lambeu na bochecha. Tive calafrios, mas também lágrimas de emoção.
Tinha medo dela, mas apreciava que ela tivesse cuidado de mim. Minhas barreiras pareciam estar se derrubando.
“Ash…”
Sentir que alguém cuidava de mim era algo novo. Assim que tomei coragem e alisei as costas de Ash, minha visão se enevoou. Senti uma sensação de cair, e logo patas brancas familiares estavam perante meus olhos.
O sol começava a nascer por entre as cortinas. Ahin se mexeu e girou na cama.
Apesar de tudo, eu me sentia refrescada. Nem percebi o momento no qual adormeci.
***
Ahin, que olhava para o teto, logo sorriu sozinho. Ele havia injetado seus feromônios em Vivi na noite passada.
Ela havia o rejeitado e o encarado com olhos de ódio. Ele nunca tinha ouvido falar de um predador sendo intimidado por sua presa. Ela não queria ser mordida, mas essa reação só fez ser mais divertido, pelo exagero.
Parando para pensar, Vivi costumava se enterrar nas cobertas todas as noites, mas às vezes fazia coisas estranhas como pôr a pata dentro da boca de Ahin. Talvez o feromônio de um predador estivesse dando curto-circuito no corpo da coelha.
Ele havia esperado ela dormir, e colocado mais feromônios nela, só para garantir. Graças a isso, os feromônios dele haviam a envolvido por completo. A mistura fez com que os feromônios dela se soltassem, e ele ficou contente em absorvê-los. Logo em seguida, adormeceu profundamente.
‘Eles não são pouca coisa…’
Ahin, que continuou deitado, lambeu os lábios. Ele era o predador com o maior pedigree do território das panteras negras. Era a primeira vez que ele era afetado pelo poder do feromônio de outra pessoa desde que tinha se humanizado.
Mesmo depois de ter acabado o efeito, ele ainda se sentia relaxado. Queria aproveitar mais a sensação.
Ahin puxou o travesseiro e vasculhou as cobertas procurando a bola de algodão responsável por este incidente. Mas ele não encontrou Vivi mesmo depois de revirar a cama inteira. Ele sabia que ela não conseguia descer da cama sozinha.
“Vivi?”
Ele chamou com a voz rouca. Ahin, que havia se levantado rapidamente, continuou procurando a bola de algodão pela cama.
Quando se deitou no chão para procurar embaixo da cama, enxergou uma coelha aninhada nas patas de uma pantera negra, dormindo. Uma visão rara que não se podia ver em qualquer lugar.
Sem palavras, Ahin deu uma risada.
“Ash, você a tirou da cama?”
Ash acordou com o chamado e inclinou a cabeça, como um cachorro. Ele pressentiu que ela estava fingindo não entender.
“Traga ela para mim.”
Ash, que se levantou obedientemente conforme as instruções de Ahin, carregou a coelha pela pele do pescoço e a depositou em cima da cama.
Adormecida, Vivi roncava com as patas esticadas. Ela as mexia como se estivesse nadando em seu sonho. Ash, com o queixo apoiado na borda da cama, a observava atentamente.
“Está achando interessante?”
Ahin, sorrindo, afagou a cabeça de Ash e se sentou na cama. Parecia que ela tinha gostado mais de Vivi do que ele imaginava.
“Eu também não consigo tirar os olhos dela.”
Era uma coelha tão pequena, mas sua presença era enorme. Em algum momento, Ahin começou a naturalmente procurá-la toda vez que ia se deitar e novamente quando acordava.
Enquanto penteava seu cabelo prateado com as mãos, de repente sentiu algo no colchão. Nesse momento, os olhos vermelhos se arregalaram.
Tinha um longo fio de cabelo branco enrolado nos seus dedos, e ele não tinha ideia a quem pertencia.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.