A Relação simbiótica entre uma lebre e uma pantera negra - Capítulo 112
“…Ahin, abra a porta.”
Bam, bam.
Vivi gritava, batendo na porta de vidro. Ahin respirava pesadamente, pensando de modo vago que tinha acontecido uma situação muito parecida no território das lebres.
Ele queria fugir para um lugar onde Vivi não pudesse vê-lo, mas a porta era transparente e ele não podia fazer nada a respeito. Seu cabelo prateado estava grudado na testa suada.
“Abra, abra logo!”
Vivi chorava e golpeava a porta do banheiro.
“Eu não tenho mais medo de panteras negras! Está tudo bem mesmo que Ahin me morda! Por isso, deixe eu te curar.”
A frase incoerente dela foi uma bagunça. Ahin, vendo Vivi chorar, olhou sem expressão para ela, através do vidro.
Agora ele podia compreender porque todas as vezes que Edith tinha um ataque, ele se escondia em algum lugar. Não era porque não queria ser visto em um momento frágil, mas por quão feridas ficavam as pessoas que presenciavam esse momento.
Ahin sorriu fracamente, piscando as pálpebras pesadas. Os olhos, bochechas e nariz de Vivi estavam vermelhos e pareciam adoráveis. Era uma pena que ele não podia encorajá-la a chorar mais vezes.
‘Eu pensei que estaria bem com isso…’
Antes ele não tinha medo de morrer, mas agora estava aterrorizado. A razão era óbvia. Ele tinha medo de ficar feio aos olhos de Vivi. Talvez ela, que odiasse sangue, nem mesmo olhasse mais para ele.
E, acima de tudo, a ansiedade de que ele não teria muito tempo mais para passar ao lado dela foi o que o levou para um abismo. Ele queria fugir de tudo.
Mal conseguindo se manter consciente, Ahin tossiu outra vez e rapidamente cobriu a boca com as mãos. Mais sangue vermelho escapou por entre seus dedos.
Os olhos de Vivi, ao encarar a cor escarlate, se arregalaram. Ahin estava pálido e, por um momento, pareceu não respirar.
‘O que eu posso fazer…. O que eu faço?!’
A mão dela, apoiada no vidro, tremia. Ela não entendia porque ele estava tão relutante em receber os feromônios de cura. Tinha dito a ele que, depois disso, ela poderia fugir se ele tivesse o impulso de mordê-la.
Abaixando a cabeça, Vivi socou o chão com força. Ela nunca fugiria o deixando para trás em uma situação perigosa, e Ahin sabia disso. Por essa razão, ele tinha tentado se afastar para protegê-la.
Sem conseguir enxergar por causa das lágrimas que não paravam de cair, Vivi tentou enxugar os olhos com as costas das mãos.
Ahin estava sofrendo com algo que ela não podia imaginar. Ela se sentiu idiota por ficar tão emocionada com um sinal de humanização definitiva.
Ela também odiou Edith, por passar adiante os feromônios de dominação, e, mais do que tudo, odiou os feromônios em si, por ameaçarem a vida de Ahin.
Bam. Bam.
Vivi golpeou a porta até um ponto em que seus punhos queimavam. Os olhos lilás brilhavam com amargura.
“Se você não abrir essa porta, vou chamar a Senhora Valence para cá.”
Ahin, ouvindo a ameaça boba, sorriu fracamente. Ela nem sequer teria a coragem de sair e deixá-lo sozinho. Como esperado, Vivi não se moveu e apenas ficou ali, chorando cachoeiras.
“Por que não abre?!”
Gritando, ela procurou ao redor algum instrumento para abrir a porta. O ideal seria quebrar o vidro, mas… Ahin estava encostado ali e iria se ferir.
“Ahin, destranque a porta…”
Vivi, puxando a maçaneta debilmente, mordia os lábios ao ponto de sangrar. E se ela quebrasse a porta de mau jeito e ela não abrisse em absoluto, além de ferir Ahin?
Ela pensava que sua força de vontade não tinha limites, mas estava arrasada pelo fato de que não tinha nem mesmo o poder para romper uma porta, mesmo após se humanizar.
Enquanto isso, Ahin pressionou o peito com a mão. O ataque estava piorando ainda mais, e ele não conseguia respirar direito, pois seu corpo parecia quente como lava. Enquanto cogitava voltar a sua forma de pantera de propósito, Ahin percebeu que o lado de fora tinha ficado extremamente silencioso, do nada.
