A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 116
Só Valence e Quinn permaneceram no escritório depois que os assistentes, Lile e a coruja Hilla se retiraram.
Sentando-se em sua mesa, Valence olhou para Quinn calmamente, enquanto ele arrumava suas penas. Talvez por ter Ahin como mestre, a águia não parecia intimidada mesmo na frente da líder do clã das panteras negras.
‘Ele é arrogante… Realmente, se parece com o dono.’
Valence, decidindo não dizer isso em voz alta, releu a carta. Na manhã anterior, ela tinha enviado Quinn com uma solicitação para que a Professora Janna viesse cuidar de Vivi no território das panteras negras. A resposta que ela segurava dizia que, mesmo que ela viesse a toda velocidade, levaria no mínimo 3 dias para chegar.
‘Mais de três dias, então…’
Valence, fechando os olhos devagar, se lembrou do que tinha acontecido naquela manhã.
“O ferimento está suturado e o risco de morte passou. No entanto, se algo parecido voltar a acontecer, pode ser muito perigoso. O maior problema é que ela está muito instável emocionalmente…”
O médico esquilo tinha relatado isso, com olheiras profundas. Valence não tinha conseguido passar da porta para ver Vivi diretamente.
“Ela não consegue ver um predador diretamente, porque isso desencadeia seu trauma. Na verdade, lidar com isso é tão urgente quanto o ferimento no pescoço.”
‘Não temos pessoal suficiente para cuidar dela. Todos os criados da casa são panteras negras… Arrumamos um médico herbívoro, mas trabalhando dia e noite, ele está no limite…’
Valence suspirou, desolada. A verdade é que mesmo que a Professora Janna viesse, o problema fundamental de que este era um território de predadores não seria resolvido.
Ainda por cima, não se sabia se Vivi, que tinha acabado de ficar entre a vida e a morte, iria se recuperar desse choque psicológico.
Valence abriu sua gaveta para pegar uma caneta e parou. Antes que ela se desse conta, a gaveta estava lotada de itens de coelho. Desde tutus feito sob medida, a uma mochila estampada com uma cenoura, que ela ainda não tinha tido a chance de entregar.
Valence segurou a mochila, menor que a palma de sua mão, e a tocou suavemente.
‘…Já faz tanto tempo…’
Ela sentia falta dos dias pacíficos com a coelha. Tomar chá no jardim juntas, vê-la acenar com a pata toda vez que via de longe…
No começo, Vivi tinha rasgado o retrato que Valence tinha mandado fazer, zangada. Mas ao ver que a senhora da casa tinha ficado chateada, havia suspirado e até mesmo posado para o pintor. Cada um dos muitos retratos da coelha espalhados pela mansão mostravam uma parte vital de seu cotidiano.
Depois de hesitar por muito tempo, Valence endureceu sua expressão. Ela já sabia que só havia um caminho a tomar, para o bem da coelha. Só não queria admitir.
“…Venha aqui.”
Quinn, vendo ela agitar a mão, ficou parado onde estava.
“Você deve estar preocupado com ela também.”
<Eu, preocupado com aquela coelha maldita? Nem pensar.>
Quinn negou, dando de ombros com as asas.
“Para chegar no território dos porcos com a sua velocidade, deve levar… umas seis horas? E você está aqui com a resposta da carta 12 horas depois. É impressionante que alguém que não se preocupa com a coelha tenha voado 12 horas seguidas, sem comer nem dormir.”
Envergonhado, Quinn evitou contato visual, disfarçando. Valence se inclinou e colocou uma pequena cesta de vime na mesa onde a águia estava pousada.
“Você pode levar a coelha até lá, mais rápido que qualquer outro. Somente um homem-besta como você teria essa capacidade.”
Ela não explicou nada, mas Quinn conseguiu vagamente entender o que ela estava dizendo. Os olhos da águia tremeram ao encarar a cesta pequena e delicada.
***
Dentro da cesta, Vivi, que tinha recebido tranquilizantes, estava dormindo profundamente sob um tecido macio. Seu peito subia e descia regularmente à medida que respirava.
Enquanto isso, o homem-besta esquilo havia retornado a sua forma original. Ele caminhava de um lado para outro, colocando mais tranquilizantes e outros apetrechos médicos na cesta. Então, ele afofou o tecido e sinalizou que estava pronto com a pata.
“Por favor, cuide bem dela durante a viagem.”
Quando Valence falou, inclinada sobre a cesta, o esquilo deu um guincho afirmativo como resposta. Para ele, era mais que uma viagem de negócios. Ela havia feito esse pedido dizendo que não poderia pagá-lo, mesmo que tentasse, pelo resto de sua vida.
Valence colocou a mochila com estampa de cenoura contendo uma pequena carta e o relógio que Vivi adorava dentro da cesta. Com a vibração do vime, a bolinha de algodão se estremeceu enquanto dormia, mas, felizmente, não acordou.
‘…Tenho que dizer adeus sem nem mesmo ver os olhos dela abertos…’
As marcas de lágrimas no pelo de Vivi fizeram com que o coração de Valence doesse. Se esta seria uma breve despedida ou se jamais voltariam a se ver era algo que dependia exclusivamente da decisão de Vivi.
“Bebê, espero que você melhore e retorne.”
Sussurrando numa voz tão baixa que ninguém foi capaz de ouvir, ela fechou a tampa da cesta.
“Quinn, tudo pronto.”
A águia, que estava a observando de longe, voou até ela e pousou ao lado da cesta.
“Pedi ao médico da família que pusesse Ahin num descanso profundo. Ele não vai acordar por dois dias. Você consegue deixá-los lá e retornar antes disso, verdade?”
Isso significava que ela pretendia esconder completamente de Ahin o fato de que a coelha tinha sido levada para outro local. Quando Quinn a olhou com censura, Valence sorriu.
“Se Ahin souber, vai ser uma confusão. Ele vai querer ir até onde ela está. Isso é óbvio. Também não podemos deixar que meu sogro descubra, por enquanto.”
Lillian não era bom em guardar segredos nem em disfarçar suas emoções. Bastava ver como ele passava grande parte do dia encarando o quadro da coelha lendo um livro que ficava na parede da biblioteca.
“Se ele souber, a chance de que consiga esconder esse fato de Ahin é praticamente zero. Você é o único nessa mansão livre do poder de Ahin. Sei de sua lealdade, mas só dessa vez, gostaria que mantivesse o segredo.”
Gentilmente alisando a cesta, ela acrescentou.
“Da primeira vez que ela veio para a Mansão Grace, foi contra a sua vontade. Espero que, quando chegue a segunda vez, ela possa vir por sua própria escolha.”
Quinn, sem responder, segurou a alça da cesta com as garras. Valence amarrou um tecido com firmeza entre as patas da águia e a alça, só para garantir.
“Não creio que alguém como você, que tem como maior crença a liberdade, vá querer tirar a liberdade da coelha.”
Valence, tendo retornado a sua expressão habitual de líder do clã, sorriu. Quinn, não podendo adiar mais a viagem, girou. O homem-besta esquilo não conseguiria se segurar antes de voltar à forma humana por muito tempo. E ele teria que chegar na casa da Professora Janna antes disso.
A águia alçou voo, deixando algumas penas para trás. Valence ficou olhando pela janela até que ele virasse um pontinho no céu e desaparecesse por completo.
Seria mais seguro para Vivi se recuperar num território cheio de herbívoros, como o dos porcos. E a melhor maneira era levá-la ali agora, antes que fosse tarde demais.
Caso ela se encontrasse com outro predador e seu trauma ficasse mais profundo, ela poderia quebrar. Nesse momento, até mesmo Ash era uma ameaça que poderia desencadear uma crise.
Sentindo o vento frio em sua pele, Valence olhou para o céu azul. Era apenas meio-dia, mas ela já se sentia extremamente solitária.
***
Ash caminhava pelo jardim, após ter sido forçada a sair por Meimi e Barra, sob a justificativa de que ela não estava se distraindo nada esses dias. Ash se deitou na grama, rolando sem nenhum entusiasmo. Passear sem Vivi não tinha graça nenhuma.
“De hoje em diante, essa coelha é a sua mestra.”
No início, ela apenas havia obedecido devido aos feromônios de dominação de Ahin. Ela seguia a coelha de modo constrangido, se perguntando o tempo todo que diabos estava fazendo.
Um dia, ela notou que Vivi estava com dificuldades para subir uma escada, então tentou ajudar ao carregá-la na boca, mas recebeu um chute no meio da cara, o que apenas aumentou o constrangimento.
A coelha era orgulhosa. Ash tinha ficado chateada que a bola de algodão tinha ignorado a sua boca amiga.
Outro dia, quando Ash passeava com Vivi, elas encontraram um grave problema. Uns cavaleiros que tinham acabado de treinar haviam conectado uma mangueira e estavam brincando com água.
Para Ash, que odiava tomar banho, isso era uma grande ameaça.