Ahin olhou freneticamente ao redor até enxergar Vivi, jogada no chão do quarto.
“…Vivi?”
Ela não mostrou qualquer reação. Com o coração afundando, ele tocou na porta. Talvez ela tenha chorado tanto que desmaiou. O cabelo branco estava espalhado no chão.
Ahin, forçando-se a se esticar contra a porta de vidro, conseguiu alcançar a maçaneta. Tossindo e limpando o sangue, ele a destrancou rapidamente.
Clank.
A porta, que estava fortemente trancada, se abriu. Sentado no chão, Ahin agarrou os ombros de Vivi e a virou para seu lado. Os olhos dela estavam fechados e ela não se moveu.
“Vivi-”
Antes que ele terminasse de dizer o nome, ela abriu os olhos de supetão. No instante em que ele percebeu que tinha sido enganado, Vivi rapidamente se moveu.
Em poucos segundos, ela havia empurrado Ahin e subido em cima dele. Os olhos lilás estavam selvagens como os de um predador encurralando sua presa. Logo, Ahin falou, irritado.
“Saia de cima de mim.”
Ping. Ping.
Ele fechou os olhos quando várias gotas caíram em sua cara. Vivi, olhando de cima, chorava muito, com uma expressão de dor. As lágrimas se acumulavam no queixo dela, antes de gotear em cima dele.
“Ahin…”
Logo, os lábios de Vivi, que tinham estado fechados, se abriram.
“…Eu te amo.”
Era uma voz tão suave que não seria ouvida a não ser que se apurasse os ouvidos. Mas Ahin, tendo ouvido com clareza, arregalou os olhos.
“Por isso, não se afaste de mim. Por ataques ou seja o que for. Eu não quero isso.”
Quando os olhos vermelhos, que estavam nublados, começaram a ficar mais focados, ele sentiu um calor familiar em seus lábios.
Os feromônios de cura entraram como ondas através de sua boca. Eles se misturaram com os feromônios de dominação, que corriam de modo desordenado dentro dele, se misturando cada vez que os fôlegos deles se encontravam.
Ahin sentiu como se estivesse saindo de um inferno para cair num lago frio. Ele tentou empurrar Vivi, agarrando o seu ombro, usando sua última gota de racionalidade.
Tak.
Ela agarrou o pulso de Ahin e o forçou contra o chão em um instante, como se para punir essa pequena resistência.
Mais feromônios curativos foram enviados. A sensação dele foi como a de um morto voltando à vida. Ahin não teve opção a não ser aceitar esses feromônios. Várias sensações começaram a aflorar: êxtase, anseio, felicidade, ambição.
Um desejo puro surgiu nos olhos vermelhos. Grudada nele, Vivi estava com os olhos fechados com força.
“A sensação que eu tinha era de estar sugando os feromônios de cura, e não apenas os recebendo. E eu sentia uma vontade incontrolável de estraçalhar esse local.”
Quanto mais tempo o beijo durava, mais ela conseguia compreender o que Ahin tinha dito. Ela sentia como se a quantidade de feromônios de seu corpo estivesse gradualmente diminuindo. A sensação estranha fazia parecer que, em vez de injetar feromônios, ela estava sendo absorvida à força.
Ainda assim, ela não podia parar. Seu instinto lhe dizia que, do contrário, a morte de Ahin estaria muito próxima.
Quantos feromônios ela já tinha injetado? O braço de Vivi começou a tremer no ponto em que fazia contato com o pulso de Ahin.
‘Não tem mais..’
Ela sentia que não tinha sobrado nada para oferecer a ele. Teria que recuperar seu corpo para conseguir produzir mais feromônios, aos poucos.
Vivi cuidadosamente afastou seus lábios dos de Ahin e se ergueu ligeiramente. Os olhos dela se fixaram nos dele, seus lábios brilhantes devido à saliva.
“…Ahin?”
Os olhos vermelhos estavam abertos, porém, desfocados. Mas ele não estava desmaiado. A mão de Ahin se moveu e começou a acariciar a nuca de Vivi, lentamente.
Sentido calafrios, ela congelou. O toque em seu pescoço fez com que ela ficasse de cabelo em pé. Era o medo primitivo de um herbívoro, igual ao que ela tinha sentido quando viu Ahin pela primeira vez.
Seu corpo inteiro começou a mandar sinais de que ela tinha que fugir imediatamente. No entanto, apesar de sentir o perigo, os pés dela ficaram congelados, e não se moveram em absoluto.
Ahin, olhando para cima, sorriu ao encarar Vivi. No entanto, seus olhos não tinham brilho e ele parecia ser outra pessoa. Ela sentiu como se o tempo tivesse parado, incapaz de fugir.
Tic tac. Tic tac.
Então, em uma questão de segundos, Ahin parou de passar a mão pela nuca de Vivi e a puxou para si, violentamente. Então, os caninos afiados perfuraram o pescoço macio.
***
“Senhor Evelyn, que diabos está acontecendo?”
“O Lorde vai ficar furioso.”
Os cavaleiros que protegiam a porta do quarto de Ahin choramingaram, no meio da madrugada.
Evelyn olhou para o lugar onde eles apontavam. Ash, Barra e Quinn haviam entrado pela varanda e os encaravam, por fora da porta de vidro.
‘Por que correram na frente? Se são animais e nem mesmo conseguem abrir uma porta?’
Eles encaravam Evelyn com uma mensagem bem clara de que ele devia entrar no quarto e abrir a porta para eles.
O secretário lançou um olhar amargo para Quinn. Ele poderia se humanizar quando quisesse, mas não o fez, provavelmente apenas para irritá-lo. Era uma coisa ruim ele ser o único do grupo com mãos e pés.
‘Isso é resultado de sua própria incompetência.’
Enquanto ele lançava o olhar mortal, Quinn, não suportando, virou para o outro lado. Ele não era diferente de um animal selvagem nesse aspecto.
Suspirando, Evelyn retirou um pequeno vaporizador de seu bolso.
“Vou nocautear vocês, para seu próprio bem, quando o Lorde investigar. Pode doer um pouco, mas aguentem.”
“Como…? Arrgh!”
“Urggghh!”
Os dois cavaleiros taparam o nariz, tentando evitar o cheiro forte que foi emanado. Eles rolaram no chão em agonia. Aquilo era o “espanta-predador” que ele tinha trazido só para garantir, e tinha um fedor muito poderoso.
‘Não acredito que é possível incapacitar um predador, só porque tem um olfato muito apurado, apenas com um gás fedido.’
Pensando que funcionava melhor do que ele tinha esperado quando o obteve como presente para a Senhorita Coelha, ele começou a caminhar para dentro do quarto.
“Então, como viram, eu fui ameaçado pelos animais, certo?”
Chegando na porta da varanda, ele reiterou, dando ênfase.
“Se o Lorde Ahin perguntar, vocês tem que me defender…”
“Graaaaaa!!!”
Ash rugiu para a porta de vidro da varanda. Ela estava muito preocupada com Vivi, mas, mais do que qualquer coisa, com raiva de si mesma. Numa hora tão importante, se não fosse pela presença de alguém com mãos para abrir a porta, ela ficaria ali parada, para sempre.
Finalmente, Evelyn abriu a porta. Por Ash, Barra deu um tapinha na perna de Evelyn com o focinho como agradecimento. Quinn, que voou para dentro, pousou na cabeça do secretário, o apressando. Com as cortinas fechadas, não dava para ver nada do interior do quarto.
Evelyn, com as garras de uma águia cravadas em sua cabeça, engoliu as lágrimas de dor e se dirigiu para a parte do quarto onde ficava a cama, separada da parte onde estavam por outra porta.
“Se estiver trancada, vamos embora, ouviram?”
Já que era tarde da noite, e obviamente o Lorde Ahin trancaria a porta.
“Olha só, como eu pensei, estava… aberta? Está aberta?!”
Ash saltou para dentro em segundos. Ela pedia para que essa preocupação fosse apenas sua imaginação. Abrindo as cortinas com a boca, sem se importar se estava rasgando-as ou não, ela parou quando um cheiro de sangue atingiu seu nariz.
A cortina foi completamente aberta e uma bola de pelos negros deslizou pela área. Ash olhou ao redor.
E logo enxergou Ahin, caído próximo à entrada do banheiro. E, ao seu lado, um coelho bebê, com os pelos brancos empapados de sangue. Era mais real do que tinha sido aquele pesadelo.
Tradução: Nopa.
Revisão: Holic.
Lucien
MDS MDS vivi!!! Ahin!!! Aí deus