Nesse momento, Vivi esticou as patas dianteiras e bloqueou o jato de água que foi para o lado delas por engano, servindo como escudo para Ash. Rapidamente, os cavaleiros se assustaram e correram para enxugá-la.
<Vivi arriscou a vida para me proteger…>
Uma onda de emoção havia corrido pelos olhos amarelos de Ash. As costas de Vivi, com os braços abertos sem hesitar, pareciam mais dignas e confiáveis do que a maioria dos líderes que ela já tinha visto.
Depois desse evento, a coelha seguiu mostrando uma consideração que Ash nunca tinha visto antes. Quando a pantera subia na cama com as patas sujas de terra, sujando o lençol, e temia levar bronca de Meimi, Vivi rolava suas patas com força por cima das manchas para fingir que tinha sido ela a culpada.
A marca das pegadas era obviamente diferente. Meimi sabia perfeitamente, mas apenas suspirava sem dizer nada.
Outro dia, quando Ash havia tirado um cochilo e o sol começou a bater em sua cara, Vivi havia arrumado um lenço para cobrir o rosto da pantera.
Depois disso, ela começou a só tirar cochilos em lugares onde o sol batia, para poder receber essa gentileza mais vezes.
Vivi passava grande parte do dia na biblioteca, mexendo em objetos quadrados de papel. Era muito tedioso e Ash não entendia como ela suportava ficar horas parada, tocando nas finas partes de papel desses objetos. Ainda assim, se ela se sentasse ao seu lado e esperasse, às vezes Vivi olhava para ela e a acariciava, como se estivesse orgulhosa.
Sem nenhuma razão em particular, a sua afeição foi crescendo e crescendo. Como um animal que tinha sido treinado com rigidez desde que era bebê, ela se sentia bem quando Vivi passava o dia todo cuidando dela quando comia algo estranho e tinha dor de estômago.
O seu mestre anterior, Ahin, parecia bom antes, mas depois tinha virado um incômodo. Por que diabos Vivi sequer se importava com ele? Ele era um cara malvado que sempre ameaçava comer Vivi com uma cara assustadora.
Ash estava prestes a pensar em maneiras para se livrar dele quando um dia, ao vê-lo chegar, ela percebeu que Vivi havia timidamente arranhado o chão com as patas, parecendo feliz. Assim, ela não teve opção a não ser desistir do plano.
No entanto, isso foi um erro, pois Ahin acabou machucando Vivi de verdade. Isso não teria acontecido se ela tivesse ficado sempre ao seu lado.
Ash pateou a grama, sem nenhum senso de propósito. Ela queria que Vivi melhorasse logo. Talvez ela ficasse melhor se recebesse comida de presente?
Pensando em sair para caçar, Ash percebeu a sombra de um pássaro no chão. O dono desta era Quinn, voando bem alto.
Ash ergueu a cabeça. A cesta amarrada nas patas de Quinn, alto lá no céu, a deixou estranhamente nervosa. Meimi a chamou ao longe.
“Ash, vamos embora.”
Aparentemente, a primeira vez que Ahin havia encontrado Vivi tinha sido dentro de uma cesta…
Sem tirar os olhos do pássaro, Ash começou a correr.
“Ash!!”
Surpresa pelo comportamento repentino, Meimi e Barra começaram a segui-la.
<Se eu abrir a cesta… Vivi pode estar dentro…Ela deve ter melhorado e saiu para brincar com a águia, sem me levar junto!>
Ash correu até o portão principal, animada.
“Ash, não pode passar daqui.”
No entanto, os guardas bloquearam seu caminho.
<Preciso ir atrás de Vivi! Saiam da minha frente!>
Ash nervosamente andou de um lado para outro, mas os guardas seguiram bloqueando-a. Se ela saísse da mansão e entrasse em uma cidade, poderia haver problemas.
“Ash, se acalme.”
Até mesmo Meimi, sem ter ideia do que estava acontecendo, tentou parar Ash. Enquanto isso, Quinn se afastava em uma velocidade tão grande que ela mal podia vê-lo agora.
<Vivi…>
A frustração de não conseguir segui-la foi expressada em um rugido. Tendo perdido Quinn de vista, Ash decidiu que ficaria guardando o portal principal, esperando que Vivi retornasse.
<Quando ela voltar, vai brincar comigo outra vez. Estarei esperando, Vivi.>
Um dia, dois dias, cinco dias. Os anoiteceres e amanheceres se repetiam sem parar. E dez dias depois, Vivi ainda não havia retornado.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.
Lucien
Aiii q dor, tomara q ela se cure e volte logo 💔
E Ash 😭